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Aramis

Depois de 47 anos, os sambas que Vila gravou para América

Aquelas 16 gravações que há quase 50 anos são privilégios do mais reduzido grupo de apaixonados pela música brasileira serão, dentro em breve, democraticamente ouvidas por quem se interessar. Finalmente, a maior raridade em termos de registros feitos com artistas populares do Brasil estará ao alcance de qualquer um, acabando assim um verdadeiro mistério de nossa MPB. Explicando: há 47 anos, a bordo do navio Uruguay, o maestro Leopoldo Stokowsky (1882-1977), gravou 48 fonogramas com a participação de um grupo de compositores e intérpretes reunidos por seu amigo, Heitor Villa-Lobos. De volta aos Estados Unidos, 16 destes fonogramas foram editados pela CBS americana em dois álbuns de 78 rpm, com oito músicas em cada um, com o título de "Brazilian Native Music". Como estas gravações nunca foram prensadas no Brasil, as coleções se tornaram raridades. Acredita-se que nestas quase cinco décadas, apenas uma dezena de brasileiros conseguiu tal preciosidade em termos de documentação. Agora, extraídas da coleção que apresentou melhor qualidade - pertencente ao crítico e pesquisador Mozart Araujo, acabam de produzir um elepê, que, dentro de 90 dias estará ao alcance dos interessados. xxx Tentativas para fazer tal reedição há muito vinham acontecendo. Em 1973, - quando o compositor Marlos Nobre dirigia o Instituto Nacional de Música, nomeado pelo então ministro Ney Braga, um dos projetos foi a reedição de trabalhos históricos da MPB, quando Maurício Quadrio coordenou a série "Os Pioneiros", com alguns dos primeiros fonogramas feitos na Casa Edson e no selo Odeon, um dos mais antigos do Brasil. Na época, o crítico e pesquisador Ary Vasconcelos, 62 anos, iniciou prospecções junto a CBS para transformar em elepê a preciosíssima coleção produzida pelo maestro Stokowsky em 1940. As tentativas foram frustradas. Posteriormente, quando o empresário Marcos Marcondes estruturou a básica e referencial "Enciclopédia da Música Brasileira-Erudita, Folclórica, Popular" (dois volumes, Art Editora, São Paulo, 1977), a intenção era oferecer aos que adquirissem o pacote, um elepê com o histórico registro. Consultada a CBS, veio a resposta, dada por um executivo mal informado, de que "os fonogramas pertencem ao Departamento de Estado americano" - uma vez que a viagem que Stokowsky fizera a América do Sul, em 1940, integrava-se dentro da Política de Boa Vizinhança. Marcondes havia chegado a prensar 100 cópias do disco, de uma matriz já mixada no qual eliminara os ruídos. Mas com a resposta da CBS, foi obrigado a cancelar o projeto e substituir o disco por um elepê sem o violonista Toquinho (Antônio Pecci Filho, 41 anos). Mas Marcondes não se satisfez com a resposta. Numa de suas viagens foi a Washington e, diretamente no Departamento de Estado, soube que em tempo algum, houve qualquer intervenção do organismo em relação a edição da coleção - feita sob a responsabilidade da divisão fonográfica da poderosa Columbia Broadcasting System. Na CBS americana, foi dado, finalmente, o sinal verde para um reedição - mas surgiu um problema: a fita original, feita em 1940, era impossível de ser localizada. A opção, então, era fazer a cópia a partir de uma coleção de discos. A qualidade poderia ser prejudicada, mas era a única forma prática. xxx Agora, graças a presença do pesquisador Suetônio Valença, autor de "Tra-La-Lá", uma biografia de Lamartine Babo (edição Funarte, 1981), e ex-secretário da Associação de Pesquisadores da Música Popular Brasileira, na Pró-Memória, o projeto de lançar um documento sonoro tão importante como este foi reaquecido. Suetônio encontrou em Jairo Severino, 65 anos, pesquisador e produtor dos mais importantes em projetos culturais, um importante aliado, e com o entusiasmo do violonista Turibio Santos, diretor do Museu Villa-Lobos, em que chegue ao público, tudo que for possível em relação a obra do maior dos compositores brasileiros, neste ano em que se comemora o centenário de seu nascimento, a idéia se concretizou. Graças a modernos recursos técnicos, os oito 78 rpm prensados em 1940, nos Estados Unidos, foram submetidos a filtragem sonora, eliminando-se o máximo possível de ruídos e chiados. E como se trata, basicamente de um documento sonoro, feito há quase 50 anos, entende-se perfeitamente as falhas existentes. O importantíssimo é que, um registro integrado tão de perto a nossa MPB - e para isto basta ver a relação dos que participaram da gravação - estará chegando agora, com 47 anos de atraso aos ouvidos de todos que sabem amar e entender a música brasileira. LEGENDA FOTO 1 - Lobos: apresentando Pixinguinha a Le. LEGENDA FOTO 2 - Leopoldo Stokowsky: as gravações com sambistas cariocas há 47 anos. LEGENDA FOTO 3 - Pixinguinha: o som na América.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
2
19/07/1987

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