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Aramis

Gil, voz e violão, um momento maravilhoso de grande talento

"Se eu lançar um disco sem qualquer música, apenas o acetato, pelo menos 50 mil colecionadores vão comprá-lo, só porque foi produzido por Gil" (Gilberto Gil, em entrevista a Leonor Amarante, de "O Estado de São Paulo", 13/3/87). Pode parecer pretensão mas não é. Formado em Administração de Empresas há mais de 20 anos, Gilberto Passos Gil Moreira (Salvador, 29/6/1942) sempre soube as regras do marketing. Não foi à toa que em janeiro de 1965 já chegava a São Paulo com um alto salário, contratado pela Gessy Lever. E ao lado de uma das mais fortes carreiras da música brasileira, este baiano tem sabido, sempre, acompanhar as flutuações do mercado. Há poucos dias, uma leitora d'"Caderno Dois", do "Estado de São Paulo", reclamou até de tanto espaço dedicado aos baianos, especialmente a Gil. Afinal, nenhum compositor-intérprete tem merecido sempre tamanha cobertura quanto o autor de "Viramundo". Este ano, então, com sua decisão de assumir a presidência da Fundação Gregório de Mattos, que corresponde à Secretaria Municipal de Cultura de Salvador, multiplicaram-se as notícias sobre Gil. E, apesar dos compromissos oficiais - mas que jamais podem ser chamados de burocráticos -, ele está fazendo uma turnê nacional (auditório Bento Munhoz da Rocha Neto, dias 27 e 28), aproveitando para catituar seu novo disco, gravado ao vivo, dentro do projeto Luz do Sol (WEA, março/87). Dia 22 de abril Gil viaja para Cuba para, pela primeira vez, participar do Festival de Varadero. Antes, traz ao Brasil o Casiopea, um dos melhores grupos instrumentais de rock do Japão - que terá um disco lançado pela WEA, através de sua etiqueta -, apropriadamente chamada de Geléia Geral. Em entrevista a Leonor Amarante, explicou porque topou apadrinhar o Casiopea; que há dez anos é famoso na Europa e nos EUA, mas desconhecido no Brasil: - Decidi trazê-los e lançar seu disco, porque eles têm uma competência incrível. Fizemos shows juntos no Japão e em Baden Baden, na Alemanha. Gil está a toda! Aproveita sua temporada para fazer contatos com secretários de Cultura e, naturalmente, quando passar por Curitiba estará reunido tanto com Carlos Marés de Souza, da Fundação Cultural e como com René Dotti, o recém-empossado secretário da Cultura. Gil é inteligente, enxerga longe e, apesar do tom de brincadeira, Maria Bethânia nos dizia dia 19 de janeiro, em Porto Alegre, quando ela ali lançava seu LP "Dezembros" (RCA, 1986). - "O Gil ainda acaba governador da Bahia!" GIL GUERREIRO Como Caetano, Bethânia e Gal Costa (temporada no auditório Bento Munhoz da Rocha Neto, dias 24 e 25 de março), Gilberto Gil tem uma voz bonita. Como compositor, nem é preciso falar. Infelizmente para o nosso gosto, muitas vezes insiste em esconder (ou reduzir) estes méritos, com bandas estridentes, parafernálias eletrônicas em canoas alienígenas - sempre dentro daquela visão de marketing para perseguir a síndrome de Peter Pan, ou seja manter-se eternamente jovem. Entretanto Gil não precisa de nada disto. E tal como fez seu amigo Caetano, prova isto gravando um belíssimo disco simples, informal, com a simplicidade dos grandes momentos. Registrado ao vivo, durante sua temporada no Copacabana Palace, dentro do projeto "Luz do Sol", este "Gilberto Gil em Concerto" é, curiosamente, o melhor de seus discos nestes últimos anos. Por quê? Pela simples razão de que temos Gil, sua voz e, no máximo, a percussão de Repolho e, em alguns momentos, os teclados de Ricardo Cristaldi. Gil fala com o público, conta estórias, usa o humor e produz um espetáculo memorável, trilha sonora de seu espetáculo que, agora está mostrando em várias capitais (mas no qual, ao vivo, inclui outras músicas, inclusive a "Figa Brasil", que não está no disco). Este "Gil em Concerto" vale como uma antologia, pois iniciando com "Eu Vim da Bahia" (antecedido do refrão de "Aquele Abraço"), Gilberto "Domingo no Parque" e desemboca no Tropicalismo com sua clássica parceria com Capinam em "Soy Loco Por Ti América". Depois temos o Gil mais contemporâneo, cantando em inglês "Mamma", fazendo a versão de "I Just Called To Say I Love You" (Stevie Wonder), que valeu, há 4 anos, o Oscar de melhor canção (filme "A Dama de Vermelho", de Gene Wilder). Claro que não poderia faltar "Filhos de Gandhi", ao lado de "Palco" e "Cores Vivas". Um repertório perfeito. Gil, voz e violão, magnífico, suave, com toda sua competência (só em "Soy Loco Por Ti América" e "Domingo no Parque" recorreu a Repolho e Cristaldi). Um disco que prova que a música se faz com simplicidade, talento e tranquilidade. Liberto da parafernália eletrônica, aquele barulho que mais prejudica do que ajuda, "Gilberto Gil em Concerto", o disco, vale como a melhor propaganda de seu show: afinal, este é o Gil que admiro e gosto.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Nenhum
15
18/03/1987

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