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Terra de Rose e Crônica de Gabriel, as grandes estréias

Dois dos melhores filmes do ano acabaram ficando praticamente inéditos em Curitiba: após seis magras projeções (duas sessões foram canceladas), no sábado passado, 29, saíram de cartaz "Maurice", de James Ivory (Bristol) e "O Homem da Linha", de John Sterling (Cinema I). O motivo foi simples: apenas 39 espectadores do Bristol e 40 no Luz, "com uma renda que não dava sequer para pagar a luz gasta", explica Aleixo Zonari, lamentando ter tomado esta atitude, "mas num fim de semana prolongado com o feriado de 1º de maio, não poderíamos ter prejuízos elevados". As reprises que os substituíram - "Duro de Matar" (Die Hard), de John McTiernann e "Uma Cilada para Roger Rabbit", de Robert Zaemicks, provaram que têm ainda fôlego para atrair público: faturaram o suficiente para justificar a esticada em segunda semana. Quanto a "Maurice" e "O Homem da Linha", só resta a opção de vê-los em vídeo. Mais uma vez comprovou-se o óbvio: filmes premiados e elogiados pela crítica não atraem, infelizmente, o dito "culto e exigente" (que piada!) público curitibano. Nesta semana, pelos menos duas estréias importantíssimas: "Terra para Rose", o contundente documentário de Tetê de Moraes e "Crônica de uma Morte Anunciada", de Francesco Rosi - do romance de Gabriel Garcia Marquez. A semana ainda tem a reprise de "Mississipi em Chamas", de Alan Parker (Guarani) e bons filmes que continuam em cartaz, com casas lotadas: "Nas Montanhas dos Gorilas", de Michael Ated (Astor); "Uma Secretária de Futuro", de Mick Nichols (Plaza); "Um Peixe Chamado Wanda", de Michael Crichton (Lido II); "Irmãos Gêmeos", de Ivan Reitman (Lido II), "Rain Man" (Condor) e o interessantíssimo "Gauguin - Um Lobo atrás da Porta", do dinamarquês Henning Carlsen (Luz). Na sessão da meia-noite de amanhã no Groff, um Roman Polanski da melhor cepa: "Repulsa ao Sexo" (Repulsion), rodado na Inglaterra há 24 anos, com Catherine Deneuve - belíssima - numa interpretação densa como uma neurótica mulher. Este filme será reprisado no domingo, às 10h30 e quem não o viu deve procurar conhecê-lo. MARQUEZ NO CINEMA - Enquanto sua obra mais famosa, "Cem Anos de Solidão", não chega às telas (quem tinha os direitos de filmá-la era Glauber Rocha), Gabriel Garcia Marquez vai tendo outros textos adaptados à tela: "Erendira" foi filmado, com muita poesia, por Ruy Guerra e vários de seus contos estão sendo agrupados numa produção internacional, na qual o Brasil participou com "A Bela Palomera", pronto há dois anos mas ainda inédito. Garcia Marquez preside a Fundação do Cinema Latino-Americano, com sede em Cuba e que vem viabilizando uma escola na qual estão muitos brasileiros. Assim, é um escritor profundamente identificado ao cinema e, por certo, exigente na cessão dos direitos de seus textos. O italiano Francesco Rosi (não confundir com Franco Rosi, também cineasta italiano, mas de menor voltagem), realizou há três anos "Crônica de la Morte Anunciata", do romance de Marquez - levado a festivais internacionais (a partir de Cannes), mas que só agora está chegando no Brasil (em exibição no Groff, desde ontem). Com um elenco internacional - o inglês Rupert Everett; os italianos Ornella Mutti, Gian Maria Volonte e Lucia Bose; a grega Irene Papas (que teve uma notável atuação em "Erendira") e o francês Anthony Delon (filho de Alan), rodado num país latino-americano, com fotografia de Pasqualino de Santis e música de Piero Piccioni, "Crônica de uma Morte Anunciada" é daqueles filmes de visão obrigatória. Aos 67 anos, quase 50 de cinema, vindo de trabalhos de assistente de Luchino Visconti (1906-1976) em sua melhor fase ("La Terra Trema", 