"Cine Haikai", com Leminski-ator, concorre em Brasília
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 21 de setembro de 1990
Dentro de três semanas, no 23º Festival do Cinema Brasileiro de Brasília (10 a 16 de outubro) mais uma vez o Paraná estará ausente. Nenhum dos 12 curtas-metragens, categoria 35mm, saiu de nosso Estado, confirmando a nossa pobreza cinematográfica (em Gramado, julho último, só "Vamos Juntos Comer Defunto", de Eloy Pereira, foi aceito (mas recebido friamente).
Em compensação, o mais original dos curtas competitivos é um filme rodado em Curitiba e que se constitui numa homenagem póstuma ao poeta Paulo Leminski (1946-1989): "Cine Hakai". Com fotografia de Jaime Brustolim, direção e edição de Pedro Anisio, é, em si, um próprio hakai-visual: apenas cinco minutos de projeção, "um filme que dá para assistir em pé", como diz o seu realizador.
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Há seis anos, Pedro Anisio, 34 anos, veio residir em Curitiba, com sua esposa Denise Brandt. Na época chegou a fazer alguns trabalhos de documentação oficial junto a Secretaria de Comunicação Social do Governo do Estado e começou a freqüentar os nossos meios intelectuais-cinematográficos. Teve a idéia de fazer um curta-metragem em torno de Paulo Leminski interpretando poemas de Oswald de Andrade (1890-1954), com seqüências surrealistas de um sonho em que Leminski, nas ruínas do Alto do São Francisco era perseguido por mendigos. Apaixonado por cinema e sempre aberto a novas propostas, Paulo gostou da idéia e num domingo de sol, pela manhã, foram feitas as primeiras tomadas - que, ironicamente foram as únicas pois dificuldades diversas impediram a rodagem de novas seqüências. Logo depois, Pedro Anisio voltava a Brasília levando os negativos e não teve mais condições de retornar a Curitiba. Paulo Leminski se transferiu por algum tempo para São Paulo, depois começou a sofrer problemas de saúde e o projeto acabou suspenso.
Pedro Anisio, queria, entretanto, retomá-lo, mas a morte de Paulo, no ano passado, fez com que a idéia original tivesse que ser modificada. Concentrou-se entretanto em outros projetos, inclusive no episódio "Além do Cinema do Além", no qual aborda o lado místico do Distrito Federal em "Brasília - a última utopia", longa-metragem em cinco episódios de cineastas radicados naquela cidade e que teve sua primeira apresentação mundial, hors concours, na noite de encerramento do 22º Festival do Cinema de Brasília. Posteriormente foi levado ao V FestRio, em Fortaleza e, até agora, só teve lançamento regular, por duas semanas, no Cine Brasília, pertencente a Fundação Cultural do Distrito Federal.
Por ocasião do Festival, Pedro Anisio nos falou sobre o material inédito que dispunha sobre Leminski e de seu interesse em conseguir ajuda para concluir um curta de 10 a 12 minutos. Aqui publicamos ampla reportagem a respeito e chegamos a fazer sugestões para que o governo do Paraná ou a Prefeitura estudassem a possibilidade de viabilizar o projeto.
Pedro Anisio foi procurado pela assistente social Celise Niero, diretora de ação cultural da Fucucu, que solicitou um projeto detalhado. Apesar de o mesmo ter sido encaminhado e de sucessivos contatos posteriores pessoais de Pedro e do também paranaense Carlos Romero Camargo Lima, residente em Brasília - que chegou a trazer o copião para uma exibição na Cinemateca - o projeto empacou. Nem sequer a educação de um telefonema ou uma correspondência foi dada a Anisio que gastou mais de Cr$ 15 mil em telefonemas interurbanos.
Apesar da total falta de apoio da Fucucu - e sequer a oficialização de uma negativa - Pedro Anisio decidiu aproveitar o precioso material que dispunha. Assim, exclusivamente com recursos próprios, finalizou-o usando apenas o material que dispunha.
- "Se tivesse encontrado qualquer apoio da Fundação Cultural de Curitiba teria incluído entrevistas com nomes nacionais ligados a Leminski - os irmãos Campos, Decio Pignatari, Caetano Veloso, Moraes Moreira etc - e também feito seqüências externas em Curitiba. Infelizmente não pude fazer nada disto".
Faltando recursos - as despesas do laboratório Líder e de suas viagens a São Paulo foram cobertas com seus recursos - Pedro Anísio usou a criatividade.
"Utilizei trechos de poemas de Leminski, bem como de autores sobre quem escreveu livros - de Jesus ao catarinense Cruz e Souza - que passam a sua imagem de elétrica energia e criatividade. Evidentemente, se tivesse filmado nas ruas de Curitiba, focando seus amigos, o filme teria outra dimensão. Ficou, afinal, como um hakai visual, um trailler de um longa que não existe".
Amigos de Brasília se interessaram generosamente no projeto. O ator e radialista J. Pingo (irmão de Paulo Cesar Pereira) e Mercedes Alvim fazem a narrativa. A música foi criada por um jovem nascido naquela cidade, Tom Capone; os letreiros com os créditos são de André Benignone Denise Brandt. O texto é do jornalista Antonio Roberto Prates, "um leminskólogo, apaixonado por sua obra", diz Pedro Anisio, que já realizou uma dezena de filmes - entre curtas institucionais, documentários e atualmente, através de sua Pedra Produções, tenta finalizar outro projeto antigo: "Explosão Aborígene", misto de ficção-documentário, com participação de nomes como Antonio Carlos Jobim, Arthur Moreira Lima e Gilberto Gil.
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