Login do usuário

Aramis

Uma amarga decisão (e a desatenção com o público)

Baseado em fatos reais "O Expresso da Meia Noite" (Midnight Express, 1978, de Alan Parker) denunciou a violência sofrida por um jovem norte-americano, Billy Hayes (interpretado por Brad Davis, falecido há poucos meses vítima da Aids), preso na Turquia como traficante de haxixe. O filme - que recebeu várias indicações e o Oscar de melhor roteiro (Oliver Stone) acabou provocando problemas com aquele país - mas ficou como um denúncia dos mal tratos dispensados pela polícia turca a prisioneiros estrangeiros. Dez anos depois, o francês Pierre Jollivet realizou também um filme sobre a prisão de um jovem, no caso um holandês, Hans (Thom Hoffmann) por conduzir uma quantidade de droga que o caracterizava como traficante - e por isto é condenado à morte. Só que o roteiro do próprio Jollivet em colaboração com Oliver Schartzky não identifica o país da Ásia em que o fato acontece. Nem por isto, "Caso de Força Maior" (Cine Luz) deixa de ser um filme tão forte e importante quanto foi "Midnight Express" de 1978. Produção de 1988, tendo estreado em Paris em 5 de abril de 1989 e chegando ao Brasil em distribuição das Belas Artes, "Force Majeure" é mais do que um filme sobre drogas, um hino à consciência, a responsabilidade e a dignidade da amizade. Três jovens que viajam pela Ásia separam-se e um deles, o holandês, fica com as drogas deixadas pelo companheiros. É preso e condenado à morte. 18 meses depois, um advogado, Malcolm (Alan Bastos), da Anistia Internacional, e a ex-amante de Hans, Katia (Kristin Scott-Thomas) localizam os dois antigos companheiros de viagem, na França, e tentam convencê-los a viajar ao país em que se encontra o amigo condenado - pois com a divisão da responsabilidade os três teriam suas vidas poupadas. Durante 86 minutos, o filme tem o ritmo tenso sobre a decisão dos dois franceses em sacrificarem pelo menos dois anos de suas vidas para salvar a vida de um antigo companheiro de andanças juvenis: Daniel (Drançoise Cluzet), casado, um filho, mesmo contra a vontade da mulher, decide viajar, enquanto Philipe (Patric Bruel), preparando-se para o exame de doutorado, solteiro, mostra-se reticente. Numa linguagem minimalista, explorando com sensibilidade as reações humanas de pessoas que, num momento, têm seus projetos de vida sacrificados em favor de um fato inesperado, Pierre Jollivet construiu um dos filmes mais densos e psicologicamente profundos sobre os riscos de uma decisão. Com roteiro preciso, perfeita trilha sonora de Serg Parathoner e Jannick Tol, com uma fotografia de Bertrand Charty que capta todas as nuanças dramáticas. xxx É lamentável que a "coordenação de cinema" (sic) da Fucucu continue a agredir o público que frequenta as salas oficiais de exibição - especialmente o Luz, conveniado com o Circuito Belas Artes e que garante uma programação de alto nível - insistindo em manter intervalos que vão de 30 a 40 minutos entre as sessões. Devido a esta desatenção para com o público, os espectadores que chegam após o filme ter iniciado são obrigados a permanecerem por um longo período nos cinemas, a espera da sessão seguinte. Nos circuitos comerciais, administrados com competência, as sessões corridas procuram reduzir ao mínimo os intervalos. No caso da Fucucu - mantida com recursos públicos (e tendo um custo/dia superior a Cr$ 10 milhões) sua obrigação seria prestigiar os curta-metragens nacionais e programá-los nas sessões em que os longas têm metragem inferior ao normal. Bons curta-metragens não faltam e tanto é que hoje encerra no Cine Groff a mostra "Cinema Cultural Paulista", promovido graças a generosidade do Museu da Imagem e do Som de São Paulo e apoio do Goethe Institut. Os curtas, acavalados nesta programação, deveriam ser exibidos isoladamente, nas sessões normais, para que todos os espectadores conhecessem estes criativos trabalhos. O que infelizmente, não acontece.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
20/02/1992

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br