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Hermínio dirige os Caymmi para um concerto histórico

Poucas pessoas poderiam sentir-se mais realizadas do que Dorival e Stela Caymmi. Afinal, quando se vê não apenas um, mas os três filhos dando continuidade a uma obra iniciada pelos pais, a alegria é imensa. De Dorival Caymmi, 64 anos a completar no próximo dia 30, é desnecessário falar: afinal, são 50 anos de vida musical, com uma obra da maior qualidade, Stela Maris, sua esposa, ele conheceu num programa de calouros, na Rádio Nacional e, em abril de 1940, casaram. Vieram os três filhos, Nana (Dinair), 39 anos, Dori, 37 e Danilo 36 - e se Stela parou de cantar profissionalmente (embora sua voz continue belíssima e quem tem o disco "Caymmi Visita Tom", Elenco&Philips pode ouvi-la numa das faixas), os filhos desde cedo seguiram os caminhos musicais. Cada um com seu próprio estilo, mas todos identificados pelo talento, bom gosto, segurança. Há 5 anos, nas comemorações de inauguração do auditório Bento Munhoz da Rocha Neto, a semana de MPB foi aberta com o encontro da família Caymmi. Foi um espetáculo muito improvisado, onde não se pode ter a grandeza desta riqueza familiar musical. Reunir os Caymmi no palco não é fácil! Dorival dificilmente troca a tranqüilidade de sua casa nas margens do Rio das Ostras, interior do Estado do Rio, para fazer um espetáculo e, no ano passado, mais por razões sentimentais, aceitou fazer o "Caymmi em Recital", com direção de Hermínio Bello de Carvalho e apresentado somente em Salvador, sua terra Natal - e que ele tanto cantou. Agora, o mesmo e incansável Hermínio decidiu reunir os três irmãos, num recital que terá uma única apresentação em Curitiba: sábado, às 21 horas, no Guairão. Com ingressos a preços populares: Cr$ 50,00 a Cr$ 150,00, dependendo da localização - e que na próxima semana já estarão à venda. Ontem, na inauguração da praça Jacob do Bandolim, que o trouxe a Curitiba junto com Joel do Nascimento (8bandolim) e Maurício Carrilho (violão) - Hermínio comentava que será um único espetáculo - "e que dificilmente sofrerá repetição - pelo menos até novembro de 1980". A dificuldade de conciliar datas dos 3 artistas tem impedido que eles se apresentem juntos com mais [freqüência]. Nana morou na Venezuela e Argentina, viaja muito e agora está fazendo seu segundo elepê para a EMI-Odeon, com arranjos do irmão Dori (que planeja fazer um lp independente, pois até agora só tem um único - e maravilhoso - disco gravado). Danilo, que também fez seu lp alternativo ("Cheiro Verde", 78), flautista (além de compositor e cantor) muito solicitado para gravações, prepara um novo lp e consolida uma nova parceria com Hermínio. xxx Entre tantas cantoras brasileiras, Nana é uma das que mais emocionam. A monumental vai que, grávida, recebeu a canção "Saveiros" (Dori/Nelson Motta), no FIC-66, poderia ter estigmatizado autores e a intérprete. Também o fato de levar um sobrenome ilustre e de não fazer nenhuma concessão em seu repertório, fez com que Nana raramente incursionasse pelos estúdios de gravação. Seu primeiro lp, embora tenha recebido da crítica os maiores elogios, não chegou às rádios. Com seus irmãos Dori e Danilo participou então, de um lp antológico, que só um produtor como Aloysio de Oliveira poderia idealizar: "Tom Visita Caymmi". Ainda assim o sucesso tardava a chegar. Isso no Brasil, pois lá fora, consolidava sua carreira, criando um mercado que até hoje lhe franqueia solenemente as portas e onde grava com assiduidade (apenas um daqueles discos encontra-se editado no Brasil). Mas Nana continuou lutando, fiel a sua linha de atuação e o reconhecimento veio com o tempo. Em "Renascer" (CID, 75), gravaria uma das mais belas músicas da década - "Beijo Partido", de Toninho Horta (que agora Flora Purim [internacionalizou], incluindo em seu lp, "Carry On", WEA). No mesmo disco, outra obra-prima: "Mãos de Afeto" (Ivan Lins/Victor Martins"). Em 1976, na série "Seis e Meia", outras das bolações de Hermínio, no Teatro João Caetano - e embrião do projeto Pixinguinha - Nana, ao lado de um tímido e nervoso Ivan Lins ("eles nem vão se lembrar mais de mim" desabafava para Hermínio) ela conheceu uma das maiores ovações já tributadas