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Aramis

As primeiras gravações (III)

Como pode uma obra de vulto de um compositor importante tal como esta "Messa Di Gloria" de Giacochinno Rossine (1798-1868) - ter sido ignorada pelos músicos e pelo [público] igualmente por mais de século e meio? Talvez a falta de interesse tenha sido devido a relatos imprecisos quanto à primeira execução em 24 de março de 1820 na Igreja de San Ferdinando em Nápoles por Stendhal (que nem esteve lá) e críticas invejosas do compositor Carl Von Miltitz. Contudo, a explicação mais plausível é simplesmente que Rossini, que foi em vida o compositor mais popular do mundo, foi finalmente considerado reacionário e frívolo pelos contemporâneos de seus últimos anos de vida, especialmente os da escola "nacionalista romântica" alemã, para os quais ele havia com efeito, preparado o caminho. Acentua o crítico Herber Handt, que a realização desta Missa - agora apresentada em sua primeira gravação mundial, com a soprano Margherita Rinaldi, o contralto Ameral Gunson, tenores Ugo Benelli e John Mitchinson, baixo Jules Bastin, mais Orquestra de Câmara Inglesa, sob a [regência] de Herber Hadnt, é na verdade, um produto de sua pesquisa na história mundial da pequena cidade toscana de Lucca. Conta Handt: "Rossini deveria ter escrito uma ópera para a governadora local a Duquesa Maria Luisa Borbone, mas nunca cumpriu o contrato. Para fugir à sua ira enviou-lhe uma cópia de uma Missa que acabara de escrever e logo depois (1821) escreveu uma cantata "La Riconscenza" (O Reconhecimento), exaltando suas virtudes. Ao preparar essa cantata para execução em 1970 deparei com muitas referências à "Messa di Glória". Como as duas únicas obras religiosas importantes de Rossini foram escritas depois de ele ter cessado de escrever óperas, decidi que seria interessante executar a única obra não-[operística] em larga escala que ele compôs no pináculo de sua carreira. Com a ajuda do professor Philip Gosett, obtive cópias de todas as fontes disponíveis e tentei reconstruir, tão fielmente quanto possível, a versão original da obra. Infelizmente exceto no que toca a uma página do Conservatório de Bruxelas, a partitura autografada e manuscrita de Rossini desapareceu. Apesar disto, a peça aparece agora na série "1ª Gravação Mundial", da Philips. Outra gravação preciosa selecionada por Maurício Quadrio para esta série é "Agrican Sanctus", produzida por David Fanshaw que reuniu gravações africanas do Egito, Sudão, Uganda e [Quênia] para o que, em 1966, empreendeu várias viagens entre mais de [cinqüenta] tribos da [Arábia] e [África] do Norte e Oriental, recolhendo a música "misteriosa e fantástica" daquele Continente, mas que "como acontece com qualquer arte folclórica", está desaparecendo rapidamente. E esta foi uma das razões que o levaram a escrever "Agricas Sancus", "pois ao invés de apenas gravar a música tribal, poderia simplesmente preservá-la e criar minha própria música em torno dela, acrescentando assim, muito mais cores e variações - o que expressariam minas aventuras e meus sentimentos com seu povo, numa composição onde a música africana, suas canções, danças, recitais religiosos e cerimônias, viveriam dentro do espírito de um trabalho concebido em linhas ocidentais, como se fosse uma missa". O resultado disto é um disco fascinante, onde David Fanshawe tenta fundir diferentes povos e sua música numa trama estreita e unida de energia e louvor. O trabalho reflete as atmosferas cambiantes da música atual por "espero, diz o autor, transformar-se-á, com o tempo, pois estamos todos vivendo e compartilhando a vida juntos, num planeta bem pequeno".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Jornal do Espetáculo
14
06/10/1974

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