Cada vez mais brasileiro, João faz a melhor música
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 23 de outubro de 1991
A leitura de um poema de Antônio Cícero ("Guardar"), no qual dizia que "guardar alguma coisa no cofre/perde-se de vista/guardar um pássaro é aprisionar o seu vôo", fez com que nascesse a atual parceria que desaguou nas canções deste novo lp ("Zona de Fronteira"). Wally Salomão, poeta baiano, diretor de shows da Gal Costa, seu outro parceiro, lhe propôs uma parceria para uma música destinada a Maria Bethânia, que acabou virando título de seu último elepê: "Memória da Pele".
O sucesso desta parceria, levaria a uma nova proposta e nasceria "Holofotes", ao qual se acrescentaria a presença de Cícero - e que Gal Costa gravaria. Formava-se um novo triunvirato criativo, que resultou num dos melhores pacotes sonoros deste ano: as 12 faixas deste "Zona de Fronteira" trazem João absolutamente acústico numa nova dimensão de um talento jamais negado: da abertura com "Trem Bala", uma visão contemporânea de como tocar choro (mas com direção de "Rapsody in Blue", de Gerswin), a "Paranóia" - fazendo improvisos com a voz, sons percussivos, continuando um pouco aquela coisa do disco "Cabeça de Negro" - este álbum de Bosco é um salutar revigoramento num ano tão pobre para a nossa MPB. Artista que soube absorver todas as influências sem perder a brasilidade, Bosco faz em "Ladrão de Fogo" - com a afetuosa participação de Rafael Rabello - uma homenagem ao mestre Dilermando Reis em "Xodó da Baiana" (João Pernambuco) mas também citando um improviso que nasceu em sua cabeça no último festival de guitarras de Córdoba.
Brilhante, sonoramente criativo, Bosco - neste encontro com uma nova dupla de parceiros - mostra que é um dos cinco grandes de nossa MPB - o que faz com que se aguarde, com expectativa, sua próxima vinda a Curitiba.
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