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Resnais discute em quadrinhos o choque cultural França-EUA

No início dos anos 60, quando o preconceito e mesmo a intolerância cercavam as histórias em quadrinhos - e os chamados "gibis" eram combatidos por pais e educadores como inimigos mortais - o fato de dois brilhantes cineastas europeus terem assumido sua admiração pelos comics, fez com que muitas vozes inimigas dos super-heróis se calasse: Alain Resnais e Federico Fellini curtiam os gibis e confessavam, inclusive, influências estéticas de suas leituras. Alain Resnais, então glorificado como o mais intelectual e importante dos cineastas da Nouvelle vague, após o seu renovador "Hiroshima, Meu Amor" (1959), fez mais - era um dos mais importantes colaboradores de uma sofisticada revista teórica sobre quadrinhos e chegou a anunciar que o seu sonho era fazer um filme inspirado em Mandrake, do personagem de Lee Falker. Se "Mandrake" não saiu de um roteiro imaginário, Alain Resnais acabaria, entretanto, fazendo um filme sobre o universo dos quadrinhos: "Quero Ir para Casa" (Cine Luz, 5 sessões). Há dez anos que não chegava um novo filme de Resnais, cineasta de obra reduzida mas das mais significativas. Todos os filmes de Resnais sempre foram intelectualizados, profundos. Agora fez uma comédia em torno de uma idéia simples - mas tão ampla em código de simbologia em termos de relações culturais França-Estados Unidos, que o grande público, que não possua uma boa dose de informação, ficará sem perceber a importância deste filme. Escolhendo um não-ator para o papel principal do filme - o compositor Adolph Green, Resnais arriscou-se a sofrer críticas. Green interpreta Joe Wellman, um veterano e provinciano cartunista americano, que deixa sua tranqüila Cleveland, para ir, pela primeira vez a Paris, durante uma exposição internacional de seus quadrinhos. O que levou Wellman a aceitar o convite foi a vontade de tentar reencontrar sua filha, Elsie (Laura Benson), que havia rompido com a família, e viajando para a França em busca da cultura autêntica (Racine, Moliére, etc.), e desprezando aquilo que via como comercialismo na obra do pai. Em Paris, Elsie encontra um orientador (Gerard Depardieu), que é um apaixonado pelos quadrinhos de Wellman. A partir deste "plot", Jules Feiffer ("Popeye") e Resnais desenvolveram um roteiro em que com sutileza, ironia e inteligência, analisam as diferenças entre a moderna cultura americana (massificada, dinâmica e audiovisual) e a tradição francesa (elitista, conservadora e literária). Ecologia & Violência - Como a ecologia está em moda, o cinema também aproveita a onda: "Uma Raça a Parte" (A Breed Apart), de um desconhecido Philippe Nora, com roteiro de Paul Wheeler, conta a saga de um naturalista, Jim Malden (Rutger Hauer, o holandês revelado em "Blade Runner"), que vivendo numa ilha particular no litoral da Carolina do Norte, com um passado misterioso, dedica-se a afastar os intrusos que possam ameaçar um casal de águias raras, as últimas remanescentes de sua espécie. Dois caçadores de patos são por ele expulsos da ilha, mas decidem vingar-se - iniciando então uma luta de vida e morte. A "mocinha" é Stella (Katheleen Turner), mãe solteira de um garoto de 10 anos, que ama Malden mas não consegue entrar em sua vida. Um bilionário "predador" (Donald Peasance) oferece US$ 250 mil por um ovo da águia e aparece gente disposta a liquidar o ecologista solitário. Resultado: muita ação em cenários naturais, num filme que mereceria lançamento numa sala melhor do que a do São João, hoje um cinema freqüentado por uma faixa de público que busca apenas a pornografia e violência gratuita. Que não é o caso deste filme com música de Maurice Gibb e que traz o novo diretor, o francês Philippe Mora, 42 anos, criado na Austrália, onde começou sua carreira que prosseguiria na Inglaterra. Já fez vários longas mas só agora chega até nós.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Nenhum
12/04/1991

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