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Aramis

Quadrinhos eróticos

Nunca o brasileiro teve tantos sonhos eróticos. A conclusão é do editor Faruk El Khatib, 33 anos, executivo de marketing da Grafipar. Extrapolando seus lançamentos para publicações mensais, voltadas ao consumidor masculino, na faixa entre os 16/40 anos, classes B e C, as publicações da Grafipar estão vendendo como pão quente em todo o País. "Peteca", agora quinzenal, já passando dos 90 mil exemplares; "Personal" atinge os 50 mil e duas novas revistas, na mesma linha de erotismo, estão ainda: "Eros", exclusivamente em [quadrinhos], e "Rose", esta destinada ao público feminino. Publicações paralelas também são lançadas: "Personal Humor", editada inicialmente apenas bisextamente, passa agora a ter uma periodicidade mensal, e "Peteca-Contos" também vai ganhar lançamento regular - nesta reunindo contos eróticos, curtos, através de concursos que a própria editora promove. xxx Nelson Faria de Barros, veterano jornalista, ex-colunista social e crítico de teatro, ligado a mais de uma dezena de experiências editoriais feitas em Curitiba nas décadas de 50/60 ("Planalto", "Clube" etc.) é um dos responsáveis pelo sucesso desta fase de erotismo editorial da Grafipar, junto com um grupo de jovens desenhistas. Entendendo que o leitor classe A já é disputado por caras publicações ("Status", "Vogue Senhor", "Ele & Ela", "Play boy" etc.), procurou dar a "Peteca" e "Personal" uma linguagem descontraída, simples - voltada ao leitor de menor poder aquisitivo. E a fórmula está funcionando de forma acima do que esperava o editor Faruk El Khatib, vários cursos de marketing, experiência internacional - e que conseguiu, através de muito esforço, dar uma dimensão nacional às suas publicações. xxx "Eros/Sexo em Quadrinhos" (34 páginas, Cr$ 15,00, número 1 agora nas bancas de todo o País) é a mais audaciosa de todas as experiências da Grafipar, na busca de uma ampla faixa de mercado. De certa maneira, trata-se de colocar, dentro daquilo que a Censura permitir, as idéias e soluções que há anos vêm sendo empregadas por desenhistas e roteiristas de HQ realmente undergrounds. Carlos Zefiro, pseudônimo de um dos mais férteis desenhistas de HQ pornográfica, é um criador à espera, ainda, de um estudo sério a respeito de seu trabalho - infelizmente vendido apenas no mercado marginal, muitas vezes a preços altíssimos, perseguido pelas autoridades que zelam pelos bons costumes de nossa sociedade. xxx Retamozo e Rogério Dias, veteranos desenhistas e publicitários, responsáveis pelo texto/arte de "Eros", não pretendem obviamente chagar àquilo que Carlos Zefiro faz (ou fazia, já que há muito tempo que suas revistas desapareceram do mercado paralelo) uma vez que a publicação da Grafipar tem vida legal, devidamente registrada junto ao Departamento de Censura e Diversões Públicas da Polícia Federal. Só que com imaginação, bom gosto e inteligência, vão tentar desenvolver nos quadrinhos nacionais - tão necessários de serem estimulados por nossos editores - toda uma temática e linguagem voltadas para o erotismo. xxx Para colaborar em "Eros", Retamozo e Moura estão convocando jovens desenhistas de quadrinhos que no Brasil têm um restrito mercado de trabalho. Solda, Cláudio Seto, Bellenda, Fernando Ikoma, Liesenfeld, Eliot Pinus, José Victor Cit. Fernando Ikoma, filho de imigrantes japoneses, foi, aliás, um dos pioneiros no quadrinho de terror e erotismo no Brasil, desenvolvido anos atrás pelas páginas da editora Edrel, de um grupo nissei, em São Paulo, com personagens como O Paquera, Histórias Adultas etc. Hoje, Ikoma vem se dedicando quase que exclusivamente às artes plásticas, com óleos de grande força, paisagens abstratas de muita comunicabilidade - para alguns críticos, lembrando bastante Érico da Silva, Cláudio Seto é outro