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Aramis

uma cinematografia em alta conquistando novos mercados

Mesmo sem ter ainda sido negociado para distribuição comercial no Brasil - mas o que certamente acontecerá "Ay, Carmela", selecionado pela Espanha para disputar o Oscar como melhor filme estrangeiro-1991, e com indicações ao "Felix" - um novo troféu do cinema europeu, que terá agora sua terceira edição -, se constitui em nova demonstração do talento de Saura, 59 anos (a serem completados no próximo dia 4 de janeiro), 32 de cinema, e apontado como o novo Buñuel a partir das premiações que começou a acumular nos anos 60. Sem chegar à mesma dimensão do maior nome do cinema espanhol, a obra de Saura foi marcada por contestações políticas ainda no regime franquista e, numa segunda etapa, voltando-se à música e à dança, "Carmem", "Bodas de Sangue", "El Amor Brujo". Após uma superprodução ("Eldorado", 87, inédita no Brasil) que fracassou, em "Ai, Carmela", mistura o político ao musical através de uma história ficcionada. Inspirada numa peça do dramaturgo José Saches Sinisterra, narra a trajetória de um casal de artistas de variedades - Carmela (Carmem Maura, atriz consagrada nos filmes de Almodóvar) e Paulino (Andres Pajares), que, acompanhados de um garoto mudo (devido aos bombardeios em que morreram seus pais), Gustavette (Gabino Diego - que veio ao RioCine) partem da diversão nas tropas nacionalistas durante a Guerra Civil (1936-39) e, presos por franquistas, são internados num campo correcional. Antes da ameaça de serem fuzilados, o colaboracionismo (inclusive sexual da bela Carmela, aos oficiais franquistas) é colocado normalmente como opção, mas há um final redentor. Mesmo sem chegar à profundidade psicológica de "Cria Cuervos" e, especialmente, "Ana e os Lobos" - é também musicalmente inferior à trilogia de Ballet -, "Ai, Carmela" tem bons momentos de cinema e, lançado comercialmente poderá fazer carreira junto ao público cativo de Saura. É só aparecer um distribuidor disposto a adquirir os direitos de exibição do filme no Brasil. xxx "Ai, Carmela" foi o filme mais famoso da mostra internacional que Dejezam Magno Pellegrin, 60anos, assessor da Riotur e ex-funcionário da Embrafilme na área do Exterior, conseguiu para a mostra de pré-estréias paralelas ao RioCine. Dois outros filmes de safras recentes da Espanha também foram exibidos no Festival: "La Legeyenda Del Cura de Borgota", de Pedro Olea, sobre um sacerdote que faz um pacto com o demônio e apesar de cair nas malhas da inquisição é salvo devido a suas ligações com o papa Alexandre VI (o veterano ator Raf Vallone) e "El Lute, Caminha ou Morre", de Vicente Arranda. Primeira parte de uma produção ambiciosa (a segunda acaba de estrear na Espanha), este filme sobre um jovem cigano, que de ladrão de galinhas é transformado pela imprensa em inimigo público número um, foi baseado na vida de Eleutério Sanchez, que de fora-da-lei, condenado a 50 anos de prisão, analfabeto e violento, tornou-se um escritor famoso, vivendo hoje, ao 60 anos, em Madrid. Embora com boa narração, "El Lute" é prejudicado pela falta de informações finais sobre o personagem - só na segunda parte (que narra sua vida após deixar a prisão) são expostas. Na Espanha, o filme teve ótima bilheteria conforme repetiu diversas vezes o diretor da divisão de cinema do Ministério da Cultura, Manuel Llamas Anton, 45 anos, que vindo ao RioCine aproveitou a ocasião para anunciar generosos planos do governo para promover mais o cinema daquele país no Exterior. Assim, estão sendo instalados escritórios em Los Angeles, Paris e Buenos Aires, este destinado a dar "especial atenção ao Brasil". A produção cinematográfica da Espanha é invejável. Mostrando um catálogo bem ilustrado, Llamas Anton exibe números impressionantes: entre 1988/90 foram produzidos 168 longas e 170 curtas para um mercado que está ampliando. "Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos" bateu todos os recordes de público, faturando um milhão e quatrocentas mil pesetas. O otimismo é tamanho que um empresário madrilenho, Henrique Gonzalez Macchio, adquiriu um dos maiores cinemas da Praça Vermelha, em Moscou, exclusivamente para exibir filmes espanhóis, que também serão distribuídos nas milhares de salas nas várias repúblicas soviéticas socialistas. Os planos para co-produção com o Brasil, através da TV-Espanhola, anunciados há mais de um ano e que beneficiaram, entre outros, "Vlado", de João Batista de Andrade, foram congelados, "devido a mudanças ocorridas no Brasil", explica Anton. A política da Espanha é estar presente nos principais festivais de cinema do mundo. Foram nas duas primeiras edições do FestRio (84/85), que Pedro Almodóvar passou a ser observado com atenção ("El Matador" e "La Ley del Desejo") e os festivais naquele país estão ganhando prestígio cada vez maior. O mais famoso é o de San Sebastian, dirigido pelo cinéfilo e quadinhólogo Luis Gasca (que se tornou amigo do arquiteto Jaime Lerner, quando este ali esteve, em missão profissional, há 17 anos) e em Sitges acontece um festival do cinema fantástico, que disputa o gênero com o de Avoriaz, na França. Em Huelva, em dezembro, há um festival latino-americano, que reúne as cinematografias do continente - uma mostra que aconteceu em Curitiba, há três anos, e poderia ter algum reflexo, se a mesma não tivesse sofrido o mal crônico de todos os eventos culturais de nosso Estado: a falta de continuidade.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
24
27/11/1990

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