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Irving Berlin, 100 anos - Deus salve o último dos 5 grandes da canção americana

"Irving Berlin não tem lugar na música americana: ele é a música americana". (Jerome Kern, 1885-1945) "Berlin é o Franz Schubert americano" (George Gershwin, 1890-1937) Viver um século é raridade. Um gênio completar um século, uma efeméride. No show business, um centenário como o de Irving Berlin - nesta quarta-feira, 11 de maio - só lembra-me duas outras efemérides: os cem anos de Adolph Zukor, o poderoso tycoon, imigrante húngaro, que foi um dos fundadores de Hollywood - completados em 1973 (faleceria três anos depois, 11 de junho de 1976) e, no jazz, o centenário do pianista, compositor e líder Eubie Blake, transcorrido em 7 de fevereiro de 1983, e que não resistiu as comemorações. Morreu, poucos dias após. Que as emoções não perturbem Irving Berlin, o último dos gênios da música americana - remanescente dos cinco grandes: Gershwin, Kern, Cole Porter e Richard Rodgers. Há pelo menos três anos, vinha torcendo para que o autor de "Deus Salve a América" chegasse ao centenário , para ter a alegria de escrever não um necrológico, mas um breve texto de saudação a um gênio criador de sua dimensão. Sérgio Augusto, o mais bem informado jornalista brasileiro em termos de entretenimento, também deve ter pensado o mesmo e no domingo, ao lado de outro fã do que há de bom na música americana, Ruy Castro, lembrou o centenário de hoje, em bela reportagem na "Fôlha de São Paulo". Considerando a importância da obra de Berlin e o inusitado de um criador chegar a 100 anos de vida, até que as notícias a respeito estão sendo reduzidas. É bem verdade que desde 1962 ("Mr. President"), Bergman se afastou de qualquer atividade mais intensa e, rigoroso com sua obra, acha que não produziu nada de importante depois. Há 10 anos, quando de seus 90 anos, já afastou repórteres e dispensou comemorações em torno daquela data, com uma frase tão boa que, lembrada por Sérgio Augusto, não resisto de repeti-la. - Idade não é documento. Depois de certo tempo, colecionar aniversários vira uma chatice. HUMILDADE DE UM GÊNIO - Muitos e muitos anos antes, Berlin já havia dito outra frase - esta representativa daquele axioma de que quanto maior o valor de uma pessoa, maior a sua simplicidade e modéstia. - Brahms escreveu música. Eu só escrevi canções. E como escreveu! Seu nome só não está na mais recente edição do Guinness Book of Records porque não há, com certeza, uma musicografia completa desde que, a partir do final de primeira década deste século, começou a compor. E fez de tudo: baladas, canções de amor, hinos, músicas cívicas, para enaltecer datas (Natal, Páscoa), musicais para a Broadway, ouvindo-o, custava a acreditar que aquela canção que mostrava, em primeira mão, fosse da autoria do mesmo mestre de tantos sucessos. Berlin então tocou "White Christmas" - um de seus maiores êxitos. A interpretação ao piano, mostrou que ele era mesmo o autor. A genialidade estava na criação, não na interpretação. Como Cole Porter (1891-1964), sempre foi um compositor e letrista - sendo citado, por muitos historiadores, ao lado de Lorentz Hart (1895-1943), como um dos três maiores letristas americanos. A abordagem de suas canções sempre foi direta e, ao contrário de Porter - filho de família rica, educado em Yale e com formação européia (morou anos em Paris), Berlin sempre fez canções extremamente populares. Nem poderia ser diferente, para quem era filho de imigrantes russos-judeus, que deixaram Temun, na Rússia, no final do século e vieram para a América. Com apenas quatro anos, Berlin - na época, ainda com seu nome verdadeiro, Israel Balene - vivia num dos mais miseráveis prédios do Lower East Side, em Nova Iorque. Em 1911, com apenas 13 anos, Berlin compunha "Alexander's Ragtime Band", que se tornaria o maior sucesso no início do século, popularizando o ritmo rag - que teve, entretanto, seu criador em Scott Joplin (1868-1919). Três anos depois de "Alexander's Ragtime Band", Berlin escreveria o seu primeiro musical - "Watch Your Step", com libreto de Harry Smith e que o produtor Charles Dillingham apresentaria