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Aramis

Cinema, eis um tema dos homens que fazem cinema

Na mostra competitiva do VI FestRio, pelo menos quatro dos 19 longas participantes se voltaram ao cinema: "Minas-Texas", do brasileiro Carlos Alberto Prares (ou Charles Stone, como prefere assinar este filme) - que já registramos em colunas anteriores - "Na Lista Negra" (Fellow Traveller), do inglês Philip Saville; "Jogo do Massacre", do italiano Damiano Danin e "Mr. Universo", do húngaro Gyorgy Szombja. Indiretamente, citações,homenagens e reverências em vários outros filmes (e vídeos), como o que Alexandre Rockwell fez ao dedicar o seu belo "Sons - em buscado amor perdido" (concorrente dos EUA) a John Cassevetes, falecido em 3 de fevereiro deste ano, aos 60 anos, quando ele se preparava para rodar este filme - em cujo papel principal há outra homenagem explícita: Samuel Fullerm 77 anos, diretor cultuado pela crítica européia pelos seus filmes classe "B" mas de intensa vitalidade, e que, em atuações especiais, já havia aparecido em fitas de Godard ("Pierot le fou/ O Demônio das 11 horas") e Win Wenders ("O Amigo Americano"). A premiação de Fuller como o prêmio ator do FestRio foi a grande homenagem a este diretor de uma obra tão marcante e cujo penúltimo filme "Ladrões do Amanhecer" (Les Voleurs de la Nuit), mesmo dispondo de cópia no Brasil permanece inédito em Curitiba (atenção adormecida Fucucu!, que tal aproveitar para exibi-lo no Groff? ). xxx Prejudicado pelo fato da cópia enviada não ter legendas em português (e somente em alguns momentos em inglês), "Mr. Universo", do húngaro Gyorgy Szonjas, também volta-se ao mundo do cinema: três húngaros chegam na América sonhando com a glória e a fama conquistada por um compatriota, Mike Hargitay que, em sua juventude foi Mr. Universo e casou em 1958 com um dos sex-appel de Hollywood dos anos 50 - Jayne Mansfield (1932-1967), ao lado de quem fez alguns filmes (depois passando para medíocres pseudo-históricos e bang-bang spaghetti). Mas os húngaros se dão mal: caem na estrada, têm problemas e quando encontram o envelhecido Mr. Hargitay, ao lado de seus filhos, ouvem seu pessimismo sobre a usina dos sonhos. Apesar da experiência adquirida ao longo de quatro décadas de cinema - desde que começou como roteirista de Zavattini e fazendo mais de 30 curtas-metragens, só em 1960, com "O Baton/Il Rosetto", estrearia no longa-metragem, o italiano Damiano Damiani, 67 anos, foi uma decepção com uma espécie de versão Kitsch do clássico "Assim Estava Escrito" (um dos grandes momentos do cinema fazendo sua autocrítica): "Giocco al Massacre", o título ("Jogo do Massacre") parecia até um filme sobre a Máfia, como nos dizia o jornalista Pepe Escobar (afinal, alguns dos melhores momentos de Domiani foram sobre esta temática - "O Dia da Coruja", "Confissões de um Comissário de Polícia e um Procurador da República". O reencontro na iluminação Capri, de dois cineastas que começaram suas carreiras juntos - um de sucesso (interpretado por Elliot Gould), outro fracassado (o ator cubano Thomas Millian, careca e envelhecido) deságua num teatro de cobranças, reclamações, chantagens sentimentais, mas não consegue passar a mínima emoção ao público. O mundo (falso?) do cinema, as premiações, o equilíbrio com os produtores, as concessões para se obter êxito poderiam ensejar um belo trabalho que, infelizmente, não é alcançado. Ao contrário, o concorrente inglês "Na Lista negra" (Fellow Travelller), toca num assunto que tem permanecido tabu para o cinema: o maccarthismo em Hollywood. Ambientado em Londres, 1954, onde um roteirista comunista se exilou, para fugir das perseguições do Comitê das atividades anti-comunistas, criado pelo senador Joe MacCarthney (e que tinha Richard Nixon como secretário), "Fellow Traveller" discute o posicionamento dos membros da comunidade cinematográfica americana em relação ao Partido Comunista, e o colaboracionismo de muitos. Um filme corajoso, sincero (lembrando "Testa de ferro por acaso/The Front", 1976, de Martin Ritt - primeiro a tocar no assunto em termos de cinema) e que, para muitos deveria ter valido a Ron Silver, como roteirista a Asa Kaufaman, o prêmio de melhor ator. "Na Lista Negra", pelos fatos que aborda (e que merecem ser reanalisados) justifica que se volte a comentá-lo e a esperança é que encontre distribuição comercial para que o público conheça um dos melhores momentos levados ao FestRio. LEGENDA FOTO - Ron Silver em "Na Lista Negra": o macchartismo do cinema, revisto num corajoso filme inglês que foi uma das surpresas do FestRio.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
08/12/1989

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