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Teresópolis Musical (I) - O Festival que nasce graças ao grande mecenato cultural

Teresópolis, janeiro - Muitos fatores contribuíram para que esta cidade na zona serrana do Estado do Rio de Janeiro se tornasse famosa. Espalhando-se por um grande vale entre o Parque Nacional da Serra dos Órgãos, aos pés do Dedo de Deus - o pico que com seus 1.650 metros é um dos pontos mais altos do País - fundada no final do século passado por imigrantes alemães e holandeses, Teresópolis tem, em termos culturais, um ponto de referência: o consagrado curso de verão de música, que reúne bolsistas não só do Brasil mas de vários países latino-americanos. Este ano, pela primeira vez desde que foi criado há 38 anos, graças ao amor do industrial Theodoro Heuberger (1899-1987), o Curso de Música adquire uma dimensão extra com a realização paralela de um Festival Internacional, aberto no dia 9, com o concerto da Orquestra de Câmara Brasileira, sob a regência do maestro (e violinista) Bernard Bessler, que se estende até amanhã, dia 23, quando a Orquestra de Câmara Pro-Arte se exibirá sob regência dos maestros Alberto Jaffé e John Boudler, tendo como solista o violoncelista israelense Michael Haran. O lado plástico da Vulcan - com a tradição de 37 anos ininterruptos realizados sempre com recursos da Pró-Arte de Teresópolis - Fundação Comendador Theodoro Heuberger, com pequenas (e muitas vezes insignificantes) ajudas oficiais, este ano Teresópolis ganhou um grande mecenas. A Vulcan S/A Material Plástico, completando 40 anos de atividades no Brasil - e, naturalmente, com o estímulo da Lei Sarney, decidiu incluir o patrocínio não só do curso, mas também a realização de um Festival Internacional de Música, paralelo, dentro de seu grande programa cultural - batizado apropriadamente de "O Lado Plástico da Vulcan". Paolo Allegrini, gerente de marketing da empresa, ceramista com algumas premiações e que já participou de salões em Curitiba, explica, com entusiasmo, a abertura da empresa para o momento cultural: - "Em 1988, dentro dos 40 anos da Vulcan no Brasil, desejamos participar de eventos significativos, que marquem a imagem da empresa e que representem acontecimentos importantes". Para tanto, há uma respeitável verba - aproximadamente US$ 500 mil, 60% da qual já está sendo aplicada neste mês com o patrocínio do Festival de Teresópolis. Em estudos, mais duas ou três realizações - uma das quais, possivelmente, uma temporada do Ballet de Stuttgart no Brasil, com a brasileira Márcia Haydée, tendo um roteiro que pode mesmo incluir o Teatro Guaíra de houver necessária agilização de sua diretoria de arte e programação. O jornalista João Marcos Coelho, 46 anos, um dos mais respeitados críticos de música do Brasil (ex "Folha de São Paulo", escrevendo na "Visão" e "Isto É"), com sua experiência musical e amplo trânsito na área musical, através de sua empresa de assessoramento cultural e jornalístico, a MKT - Imprensa & Marketing, mais a Interarte Produções Artísticas, ambas com sede em São Paulo, somaram esforços para que o projeto Teresópolis tivesse ressonância nacional. E a partir da abertura do Festival, no dia 9 de janeiro último, com o concerto da Orquestra de Câmara Brasileira, um equilibrado programa vem sendo desenvolvido - atraindo não só os estudantes e professores do curso e a população (inclusive a flutuante) da cidade, estimulando que muitos cariocas que apreciam a boa música subam a Serra e assistam aos concertos. João Marcos e seu associado, Marino Anselmo, têm um ótimo know how nesse tipo de evento: por três anos assessoraram a Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo no Festival de Inverno de Campos do Jordão, patrocinado pela Souza Cruz. Em 1986, inclusive, João Marcos produziu o álbum duplo com a Orquestra Sinfônica de São Paulo, regida por Eleazar de Carvalho, em dois dos concertos apresentados naquele Festival. A boa programação - Se o Curso de Verão de Teresópolis tem por sua continuidade de 37 anos um conceito hoje internacional, com