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Aramis

A cidade, os técnicos e os enganos (II)

No seminário que participa, em Washington, sobre crescimento de cidades, o arquiteto Lubomir Ficinski, que por 6 anos presidiu o IPPUC, está defendendo idéias relacionadas à política urbana, com base na experiência de Curitiba. E um dos pontos que levanta em seu estudo - distribuído em português e inglês, trata de um tema na ordem do dia: automóveis e combustíveis. Assim paralelamente ao processo irracional de ocupação do solo, apoiado e alimentado pela pobreza das populações migrantes e pela especulação imobiliária, Ficinski lembra outro fator para a deteroirização do meio urbano: o automóvel. "Enquanto, o loteamento especulativo trabalha contra o saudável meio urbano, agindo na base da pirâmide social, o automóvel opera no seu topo", lembra o ex-presidente do IPPUC - hoje membro do Conselho Nacional de Política Urbana. Assim faz as seguintes colocações. "Sendo fora de dúvida o meio de locomoção mais cômodo, pois não apresenta condicionantes para o seu usuário em termos de trajeto ou horário e, dando a falta de existência de alternativas, as faixas mais favorecidas da população a se utilizar desse meio como uma forma de aumentar ao máximo a sua mobilidade, fazendo surgir os bairros ricos, às vezes na periferia das cidades maiores, os quais embora distantes do centro tradicional são valorizados social e ecologicamente. A satisfação dessa nova demanda de serviços públicos, devido à grande capacidade de pressão social e política dos moradores, acaba absorvendo boa parte dos já poucos recursos públicos. Com isso o automóvel evolui de um simples meio de transporte para um instrumento de domínio e submissão da cidade a seus proprietários, gerando a destruição do tecido urbano tradicional, devido à necessidade de ampliação das vias e locais de estacionamento, além da construção de ligações com bairros distantes (muitas vezes atravessando os pontos de menor resistência que são exatamente as áreas verdes e de lazer já existentes) e de um notável aumento do consumo global de combustíveis. Recentemente, a mobilidade que o automóvel conferiu às faixas mais favorecidas da população urbana, fez surgir o gigantismo dos equipamentos (hipermercados e "shopping centers". Entre nós estes superequipamentos são, antes de mais nada, concorrentes do centro tradicional, que discriminam a sua clientela por estarem aliados a uma ideologia do automóvel e da concentração de renda. Assim, o grande equipamento favorece ao automóvel pelas facilidades de acesso e estacionamento e pelas origens muito dispersas de sua clientela. Ao congestionamento dos centros se responde com a localização de grandes equipamentos fora deles. No processo os centros acabam sendo esvaziados e abandonados à marginalização e delinqüência. Cidadão perde de vista a sua cidade, fica sem a referencia e identificação cívica e política que o centro confere a vida urbana. De outro lado, a rarefação da periferia, que utiliza o solo como um "continuam" de baixa densidade, sem nenhuma preocupação com a paisagem urbana, dificulta e torna onerosa a organização de transporte, saneamento básico e segurança pública. O processo empobrece, pois, a grande maioria que, não podendo pagar mais pelos serviços e um ambiente ameno, terá que se conformar em não tê-los. O resultado de tudo isso é que se está sacrificando não somente o homem e o meio natural, mas o próprio meio natural, mas o próprio meio construído, às vezes secular e depositário de valores estéticos e históricos que são o registro vivo de toda uma cultura e, na maior parte das vezes, insubstituíveis. Infelizmente, o que temos feito nesse processo de destruição e reconstrução é roubar muito mais do passado do que acrescentar para o futuro". LEGENDA FOTO 1 - Ficinski em Washington.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Tablóide
9
17/10/1980

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