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Aramis

Uma semana com muitas (e belas) formas/cores

Uma semana de eventos importantes na área das artes plásticas: abertura do 37o Salão Paranaense, do Salão Passarela e da retrospectiva de Elifas Andreato. Sem contar a coletiva de Wilson Andrade e Silva, Jefferson César e Domicio Pedroso hoje à noite na Acaiaca, ainda a mais profissional das galerias da cidade. E o ramo parece tão lucrativo que mais um curitibano decide faturar na área: Ruy Barroso convidando para a abertura de sua "Fase Nova" (Rua Buenos Ayres, 178), com uma coletiva onde entram artistas de todas as tendências e tendo o destaque da "participação especial" de Juarez Machado. Xxx Hoje chegam a Curitiba Elifas Andreato e Herminio Bello de Carvalho, para montar a mostra "Impressões", considerada uma das mais importantes exposições de 1980. Organizada por Herminio e Juilia O'Neill Peterson Peregrino, da Consultoria de Projetos Especiais da Funarte, a retrospectiva de Elifas, paranaense de Caviúna (Rolandia), 34 anos, é a oportunidade de se conhecer melhor o muito que este extraordinário artista plástico fez em uma década: autor de capas de discos como a de Clementina de Jesus, Paulinho da Viola, Martinho da Vila, Chico Buarque, Fátima Guedes (o mais belo trabalho de 1980, sem sombra de dúvida), entre outras: cenários de teatro como os de "Murro em Ponta de Faca", "Muro de Arrimo", "Navalha na Carne", cartazes, ilustrações capas de livros (especialmente para a editora Ática), cartões de Natal, e muitos outros trabalhos dentro desse imenso mundo chamado artes gráficas. Elifas é hoje, um nome nacional e essa exposição (Museu Guido Viaro, a partir de quinta-feira, dia 20) servirá para por sua arte ao alcance do grande público. Hermínio Belo de Carvalho, idealizador da retrospectiva salienta que "quando o Elifas compareceu ao encontro que marcamos com um grupo interessado em discutir com ele as técnicas empregadas em seu trabalho, eu me lembrei muito de dois polêmicos encontros no Museu de Arte Moderna, um com Mathieu fazendo um quadro gigantesco em uma hora, e outro com Cesar, ocupando com poliuretano as suas célebres "Expansions". Naquela época era o máximo de vanguardismo porque, como todos sabem, a nossa vanguarda é um mata-borrão das já exauridades vanguardas dos Estádios Unidos e da Europa, como os padrões de nossos cartazes foram até há pouco editados como a "última palavra do que se faz na Polônia". É o velho colonialismo, o servilismo total que encontra em Elifas, um dos mais combativos opositores. Porque ele pratica aquela vanguarda mulata que desprendeu da leitura dos quadros de Heitor dos Prazeres, que percebeu na arte de um Paulinho da Viola, de uma Clementina é uma coisa que transpira o próprio Brasil. Porque a gente tem que reconhecer que, num país onde o salário mínimo não alcançou cinco mil cruzeiros, vanguarda cheira a palavrão. A gente vê o porque do não servilismo de Portinari e Di Cavalcanti: eles respiraram a pobreza do Pais, a nossa problemática, a nossa ignorância. Isso provoca que os chamados "críticos de arte" esnobem o artista gráfico, porque vêem nessa arte, uma arte menor, atrelada ao anúncio, ao interesse momentâneo de vender o produto que embala. E Elifas, justamente contrariou todos esses conceitos estabelecidos por essa crítica que faz a copidescagem do que se escreve lá fora, sem querer se preocupar em criar uma linguagem própria. E criar uma linguagem própria foi o que fez Elifas, construindo toda uma gramática artesanal que o habilita a ocupar posição de destaque especial entre nossos artistas contemporâneos mais importantes. Isso eu dizia a ele e a sua mulher, Yolanda, quando com Júlia Peregrino, a arquiduquesa do Crato, montavam a exposição na galeria Sérgio Milliet da Funarte. Aquele retrato de Clementina era a Gioconda de Elifas, tinha que ser entronizado na exposição como especial relevo. Como tenho a certeza de que muitos iriam à exposição para ver o original da capa polemica daquele lp de Paulinho da Viola, onde lágrimas rolavam de olhos profundamente avermelhados uma coisa patética, que muitos ofendeu como algo agressivo até de mau gosto. Assim, polemicamente (e sem o querer ser), Elifas foi construindo outras capas, ilustrações e cenografias. E buscando novos materiais, pesquisando novas formulas (a capa do lp "Tributo a Jacob do Bandolim" ele a imprimiu no verso do papel, obtendo com aquela textura, um resultado novo, só perceptível aos iniciados). Um inventor. E no Rio de janeiro a critica mais uma vez, se mostrou