pioneiro do erotismo em HQ no Brasil, só que já voltando ao gênero na melhor das estórias selecionadas para este primeiro número: "Histórias do Espectador: Satiríase Fatal". Bellenda mostra sátira e humor em "Os homens assim como os macacos preferem as louras". "Presente de Aniversário", de Cláudio, terceira das estórias do número inaugural de "Eros", tem uma linguagem direta, montagem em ritmo cinematográfico - dentro da melhor tradição dos quadrinhos e um final surpreendente. Uma estória realmente excitante. xxx A tradição dos quadrinhos eróticos, em termos internacionais, já é grande. Entretanto, como frisa Retamozo na nota introdutória da revista, "o sexo em quadrinhos até hoje descansou no leito dos preconceitos: confundir erotismo com pornografia é uma das tônicas preferidas pelos donos da verdade". O surgimento de heroínas sensuais no início da década de 60 é o marco. A partir de sua (delas) aceitação, as coisas mudaram. A mulher saia de seu papel de eterna noivinha do galã supertudo para vir de sexualidade em punho conquistar seu lugar no paraíso dos quadrinhos. Apesar de vários cartuns em jornais do início do século trazerem algumas caricaturas de mulher, a primeira a assumir pra valer foi a "Mulher Maravilha". E as heroínas, pouco a pouco, foram despindo (roupas e preconceitos): Sheena, a rainha da selva, criada em 1937 por S.M.Igger/Will Eisner, também levou adiante algumas liberações. Mas foi nos anos 60 que houve a grande explosão de sensualidade das heroínas: Barbarella, criada em [ilegível], nas páginas do "Y. Magazine", por Jean-Claude Forest (e cujo êxito chegou até o cinema, com Jane Fonda vivendo a personagem, sob direção do então marido Roger Vadin, em 1967); Modesty Blaise, criada nas páginas do "Daily Express", de Londres, com roteiro de Peter O'Donnell e desenhos de Jim Holdaway (igualmente levada ao cinema, em 1965, por Joseph Losey, com Mônica Vitti no papel-título); Valentina (Malaverde), criada por Grazia Nidasio em 1968 e cujas primeiras tiras apareceram no "Il Corriere dei Ragazzi"; Jodelle, desenhos de Guy Pellaert, roteiro de Pierre Bartier, lançada pelo editor Eric Loesfeld em 1966; Paulette, afora até heroínas socialistas: Pravda e Octobriana, além das menos conhecidas Scarlet Dreamm, Blanche Epiphanie, Xiris, entre outras. Como se vê, as mulheres deixaram a situação passiva, decorativa, das personagens femininas, companheiras fiéis e acomodadas de heróis, como Narda, noiva de Mandrake há tantos anos que muito já se falou, ironicamente, das relações entre o mágico e seu criado Lothar; ou a Diana Palmer, que, finalmente, acabou sendo levada ao altar pelo Fantasma - 42 anos depois de a estória de Lee Falker ter sido criada (no Brasil, a estória do casamento do Fantasma foi lançada pela Rio Gráfica Editora, no início deste ano). xxx Falando em quadrinhos: reapareceu "Eureka" (Editora Vecchi, 66 páginas, Cr$ 20,00), destinada a lançar estórias de alto nível, geralmente inéditas em publicações comerciais, ao lado de artigos teóricos e informações sobre quadrinhos, há muito já estudado com seriedade por professores de comunicação, jornalistas etc. (no Brasil, O ESTADO foi o primeiro jornal, em 1965, a publicar uma página dominical com textos de análises sobre quadrinhos). Em seu número 11 (os 10 primeiros circularam há quatro anos passados), "Eureka" apresenta duas estórias de autores nacionais. Flávio Colin e Shimamoto. "Vizunga", de Colin, é a sua história e saiu publicada anteriormente em jornais, por volta de 64/65. "A Morte do Samurai", de Shimamoto, apesar de feita em 1976, nunca havia sido publicada.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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Tablóide
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15/09/1978

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