Wynton faz trilha antológica homenageandoDuke Ellington
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 05 de maio de 1991
Com apenas 30 anos de idade - a serem completados no dia 18 de outubro, Wynton Marsalis é hoje o maior nome do pistão. Nascido em New Orleans, filho de uma família musical - o pai é pianista de jazz Ellis e o irmão, Branford, também está hoje já com uma carreira consagrada. Wynton não ficou apenas no jazz. Sua coleção de premiações - incluindo vários Grammy e dezenas de discos de ouro - o consagra também como um músico erudito. Dividindo sua ocupadíssima agenda entre gravações jazzísticas e eruditas - praticamente com toda sua discografia editada simultaneamente na Europa, Estados Unidos e Brasil, Wynton chega agora também ao cinema, como autor e principal intérprete da trilha sonora de "Tune in tomorrow", de Jon Amiel, baseado no romance "Tia Júlia e o escrivinhador" de Mário Vargas Llosa.
Em lançamento da Sony Music (ex-CBS), "Tune in tomorrow" é, desde já , um dos discos do ano. Pode entrar tanto como álbum de jazz como na relação das melhores trilhas sonoras. Marsalis inspirou-se num de seus ídolos, o múltiplo Duke Ellington (1899-1974), que, em 1959, a convite de Otto Preminger (1906-1986), criou e executou uma trilha sonora antológica: "Anatomia de um crime", com James Stewart, Bem Gazarra e Lee Remick.
Para o filme "Tune in tomorrow", - cuja ação se passa em New Orleans, sua cidade natal - Marsalis desenvolveu uma trilha-sinfonia que ganha vida independente das imagens. O filme, dirigido por um novo cineasta, ainda desconhecido no Brasil - Jon Amiel, e com apenas dois intérpretes conhecidos no elenco, Barbara Hershey e Peter Falk (*), deve só pelo seu score musical, ter uma força notável.
Pois, a audição desde os temas de abertura - "Big trouble in the easy" e "Kings of the garden districts", utilizando o sax na execução de Wes Anderson como "um misterioso, criativo e comtemplativo elemento", faz o ouvinte atento mergulhar num clima de imensa magia. Em "Crescent city crawl", há uma intervenção quase religiosa do órgão executado por Lucky Peterson. Um momento mais demorado, "Sunsetin'On the Bayou", divide-se em quatro movimentos, quase como uma mini-suíte. Autor de 17 do 18 temas desenvolvidos neste álbum, Marsalis aproveitou apenas um standard clássico, o belíssimo "I can't get started" de Vernon Duke (1903-1969) e Ira Gershwin (1896-1983).
Crescent City - o afetivo adjetivo cunhado para New Orleans (como New York é a Big Apple) no tema musical criado por Marsalis ganhou também o subtítulo de "On the St. Charles Streetcar Line", uma das muitas referências geográficas que, na leitura das intenções com que desenvolveu a trilha, Wynton buscou caracterizar este seu trabalho.
Além da competência de Wynton como compositor e pistonista, este álbum vale também pela junção de uma nova geração de instrumentistas do primeiríssimo nível. Assim temos Wes Anderson (sax alto), Wycliff Gordon (trombone), Herlin Riley (bateria), Marcus Roberts (piano), Reginald Veal (baixo) e Todd Willians (sax, tenor, baixo e clarinete). Participações especiais também notáveis, como a de Warren Bernhard, no órgão em "King's of the Garden District", Harvey Estin no sax alto em "Albanians" e os vocais de Johnny Adams ("May be fact or fiction) e Shirley Horn ("The way of love" e "I can't get started").
Enriquecendo o álbum, notas de contracapa de Stanley Crouch, com o próprio Marsalis explicando a concepção de cada faixa. Um lançamento de primeira categoria.
Nota
(1) O roteiro de "Tune in tomorrow" é de William Boyd; no elenco, também esta Keanu Reeves e a produção é de John Fiedler/Mark Tarlov.
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