Roxo collorido motiva as duas marchas satíricas do Carnaval
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 01 de março de 1992
Apenas duas músicas do Carnaval deste ano - uma delas, sem condições técnicas de obter divulgação já que o disco passou a ser distribuído apenas há uma semana - fazem uma abordagem satírica em torno do presidente Collor. E, afinal satirizar os donos do poder sempre foi a ferroada preferida dos grandes autores de nosso Carnaval desde os tempos de Chiquinha Gonzaga.
Eron Vianna, paranaense de Palmas, 55 anos, em seu terceiro elepê (Chororó, fevereiro/92) convidou o comediante Tutuca, da "Praça da Alegria" (TVS-TV Iguaçu) que há 30 anos atrás satirizava a renúncia de Jânio Quadros em "A Minha Renúncia", para interpretar a faixa de abertura, que dá título ao disco e que se tivesse sido lançada há mais tempo poderia encontrar espaço: "Pepino Roxo".
Já Sérgio Mallandro, que por sua participação no programa da Xuxa, tornou-se popularíssimo, gravou na RGE a marchinha "Se o dele tá roxo" dos veteranos Manoel Ferreira e Ruth Amaral.
Eron Vianna, em sua sátira, partiu da frase que o presidente Collor pronunciou no interior de Pernambuco, para dar o seu recado:
Não agüento mais promessa/ Já estou batendo pino (bis)
Vê se não vem mais com essa
Que eu plantei à-beça/ e só deu pepino (bis)
É uma safra colorida/ Para ninguém
botar defeito
Dizem que o pepino roxo/ É o que
faz o melhor efeito
Se você pediu pepino/ Deve estar bem
satisfeito
Eu que estou batendo pino/ Vou cantando o hino
Para você bem feito.
Já em "Se o dele tá roxo", Mallandro repete por 4 vezes duas estrofes:
Se o dele tá roxo/ Veja o meu como
é que tá
(tá,tá,tá) Assim vai derramar (bis)
Trabalho o ano todo/ Num sufoco
sem parar
O que eu ganho é muito pouco
Não dá pra segurar.
Explorando um personagem que já anda meio esquecido - o beijoqueiro português - "Beijo na Xuxoca (Mauro Rosas), gravado pela dupla Biancha e Suzuki em selo ABC-Ya-Rô, procura dar uma conotação picante, de duplo sentido, aproveitando o marketing Xuxa.
Be be beijoqueiro/ Saiu da sua maloca
Pra tentar beijar neném/ A nossa
querida Xuxoca
Ele beijou até o Papa/ Beijou o Zico,
e também Frank Sinatra
Beijoqueiro vê se pára de beijar/
Qualquer dia pelo cano vai entrar.
O mesmo Mauro Rosas, em parceria com Hélio Simões e Walter Cruz, é o autor e intérprete de outra marchinha de duplo sentido: "Pauzinho premiado".
Eu vou fazer pra vender/Aquele picolé de cachaça
Vai ser um tal de chupa, chupa/
Quem bebe vai chupar com raça
Eu vou vender/ Que idéia louca
Cachaça dura vão cair de boca
Também vai ter surpresa na cachaça
Pau premiado, vai chupar de graça.
João Roberto Kelly, 55 anos, compositor carnavalesco bom curriculum ("Brotinho bossa nova", 60; "Joga a chave, meu amor", 65; "Rancho da Praça Onze", 65 etc.), também decaiu: em parceria com Douglas e Tomazi, é autor da medíocre marchinha "Quá quá quá quá", gravada pela desconhecida Suzy Bauer (etiqueta CID), com letra das mais insignificantes, tentando falar em violência carioca e a beleza da mulata.
Edson Santana gravou na ABC-Ya-Rô (?), a "Marcha do [Machão]" (Hilton Simões, Walter Cruz e Ya-Rô), também das mais fracas letras
("Mulher comigo não dorme/ Não dorme, não dorme, não dorme/ Eu tusso a noite toda/ Pra disfarçar/ Eu vou dormir no chão").
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O panorama seria de total desalento se a única marcha-rancho que apareceu neste Carnaval fosse uma composição que, a julgar pela letra, merece atenção: "Estrela Dalva" de Luiz Moreno e Elza Suchorski, esta também intérprete em gravação na etiqueta Somil - infelizmente sem ter tido qualquer divulgação. "Marcha-rancho é covardia", costuma dizer Alceu Schwab, do alto de sua experiência de pesquisador musical, pois o ritmo compassado e as letras românticas das marchas-ranchos resultaram em dezenas de clássicos de nosso cancioneiro.
Numa homenagem a Dalva de Oliveira (Vicentina de Paula Oliveira, 1917-1972), que criou tantos clássicos carnavalescos e se identificou plenamente a "Estrela Dalva" esta solitária marcha-rancho que surge com copyright de agosto/91, pelas edições Euterpe, mas que é editada agora para o Carnaval de 92, é uma única luz no túnel escuro da música carnavalesca nestes tempos tragicamente coloridos.
(BIS)
Cantou
Em muitos carnavais e fez
a multidão ficar feliz
Com a sua voz pedindo paz
Bandeira branca meu amor eu peço
paz
Cantou/ em muitos
(BIS)
Hoje ela vive lá no céu
Sem pierrô, sem arlequim
Junto ao Chico e Noel
Sem fantasia de cetim
Com Lamartine ô lá lá
Com Zé da Zilda e outros mais
Está faltando a Estrela Dalva
Em nossos carnavais
LEGENDA FOTO 1: O paranaense Eron Vianna e o comediante Tutuca - do programa "A Praça é Nossa", com "Pepino Roxo" satirizam o governo Collor.
Só que a gravação saiu há uma semana, sem tempo para ser divulgada neste Carnaval.
LEGENDA FOTO 2: Sérgio Mallandro - entre Ruth Amaral e Manoel Ferreira, autores de "Se o dele tá roxo", única marchinha inédita do Carnaval-92, que está tendo alguma divulgação via televisão.
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