a um artista. A partir daí o rótulo de "cantora maldita" e de "intérprete de elite" foram descolados de sua testa. De lá para cá, Nana fez mais dois LPs - um na RCA, outro na Odeon (todos incluídos em nossas listas dos melhores de cada ano), mantendo sempre o mesmo critério de bom gosto na escolha de seu repertório. Abriu a primeira série do "Projeto Pixinguinha", ao lado de Ivan Lins e os aplausos foram imensos. O público desmistificava a máquina. Entre aquela vaia de 14 anos passados e a consagração recebida de um público que estava apenas potencializado, Nana hoje se orgulha de ser não somente uma das maiores intérpretes do Brasil, mas também uma das artistas mais queridas de nosso público. xxx De Dory, seu irmão, muito se poderia falar. Autor de músicas como "O Cantador" (parceria c/Nelson Motta, que deu a Elis Regina, o prêmio de melhor intérprete no Festival da Record), de "Saveiros", com o mesmo parceiro. Arranjador e compositor, fez uma das mais belas canções criadas para uma telenovela: o tema de "Minha Doce Namorada" e a trilha sonora do filme "Tati A Garota", longa de estréia de Bruno Barreto, do conto de Anibal Machado. Arranjador da maior competência, fez um dos mais belos discos dos anos 60, infelizmente há anos fora de catálogo. Embora ligado a gravadoras, pretende seguir o caminho do irmão Danilo, e auto-produzir seu próximo lp. Antes de tudo instrumentista, Danilo Caymmi também canta e compõe, "Seu "Cheiro Verde", segundo lp alternativo, mostrou novas facetas de seu talento e o levou a todo o Brasil e agora, no próximo sábado, mostrará músicas de seu próximo disco. Com roteiro e direção de Hermínio, assistência de Lígia Ferreira, "Os Caymmi em Concerto" tem um grande significado em termos musicais: a estréia nacional em Curitiba de um espetáculo com o capricho, a seriedade e competência que caracteriza tudo que Hermínio se propõe a fazer, como foi no ano passado, no "Tributo a Jacob do Bandolim" com a Camerata/Carioca (que nasceu em Curitiba, em agosto/79>) e, em julho, vai a Martinica, depois de trazer outra estréia nacional: "Vivaldi e Pixinguinha", com o maestro, pianista e compositor Radamés Gnatalli. xxx Hermínio explica, em sua sinceridade, o que o motivou a dirigir os 3 irmãos Caymmi - de temperamentos diversos, nem sempre dos mais fraternais, mas imensamente talentosos, após ter feito o "Caymmi em Recital". Fala Hermínio: "Nunca escondo de ninguém que Nana é uma das minhas intérpretes favoritas, embora nunca tenha gravado nada meu. Eu me considero, sem nenhuma modéstia, bastante responsável pelo impulso popular que sua carreira sofreu a partir da série "Seis e Meia". Porque, pelo menos para mim, era visível que Nana não tinha acesso ao público porque os meios de comunicação sonegavam o seu trabalho. Ela não era vista na televisão, nem seus discos eram regularmente executados nas rádios. Porque fossem ruins? Não, isso fazia parte de um grande e preconceituoso esquema que a rotulou de cantora de elite, impopular - porque esse é o meio que os incompetentes utilizam para esconder suas fraquezas e falta de ousadia. Mas foi levar o povo até Nana para se compreender que havia uma relação de respeito que apenas não se firmara pelo motivo mais simples: o produto, na prática, jamais fora levado ao consumidor. Já Dori, eu sempre o respeitei como um compositor fantástico e um arranjador dos mais competentes. Mas eu o considerava antipático, arredio, de nariz muito em pé para o meu gosto. Depois fui descobrir que eram defesas para a sua timidez. Hoje é difícil não ser amigo de Dori. Com Danilo a relação é mais recente. A gente se encontrou em Belém do Para, me convidaram para uma "canja" na apresentação dele, de Antônio Adolfo e de Walter Queiroz no Teatro da Paz, e aí a Elza Soares também foi lá e cantou comigo "Pressentimento". Desde aquele dia tornamo-nos parceiros, que acho a forma mais bonita de se concretizar uma amizade. É como se dois homens fizessem filhos juntos". LEGENDA: Nana: sábado
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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Tablóide
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13/04/1980

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