professores dos mais competentes e jovens entusiastas buscando aprender o máximo durante as quatro semanas em que é realizado, o Festival Internacional de Música de Teresópolis inicia com o pé direito. Mesmo sem poder contar, nesta primeira edição, com superstars internacionais (ao contrário do que vinha ocorrendo em Campos do Jordão), com exceção do violoncelista israelense Michael Aeran, a programação elaborada pelo maestro Alberto Jaffé foi das mais equilibradas. Na abertura, o senhor Raoul H. Rossmann, presidente da Vulcan, salientou que mais de 200 músicos brasileiros e estrangeiros estariam se apresentando, até o final de janeiro, em 20 concertos - distribuídos não só no auditório Higino, mas também no ginásio poliesportivo da cidade e no anfiteatro ao ar livre da Casa da Cultura. O auditório Higino, com 400 lugares, localiza-se no imenso edifício Petrópolis, construído há 60 anos e que até 1946 era um hotel-cassino dos mais famosos - concorrente do Quitandinha, na vizinha cidade de Petrópolis. Quando o presidente Eurico Gaspar Dutra proibiu o jogo no Brasil, o antigo Hotel-Cassino Presidente esvaziou-se, transformando-se, pouco a pouco, num condomínio de 200 apartamentos em seus cinco pavimentos. Mas os amplos salões no térreo, decorados ao estilo "art-noveau", lustres de cristal e pisos de mármore, lembram o passado glorioso. O auditório Higino, confortável e com boa acústica, ganha, neste mês de janeiro, uma programação musical a altura dos velhos e gloriosos tempos que conheceu nos anos 30 e primeira metade da década de 40. Por exemplo, no domingo, 10, à tarde, ali houve o belíssimo concerto do Quarteto Bessler-Reis, com apresentações de peças de F. J. Daydn (1732-1809), Mozart (1756-1791) e Schumann (1810-1856), tendo como solista o pianista José Feghali, 26 anos, um dos mais promissores artistas brasileiros, vivendo no Exterior. No concerto de abertura, Feghalli já havia sido o solista do Concerto para Piano e Cordas em Fá Menor de J. S. Bach (1685-1750), mostrando todo seu talento, que o fez, há três anos, vencer o concurso Van Cliburn, um dos mais importantes do mundo - e ter um lançamento internacional. Na mesma ocasião, a Orquestra de Câmara Brasileira apresentou o Concerto para Viola e Cordas em Dó Menor, de J. Christian Bach (1735-1782), tendo como solista a sensível e bela Marie Christine-Spriguel (violinista), que integra tanto a Orquestra de Câmara como a do Quarteto Bessler-Reis. Dia 15, Turíbio Santos, hoje o maior nome do violão clássico no Brasil, fez um concerto com peças de Bach e Villa-Lobos e do catarinense Edino Krieger, entremeados de choros de João Pernambuco (1883-1947), Garoto (Aníbal Augusto Sardinha, 1915-1955), afora canções nordestinas de Luiz Gonzaga e o standard "La Catedral", do paraguaio Augustin Barrios (1885-1944). A programação prosseguiu no dia 16, com um programa especial à tarde - "Villa-Lobos das Crianças", e, ao entardecer, apresentação do excelente Grupo de Percussão do Instituto de Artes do Planalto, dirigido pelo norte-americano John Boudler - um dos professores do curso e que no dia 23 estará regendo uma das peças do concerto de encerramento. Dois dos maiores pianistas do Brasil também participam do Festival: Nelson Freire, que há anos faz questão de incluir Teresópolis em sua programação de janeiro, deu o concerto na noite do dia 16, com peças de Bach, Schumann, Prokofiev, Villa-Lobos e Chopin. Arthur Moreira Lima, que foi bolsista em Teresópolis há 20 anos passados, voltará no dia 23, para um recital de piano com comentários, executando peças de Chopin (1810-1849), autor do qual é considerado um dos melhores intérpretes do mundo - e cuja obra vem gravando há muitos anos em vários países. LEGENDA FOTO 1 - A Orquestra de Câmara Brasileira, tendo a violinista Marie Christine-Spriguel. LEGENDA FOTO 2 - José Feghali, 26 anos, uma das revelações do piano em termos internacionais. LEGENDA FOTO 3 - Turíbio Santos.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Nenhum
22/01/1988

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