ortodoxa, fechada, impermeável a tudo que não venha claramente codificado como "artes plásticas", não tomando conhecimento da exposição de Elifas. E o público? Esse compareceu maciçamente. Era emocionante ver turmas de estudantes de pintura acamparem (literalmente acamparem) na exposição. Elifas é um artista brasileiro que bebeu em Heitor dos Prazeres do Estádio e não segue a última moda (já decadente), ditada por Nova Iorque". Xxx Apesar de paranaense, Elifas não conhece Curitiba. Hoje, quando desembarcar no aeroporto Afonso Pena, estará vendo pela primeira vez, a capital de seu estado. Desde 1959 que reside em São Paulo, onde exerceu funções humildes, só profissionalizando-se como artista gráfico há 10 anos. Mas neste período, poucos artistas produziram tanto e de tão boa qualidade. O catalogo da exposição é um mini livro de arte, que o fará disputado, assim como reproduções de um dos mais belos desenhos de Andreato que, na quinta-feira, os estará assinado numa quantidade limitada. Xxx Desde que foi inaugurada, há 4 anos, a Acaiaca, do Polêmico, corajoso e incansável Jorge Carlos Sade, tem promovido muitas exposições de artistas das mais diversas tendências. Mas a de hoje à noite, tem um especial significado: reúne trabalhos de três dos mais estimados artistas paranaenses, identificados por uma mesma geração a chamada "Cocaco", já que faziam parte do grupo que, nos anos 50, praticamente teve uma formação não acadêmica na convivência da histórica galeria que Ennio Marques Ferreira, Loio Pérsio e Manoel Furtado fundaram na Rua Ebano Pereira. As esculturas de Jefferson Cesar e os quadros de Domicio Pedroso e Wilson Andrade e Silva, na Acaiaca, mostram o trabalho de artistas quarentões, com mais de 20 anos cada um de carreira e que atingem hoje pontos importantes em sua evolução. Domicio, absorvido nos últimos anos com atividades de organizador das (excelentes) mostras didáticas no Badep, tem feito poucas exposições. Jefferson César, escultor de grande criatividade, quase não circula nos meios artísticos e Wilson o querido "Espigão", a exemplo de Érico da Silva, é hoje um dos mais bem sucedidos profissionais das artes plásticas no Paraná. Tanto é que ficou com a sala menor da Acaiaca, já que não dispunha de trabalhos suficientes para um espaço mais amplo. Afinal, seus quadros vem tendo uma impressionante acolhida, com filas de colecionadores a espera de novos trabalhos. Xxx Quando o editor Faruk El Khatib idealizou "Passarela", uma revista de passatempos que a VARIG distribui a bordo de seus vôos internacionais, não imaginaria que estava criando um importante veículo para divulgação das artes plásticas. Hoje, seis anos depois, a revista pode se orgulhar de já ter utilizado em suas capas de trabalhos de alguns dos mais representativos artistas brasileiros. E a boa idéia editorial de Faruk, foi completada com uma mostra anual dos originais adquiridos, juntamente com a impressão de 100 cópias (em excelente tratamento gráfico), de cada um dos desenhos ou óleos, que são vendidos com renda em favor de obras sociais. O Salão Passarela, que em sua quinta edição será inaugurada amanhã à noite, no Solar da Torre, já está entre os eventos mais significativos nos campos das artes plásticas do Paraná. Este ano, por uma coincidência, ocorre na mesma noite em que, no hall do Teatro Guaíra, é aberto o 37o Salão Paranaense, com 375 trabalhos. Organizado pela Secretaria da Culturra e do Esporte, o salão distribuiu este ano Cr$ 740 mil em prêmios a artistas do Paraná (6), São Paulo (3), Minas Gerais (6), Rio de Janeiro (6), Rio Grande do Sul (1) e Bahia (1). Houve 1038 trabalhos inscritos, sendo 421 do Paraná, dos quais a comissão julgadora (Adalice Araújo, Fábio Magalhães, Geraldo Edson de Andrade, Ivo Vellame e Márcio Sampaio), selecionou 375, 116 dos quais do Paraná. O prêmio de melhor artista do salão, foi dividido entre Carlos Eduardo Zimmerman (pintura) e Arlindo Daibert (desenho), enquanto Rones Dunke, com seus desenhos, foi escolhido melhor artista paranaense. Zimmermann, um dos destaques Hilton de pintura, e que inaugurou uma individual em Brasília, na semana passada, atravessa uma de suas melhores fases. Já Dunke, seu colega de geração, continua a ser um dos mais esmerados desenhistas do Brasil, com uma produção lenta e que faz aumentar a fila de colecionadores a espera de seus trabalhos. Cada vez mais valorizados. LEGENDA FOTO 1 - Cartões de Natal de Elifas.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Tablóide
10
18/11/1980

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