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Salamuni, lembranças do Senhor Ex-Reitor

Em seu depoimento para o projeto "Memória História do Paraná", na tarde de quinta-feira, o professor Riad Salamuni não só lembrou importantes aspectos de sua vida profissional mas, como ex-reitor da Universidade Federal do Paraná, fez uma importante revelação de um assunto bastante atual: a polêmica que ocorreu no último vestibular devido a um erro de digitação na computação dos resultados dos exames. Um fato que, até hoje, não teve a divulgação necessária - e que Riad confirmou aos jornalistas que o entrevistaram - mostra mais um aspecto da lisura com que transcorreu o vestibular - e de que aconteceu apenas um erro humano, "sem qualquer intenção de alterar os resultados". Embora, na ocasião, estivesse licenciado para tratamento de saúde - havia sofrido um enfarte há poucas semanas - Riad, na condição de Reitor da UFPR, foi procurado pelas pró-Reitorias de Ensino e Pesquisa e de Órgãos Suplementares, professoras Suzana Munhoz da Rocha Guimarães e Mirna Cartapasso, respectivamente - tão logo as mesmas tiveram confirmação do erro de digitação que ocasionou toda a confusão. "Seria um erro que poderia passar ignorado, sem qualquer denúncia e ser sepultado. Mas a honestidade dos professores ligados a comissão do vestibular, especialmente das professoras Suzana e Mirna, fez com que trouxessem imediatamente a questão. Eu, de minha parte, fiz questão de tornar público o fato, mesmo sabendo de toda a repercussão negativa que teria, já que o vestibular é um exame que atinge milhares de pessoas - candidatos, pais, familiares, etc. Riad fez mais: imediatamente entrou em contato com o então diretor da Polícia Federal no Paraná, hoje secretário da Segurança Pública, José Moacir Favetti, para que houvesse uma investigação a respeito e paralelamente criou uma comissão independente da Universidade, com representantes de pais de candidatos, para acompanhar as providências. "Graças a isto - diz Riad - pudemos ultrapassar o incidente com a maior lisura. Ficou comprovadíssimo de que não existiu a menor corrupção no fato de, por um erro humano, as listagens terem sido alteradas". A transparência com que o episódio foi tratado fez com que houvesse o reconhecimento inclusive no Judiciário e o resultado é que os 450 estudantes que não tinham, originalmente sido aprovados - mas que alcançaram médias expressivas nas provas - acabaram sendo matriculados. "Havia vagas e não houve prejudicados. Ao contrário, com isso evitou-se ociosidade em vários cursos. Não poderia mesmo haver reclamações, já que além de ter sido mais do que comprovado o fato de não ter havido má fé ou desonestidade, não resultaram prejuízos nem a outros candidatos, nem à instituição". xxx Embora com um "happy end", este incidente quase provocou um segundo enfarte em Riad Salamuni, 62 anos, paranaense de Ponta Grossa, que agora, aposentado como professor universitário, dedica-se apenas a sua empresa de consultoria na área da geologia e com planos de voltar a escrever livros técnicos. O primeiro projeto é a revisão de seu "Fundamentos Geológicos do Paraná", publicado originalmente há 20 anos dentro da coleção "História do Paraná" (4 volumes, edição Grafipar). Um dos mais respeitados geólogos paranaenses, Riad Salamuni seria apenas um médico se tivesse atendido a vontade de sua mãe, dona Linda, libanesa que ao chegar ao Brasil falava além do árabe também o inglês, que havia aprendido numa escola britânica em Beirute. Praticamente aprovado no vestibular de Medicina em 1951, Riad quase desmaiou quando um professor, Joaquim de Mattos Barreto, o levou a sala em que eram dadas as aulas práticas de anatomia. - "Só o cheiro do clorofórmio me fez ficar tonto. O professor Barretinho perguntou então porque eu queria estudar Medicina. Eu disse que queria mesmo era estudar Geologia, pois desde a minha infância, em Ponta Grossa, as rochas me fascinavam". Não havia, entretanto, curso de Geologia. Na época, o máximo que se aproximava era de Engenharia de Minas, em Ouro Preto, mas distante demais para Riad tentar. Surgiu então a possibilidade de fazer História Natural, que oferecia cadeira ligada a Geologia. Formado em 1952 e já trabalhando como assistente de professor, houve a chance de estudar Geologia nos Estados Unidos, o que o levou as universidades de Miami e Chicago entre 1954/55. De volta ao Brasil, apesar de ter oportunidade de trabalhar na Bahia, onde a Petrobrás implantava o primeiro curso de Geologia, Riad preferiu, por razões familiares - seu pai estava doente na época - tornar-se assistente de um geólogo amador de Ponta Grossa, Frederico Lauding, depois que o mais famoso e respeitado geólogo na época, Reinhard Maark (1891-1968), quando ele o procurou, recusou-o como assistente. Anos depois, juntos fariam importantes trabalhos científicos, inclusive no mapeamento geológico do Estado, área em que o Paraná foi pioneiro. Com bom humor, Salamuni recorda de outro grande mestre da geologia que o Paraná teve, o austríaco Ludwig Johann Weber. - "Na primeira aula que com ele tive, Weber apanhou uma rocha e a lambeu, dizendo então com seu sotaque germânico: "Voces precison aprender a conhecer a constituição de uma pedra pelo paladar... esta por exemplo..." - e foi mencionando a constituição do seixo. Era um truque, claro, mas ficou a imagem do homem que conhecia a matéria que ensinava". xxx Sem nunca ter deixado o magistério, ao longo destes 35 anos, Riad tem participado de inúmeros projetos importantes na área da Geologia. Paralelamente, desde seus tempos de estudante - quando foi secretário geral da UPE 1951/52), teve uma militância política que o levaria a fazer parte do diretório do antigo Partido Socialista, o que lhe trouxe alguns aborrecimentos em 1964. Apesar de toda uma vida política aberta e sempre liberal, em sua gestão como reitor - coroamento por uma carreira do magistério - teve que enfrentar problemas com as várias facções da esquerda (e direita) que hoje existem na Universidade. Vendo com realismo a questão do ensino superior no Brasil, sem esconder críticas aos muitos erros e falhas, humanos e de estrutura em nossa septuagenária instituição, orgulha-se entretanto de ter conseguido equacionar problemas graves - como a recuperação do Hospital das Clínicas, a consolidação do campus em Santo Antônio da Platina e do Centro de Biologia Marítima, além da implantação da editora universitária Scientia et Labore, que graças a competência da professora Leilah Santiago de Oliveira, tem hoje 55 títulos em catálogo. - "A Universidade Federal do Paraná não teve inchamento de funcionários e mesmo professores. Hoje, para um total de 18 mil alunos distribuídos em 33 cursos, há 1.890 professores (eram 2.050 quando assumi), o que dá uma média de 8,2 alunos/professor - das melhores. Dos 2.500 funcionários, 50% estão no Hospital das Clínicas, que funciona em quatro turnos". LEGENDA FOTO - Riad Salamuni: agora, o tempo para cuidar de novos livros.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
26/05/1990

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