Os ensinamentos de Harry, 40 anos da toca da Raposa
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 06 de junho de 1987
Há 32 anos, quando o Cinema Scope começava a se internacionalizar - havia surgido em 1953, nos EUA, como reação a então crescente concorrência da televisão - um jovem executivo de origem grega, Harry Anastassiadi, se preocupava em que os cinemas das principais cidades brasileiras se equipassem para lançar o primeiro filme realizado nesta nova bitola, "O Manto Sagrado" ("The Robe", 1953), de Henry Koster, do romance de Lloyd C. Douglas e com Jean Simmons (no auge de sua beleza), o esbelto Richard Burton e o já caricato Victor Mature. Em Curitiba, o CinemaScope chegou antes, pelas mãos de Ismail Macedo, executivo de Orcopa, que no cine Ópera - esplendorosa sala de exibição (hoje transformada na loja de departamentos Mesbla), conseguiu equipar a tempo o cinema e ali lançar a primeira produção da MGM em CinemaScope, "Os Cavaleiros da Távola Redonda" (1953, de Richard Thorpe), com Robert Taylor, Mel Ferrer e Ava Gardner (também no auge de sua beleza). Em compensação, "O Manto Sagrado", ao inaugurar o sistema no cine Avenida, alcançou êxito maior e permaneceu 12 semanas em cartaz.
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Harry Anastassiadi, trabalhando na Fox desde 1947, é um homem que sabe muitas histórias dos bastidores do cinema. Afinal, são 40 anos de seus 70 anos ligados a uma mesma empresa, uma das três maiores da indústria cinematográfica, fundada praticamente em 1903, quando o imigrante húngaro William Fox (1899-1952) descobriu o encanto das "imagens vivas", decidindo investir suas poucas economias em uma pequena loja cheia de cadeiras dobráveis. Era o início da empresa que cresceria com a chegada do som ao cinema na década de 20, quando desenvolveu o processo Movietone. Oficialmente, como 20th Century Fox, a empresa passou a existir a partir de 1935, época em que Darryl Francis Zanuck (1902-1977) já era um de seus tycoons.
Ao longo de mais de seis décadas, o estúdio da Raposa inundou o mundo com mágicos momentos, contribuindo para fazer do cinema o grande entretenimento. Ao lado dos astros, estrelas, realizadores, homens eficientes como Harry Anastassiadi espalhados em postos-chaves por dezenas de países souberam sempre equacionar o lado econômico da empresa. Reconhecido em suas virtudes - sua fala suave e gestos calmos, sempre atencioso, competente e buscando sempre um bom diálogo com exibidores e outros setores, o "seu" Harry foi homenageado na quinta-feira, 4, no Hotel Rio Palace, quando reuniram-se funcionários, empresários e pessoas ligadas à cinematografia.
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Harry Anastassiadi não gosta de falar sobre si mesmo. Assim, seus amigos colecionaram frases que definem o seu modo de ver o mundo. Eis algumas.
"Vivo intensamente o dia-a-dia. Cada dia que acordo é um dia ganho".
"A grande conquista do cinema foi o som e os 70 mm".
"Tyrone Power era muito educado e cativante. Já Yul Brynner era refinado, mas um pouco difícil. Estava sempre querendo fazer coisas incríveis. E Lana Turner não era produzida: era bonita mesmo."
"O exibidor é parte da companhia. E nosso sucesso é mútuo. Desde 1959 nossa idéia é trabalhar sempre com as mesmas empresas. Aliás, a Fox é a única empresa que leva os exibidores às suas convenções. Fico feliz em vê-los ao nosso lado".
"Eu vejo a vida da seguinte maneira: hoje é hoje. Ontem já acabou. Nunca olho para o passado".
"Quando cheguei ao Brasil passei momentos difíceis. Andar de bonde era como andar de Rolls-Royce".
"A receita do sucesso? Subir devagar. Não ser vedeta. Tentar fazer sempre o melhor".
"Sou um homem profundamente religioso. Acho que existe alguma coisa mais poderosa e que nos dá muito conforto".
"A vida ensina tudo. Ensinou-me o que sou: a agüentar tudo".
"Não gosto de muita conversa. Gosto de sim e não. E ouço mais do que falo".
"O trabalho deve ser reconhecido sempre. Nada de "pistolões".
"O que é importante? Paz de espírito. E uma conversa limpa para com os outros".
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