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Aramis

Puenzo, da "História Oficial" a visão da revolução mexicana

Tablóide - Como se deu o encontro com Jane Fonda? Puenzo - Quando fui a Hollywood receber o prêmio Globo de Ouro (que "A História Oficial" também ganhou) Jane telefonou-se e até pensei que fosse trote. Almoçamos e após ela ter elogiado "A História Oficial", perguntou se eu conhecia os livros de Carlos Fuentes. Conhecia alguns mas não "Gringo Velho", que ela já pensava em filmar. Mais tarde, voltando a Los Angeles, quando o meu filme foi indicado ao Oscar, houve um novo encontro com Jane e como o meu inglês ainda era precário, lhe passei um primeiro tratamento do argumento. Isto foi no começo de 1986. Jane gostou e a produção começou a ser discutida, enquanto eu e Aída (Bortnik) escrevíamos nada menos que seis sucessivas versões do roteiro original. Tablóide - A produção parece que foi complicada, com muitos problemas. O senhor pode nos contar a respeito? Puenzo - Basicamente a produção foi bem organizada. O problema que tivemos no início das filmagens foi com Burt Lancaster, primeiro escolhido para fazer o personagem de Ambrose Bierce. Acontece que as seguradoras se recusaram a correr o risco por três razões: aos 75 anos, várias pontes de safena, Burt teria que filmar muitas seqüências montado a cavalo, em locações no interior do México - cuja altura é um risco para os cardíacos e num esquema puxado de produção. Assim, após alguns dias de filmagens, a solução foi substituí-lo por Gregory Peck, 73 anos, mas sem problemas cardíacos - além de também ser um excelente ator, em plena forma. Tablóide - Mas "Old Gringo" não deveria ter sido lançado em 1988, a tempo de disputar o Oscar deste ano? Puenzo - Realmente, a Columbia pretendia fazer de "Old Gringo" o filme cabeça-de-ponte de seu pacote de final de ano, a tempo de disputar o Oscar 89. Entretanto, embora as filmagens tenham decorrido normalmente entre 18 de janeiro a 30 de abril, a montagem e finalização exigiram um período maior, de forma que em agosto, reunidos com os diretores da Columbia, decidimos retardar a estréia. Assim, o filme só ficou pronto ao encerrar o último festival de Cannes, exibido hors concours, na mesma noite em que se prestava uma grande homenagem a Peck. E seu lançamento nos Estados Unidos acontecerá a 6 de outubro, inicialmente em 300 cinemas. Tablóide - O fato de uma superstar como Jane Fonda e o senhor virem ao Brasil - estendendo a viagem a Argentina e ao México, antecipando a estréia do filme ao mercado americano, não é o receio de que o mesmo seja um fracasso de bilheteria nos Estados Unidos? Puenzo - Não. As críticas recebidas após as exibições em Cannes foram positivas. Embora o filme tenha legendas em muitas seqüências - e os americanos não gostam de filmes legendados - acredito que fará boa carreira. Tablóide - Como foi que o senhor conseguiu impor diálogos em espanhol para os personagens mexicanos, dando assim maior seriedade ao filme - mas correndo um risco comercial? Puenzo - Realmente, houve necessidade de uma negociação. Assim, os diálogos dos personagens mexicanos, entre eles, ficaram em espanhol - com legendas. Mas quando falam com os americanos, se dirigem em inglês. Tablóide - Tanto em "A História Oficial" como em "Gringo Velho" há muitos diálogos. O que diz a respeito? Puenzo - Se de um lado sou extremamente visual, acredito também que a palavra é indispensável conforme o tema. "Gringo Velho" é um filme sobre o escritor e o jornalista Ambrose Bierce (1842-1914?) - e assim os diálogos tinham que ser extensos muitas vezes. Mas sonho um dia em realizar um filme sem palavras, como fez Ettore Scola em "O Baile" (Nota: longa-metragem, 1983, sem um único diálogo). Tablóide - A fotografia de "Old Gringo" é belíssima, parecendo captar imagens de quadros. Qual foi a intenção de tornar tão belo, plasticamente, o filme? Puenzo - Existe uma tradição na fotografia do cinema mexicano desde os tempos do Gabriel Figueroa com suas imagens em preto e branco. Um luz forte que marcou tantos filmes mexicanos e assim, logo que comecei a discutir o filme com o diretor de fotografia, Felix Monti - o mesmo de "A História Oficial" e também dos filmes de Fernando Solanas ("Tangos - O Exílio de Gardel" e "Sur"), que trabalha comigo desde os meus tempos de cinema publicitário, buscamos imagens com influências de pintores românticos, com uma luz muito mais de meios tons, coloração pastel e buscando as cores da terra - o sepia, o marrom, com uma admissível influência de um dos grandes pintores da natureza americana, Frederic Remington (1861-1909), um dos grandes ilustradores de paisagens selvagens não só americanas mas de outros países que percorreu em sua vida. Tablóide - O senhor pôde trabalhar com uma equipe argentina? Puenzo - Felizmente, pude levar dez colaboradores. Por exemplo, o figurinista Enrico Sebattini procurou também dar uma coloração especial na criação dos trajes. Eu sou perfeccionista, saldo de minha vivência estética da publicidade. Tablóide - Quais os planos futuros: deixar a Argentina e, a exemplo de outros cineastas estrangeiros, fazer carreira nos Estados Unidos? Puenzo - Não. Apesar da crise do cinema argentino - a produção que era grande há 5 anos, caiu para 20 títulos no ano passado - meus projetos obedecem a circunstâncias específicas. Acho vantajoso usar os canais, os mecanismos do Primeiro Mundo para dizermos coisas que queremos dizer e não podemos. Em "Gringo Velho", quero dizer que é possível desfrutar a convivência com alguém que é diferente de nós sem perdermos nossas características. Nos filmes americanos, o diferente é sempre pior e mais feio, é alguma coisa a ser corrigida. Acho importante fazer um filme contra esse conceito. Neste momento o cinema feito na Argentina ou no Brasil só pode sobreviver se for encarado como cultura. Submetido às leis do mercado ele é inviável. A liberdade do mercado é a de uma galinha solta com uma raposa no galinheiro. Enfim, quando há condições favoráveis os bons filmes aparecem. Tablóide - O senhor consegue fazer filmes políticos e românticos, capazes de fazer chorar como "A História Oficial"? Puenzo - Eu não entendo a política separada da vida individual e das relações entre as pessoas. Mas eu não creio em filme político como gênero. Em geral, os filmes políticos são secos e óbvios, que produzem um efeito de esterilidade porque atraem um público que já gosta do filme político - e que, sendo politizado, não necessita, ideologicamente, ser catequizado pelo que vê na tela. Tablóide - Mas nem os filmes de Costa Gravas os interessam? Puenzo - Depende. Não gosto de "Missing" mas aprecio "Z". Acho que deve procurar-se uma fórmula em que a mensagem política atinja o público de uma forma sutil. Tablóide - Por último: Votou em Menem para a presidência? Ele faz rir ou chorar? Puenzo - Não. E não sei de faz rir ou chorar. Vamos esperar algum tempo... LEGENDA FOTO - Luiz Puenzo nas locações de "Velho Gringo", dirige Jane Fonda e Gregory Peck. O filme estréia hoje no Cine Astor.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
31/08/1989

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