no New Amsterdam Theatre, com estréia em 8 de dezembro de 1914 - para uma carreira de 175 performances. Foi o primeiro de um total de 21 musicais que, por 48 anos encantariam o público na Broadway - e ao longo do qual surgiram mais de cem standards da música americana, conhecidas e amadas em todo o mundo. Depois de escrever uma das "Ziegfield Follies", para o lendário produtor Florenz Ziegfeld (1869-1932) - que estreada no Casino Theatre, em 5 de agosto de 1915, ali teria 356 performances, Berlin, com "Music Box Revue", inauguraria em 22 de setembro de 131, o seu próprio teatro - com o nome deste musical, numa antologia de canções e que permaneceria mais de um ano em cartaz. Suas canções refletiam uma imagem idealizada dos EUA, enalteciam valores, marcavam efemérides e tinham um sentimento patriótico, o que faria musicais como "Face the Music" (estreado em 17/2/1932) ou "As Thousand Cheer" (estreado em 30/9/1933) - no qual era lançada a canção "Easter Parade" (Desfile de Páscoa, em 1948 transformada num filme musical com Judy Garland' e Fred Astaire) consolidarem-no definitivamente. Um homem identificado aos valores americanos, não deixaria de dar sua contribuição aos esforços de guerra, tanto na primeira ("Yer Yep, Yephank"), como na segunda ("This Is The Army"), ou tomar como temática um episódio histórico - a compra da Louisiana pelos EUA - para outro de seus musicais ("Louisiana Purchase", estreada no Imperial Theatre, em 28/5/1940). Quando Richard Rodgers (1902-1979) e Oscar Hammerstein (1895-1960), em 1945, sugeriram que Berlin trabalhasse num musical sobre a lendária atiradora do Oeste Americano, Annie Oakley (1860-1920), em colaboração com Dorothy (1904-1974) e Herbert Fields, Irving não se entusiasmou com o projeto. Entretanto, uma semana depois aprontaria as canções para "Annie Get Your Gun", que estreando em 16 de maio de 1946, seria o seu maior sucesso, com 1.147 apresentações no Imperial Theatre - e trazendo, entre outras canções, aquela que seria o verdadeiro hino do mundo do espetáculo - "There's No Business Like Show Business". "Like..." ficou como sinônimo de mundo dos espetáculos, assim como "White Christmas" a música natalina por execlência e "Easter Parade", uma canção identificada a Páscoa - três apenas dos muitos temas que Berlin faria para datas especiais - que resultariam num dos filmes musicais que escreveu ("Holiday Inn", 1942, já por três vezes reprisado na televisão). O musical seguinte de Berlin, não teve o sucesso merecido - "Miss Liberty", com o libreto do dramaturgo Robert Sherwood (1896-1955), em sua única experiência no campo musical - mas marcante já pela aproximação com o coreógrafo Jerome Robbins, que, no ano seguinte (1950) voltaria a trabalhar novamente com Berlin, em "Call Me Madam", estreada em 12/10/1950, uma suave sátira a Perie Mesta, famosa hostess de Washington que o presidente Truman nomeou como embaixadora no principado de Luxemburgo. A intérprete foi Ethel Merman (1905-1984), que já havia sido Annie Oakie e foi, em seu época, a maior estrela dos musicais de Berlin seria "Mr. President" (1962), que reunindo um ator dramático - Robert Ryan (1909-1973) a atriz e cantora Nanette Fabray, não teria mais do que 265 performances - apesar de, com ingressos vendidos antecipadamente, ter faturado um milhão de dólares - um recorde para a época. Berlin, aos 76 anos afastava-se dos musicais da Broadway, mas não deixaria, por muitos anos, de compor canções - embora, modestamente, sempre minimizasse a qualidade destes trabalhos. Mas como minimizar o trabalho de um compositor que legou canções como "Top Hat, White Tie and Tails", "Check To Cheek" (talvez o mais conhecido fox de todos os tempos), "I've Got My Love to Keep Me War", "Alexandre's Rag Time" e "White Christmas"? Sem falar em "God Bless The America", um verdadeiro hino americano! LEGENDA FOTO: Dois gênios do musical americano: Richard Rodgers (1902-1979) e Irving Berlin, 100 anos a serem completados nesta quarta-feira, 11 de maio.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
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10/05/1988

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