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Aramis

Vivaldi & Pixinga

Há dois meses, quando da inauguração da Praça Jacob do Bandolim, no Jardim Shaffer, Hermínio Bello de Carvalho gostou muito da apresentação do grupo Choro & Sereta, que ali esteve executando algumas músicas do patrono do logradouro - tocando inclusive com Joel Nascimento (bandolim) e Maurício Carrilho (violão, da Camerata Carioca, também presentes. Agora, quando a Camerata volta a Curitiba, para uma nova estréia nacional - o concerto << Vivaldi & Pixinguinha >> (Guairão, terça-feira, 21h30min, ingressos a partir de Cr$ 70,00), Hermínio deseja integrar os músicos paranaenses àquele espetáculo: assim, após o concerto, haverá um número extra, << Vou Vivendo >>, de Pixinguinha, no qual a Camerata e o grupo Sambas & Seresta, estarão juntos no palco - dentro do espírito de Hermínio e seus companheiros, que é o de promover animação cultural junto às comunidades onde a Camerata se apresenta. xxx A estréia mundial de << Vivaldi & Pixinguinha >> - o grande evento musical deste final de semestre, coincide com a edição pela WEA do lp com << Tributo a Jacob do bandolim >>, justamente o espetáculo que, a 11 de agosto de 1979, no Guairinha, não só homenageava o grande compositor, instrumentista e compositor Jacob Pick Bittencourt (1918-1969), no 10.º aniversário de sua morte, como marcava o encontro de jovens músicos identificados por um grande amor à nossa melhor MPB, com o lendário Radamés Gnatalli, 74 anos, presença maior na vida artística nacional. Na ocasião o grupo não se chamava ainda Camerata Carioca, e a razão do nome é Hermínio quem revela. xxx << Existem conjuntos e conjuntos de choro e a Camerata não quer ser um conjunto de choros apenas. Aliás já não é desde que foi formulada e a cognominei de Camerata. Isso o Radamés compreendeu logo quando me telefonou e disse: << Olhaí, se é Camerata então vamos logo tocar um Vivaldi >> e aí pegou o << L`estro harmônico >> e o Concerto Grosso, opus 3, n.º 11, e tascou na grade uma transposição respeitosíssima para o conjunto >>. E justamente esta peça de Vivaldi é que abre o recital de terça-feira, mas que tem também músicas de outros compositores admiráveis, mas alguns poucos conhecidos. A este respeito, o diretor do recital << Vivaldi & Pixinguinha >>, comenta destacando inclusão do << Jubileu >>, de Anacleto de Medeiros >> (1886-1907), como terceiro número do programa: << A colocação desta música poderia parecer uma atitude saudosista, não fosse o Brasil tão desmemoriado. Acontece que Anacleto foi um músico que viveu apenas 41 anos (Antônio Callado, autor de << Flor Amorosa >>, viveu apenas 32 e Patápio Silva, autor de << Primeiro Amor >>, morreu com 26 - que loucura!) e finalmente, o que se conhece da vida desses percursores? O << Jubileu >> é um dobrado riquíssimo, original, é justamente dessas obras sempre eternas, jovialidades essa que o Radamés fez pontuar em seu arranjo. Meu Deus, o Anacleto foi o primeiro mestre da Banda do Corpo de Bombeiro do Rio de Janeiro, foi organizador daquela gloriosa banda! Inclusive admiradíssimo pelo Carlos Gomes, pelo Villa-Lobos (que inclusive pegou o << Rasga o coração >> e o colocou como tema da Bachianas n.º 10, que homenagem mais bonita poderia prestar ao gênio de Anacleto?) Não é uma atitude saudosista, mas reveladora de que esse baú precisa ser remexido com mais curiosidade e ousadia. O que estimula o aparecimento de tanta mediocridade é justamente essa inércia, essa falta de coragem de sacudir a poeira. É preciso não ter medo de desafiar o passado como forma e fórmula de enfrentar o futuro >>. xxx A partir de 1977 ocorreu um << Boom >> do choro, o que provocou o aparecimento de muitos conjuntos, alguns de discutíveis méritos. A este respeito, Hermínio, como grande estimulador do gênero e da música brasileira, faz uma colocação precisa: << Acho tão importante << Época de Ouro >> que não posso, nem devo, confundi-lo com as dezenas ou, centenas de conjuntos que apressadamente se constituíram para aproveitar a << onda >>, o modismo do choro. Mas existem ótimas propostas novas, como o da << Cor do Som >>. Acho o Armarinho fantástico, como também o Um e o Dadi. Os Novos Baianos sacudiram também muita poeira. Não poderia falar de conjunto fantástics que municiaram, afinal, toda essa geração que aí está >>. xxx As idéias de Hermínio, que reafirma sempre que a música não se discute, se toca (<< Eu odeio tudo que fica no plano teórico, odeio teóricos: música e sexo são coisas que não se teorizam >>), vai mais além: << Houve em São Paulo o Festival de Jazz. Por que não programaram também a Camerata? Essa é uma experiência que eu gostaria de fazer. Porque existe um servilismo cultural que afasta determinados músicos representativos de nossa músicas em eventos daquela espécie. Um forró com o Sivuca, a Nana, o Baden, o Radamés - a lista seria imensa! Dá vontade de entrar por uma discussão sobre o chamado << som universal >>, que é uma desculpa para determinados músicos colocarem para fora sua verdadeira identidade musical. Isso me faz lembrar de um grande músico americano que, perguntado o que achou da música << brasileira >> que havia escutado no I Festival Internacional de Jazz. (Anhembi, setembro/78), respondeu: << Brasileira? Não ouvi. Ouvi uma imitação de jazz muito mal feita >>. xxx Hermínio já está em Curitiba, preparando os ensaios da Camerata Carioca, cujos integrantes chegam entre hoje e amanhã: Joel Nascimento (bandolim), os violonistas João Pedro Borges, Maurício Lana Carrilho, Luiz Otávio Braga, mais Henrique Leal Cazes (cavaquinho) e Humberto Leal (percussão). O maestro e pianista Radamés Gnatalli também está chegando. Muitas horas de ensaio, antes do concerto de terça-feira, em seguida, entram no Sir-Laboratório de Som & Imagem, para a gravação do lp, com o mesmo repertório do concerto. Um disco que será feito com o capricho e amor que caracteriza as produções de Hermínio, numa produção que inaugura um novo selo, a soma dos esforços do Museu da Imagem e do Som/Rádio Estadual do Paraná, com capa e programação gráfica de Cleto de Assis. O disco será lançado no final do ano - com uma tiragem distribuída pelo governo do Paraná e o restante comercializado pelos integrantes da Camerata, em escala nacional.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
1
08/06/1980

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