1948; "Belíssima", 1951; "Sedução da Carne", 1954), Rosi estreou como diretor em 1952, assinando como Goffredo Alessandrini, "Camicie Rosse". Apesar de ter se voltado já à temática política em "A Provocação" (1958), e "Renúncia de um Trapaceiro"(1959), seria com "O Bandido Giuliano" (1963) que passaria a motivar maior atenção da crítica internacional. Denunciando a especulação imobiliária em "La Mani Sulla Cittá" (1963, nunca projetado no Brasil), os bastidores da tourmaquia ("Os Bravos da Arena") e a corrupção italiana ("O Caso Mattei", "Cadáveres Ilustres"). Emotivo e sentimental ("Três Irmãos", 1980), espiritualista ("Cristo si é Fermato a Eboli", 1978, também inédito no Brasil), se voltou, em 1983, ao cinema operístico, fazendo uma versão de "Carmen" com Julia Migenes Johnson e Plácido Domingo. Perante uma filmografia tão respeitável, esta "Crônica de uma Morte Anunciada" se apresenta como a grande estréia internacional da semana. O DOCUMENTÁRIO DE TETÊ - Em 25 de outubro de 1987, dedicamos toda nossa página "Tablóide", para falar de "Terra de Rose", que assistimos em sua primeira exibição no XX Festival de Cinema Brasileiro de Brasília. Descrevemos a emoção que o filme provocou e a sua consagração, levantando seis prêmios na categoria 16mm. No mesmo ano, em dezembro, "Terra para Rose" obtinha os dois maiores prêmios do 9º Festival Internacional de Havana e, em setembro do ano passado, mais 4 prêmios da XVII Jornada Internacional de Cinema da Bahia. E se tivesse participado de outros festivais, novos prêmios teriam sido ajuntados. Mas o que Tetê de Moraes, ex-jornalista, exilada política na Europa e EUA durante os duros anos da ditadura militar, queria, era exibir o seu filme. Um documentário sincero, profundo e dos mais atuais - pois passados três anos de sua realização, o problema dos sem-terras - seja na Fazenda Anoni, no Rio Grande do Sul (focalizado no filme), seja em outras partes, continua o mesmo. Ou seja: sem solução. Mais difícil do que realizar o filme - rodado em 16mm e transposto para 35mm com muitas dificuldades (o trabalho foi executado em Los Angeles) tem sido conseguir mostrar esta obra de absoluta necessidade de ser visto por todos os que se dizem interessados na realidade nacional. Em Brasília, programado para entrar em cartaz após o XX Festival, em outubro do ano passado, foi prejudicado pela greve dos funcionários da Fundação Cultural do Distrito Federal. Programado para estrear no Rio de Janeiro no dia 15 de março, foi também vítima da confusão provocada pela greve geral. Para conseguir o Cine Ritz, Tetê de Moraes teve que vir a Curitiba e bater o pé firme, para que o filme não fosse parar no Groff. A idéia de ampliar o lançamento, com sua presença para debates, ficou frustrada, pela estranha "decisão" da diretoria da Fucucu/Secretaria Municipal de Cultura, em lhe negar uma passagem. Ontem e hoje, na Cinemateca, dois outros documentários de Tetê - "Quando a Rua Vira Casa" e "Lages, a Força do Povo" - são exibidos, abrindo a mostra "O Documentário Brasileiro e a Terra", que inclui para o dia 7, os curtas "Nós e Eles" (1976, de Augusto Sevá); "Vento Contra" (1976, de Adriano Matoso); "Missa de Terra sem Males" (1980, de Conrado Berning) - e que prosseguirá no dia 9, terça-feira, com "O Desapropriado" (1984, de Frederico Fullgraf) e "A Classe Roceira" (1985, de Berenice Mendes. Dia 10, o longa "Terra, a Medida do Ter", 1982, de Maria Helena Saldanha. LEGENDA FOTO - "Duro de Matar", um filme de muita ação - e que concorreu ao Oscar de efeitos especiais - retornou no Bristol, para substituir "Maurice" e ficou em segunda semana.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Cinema
8
05/05/1989

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