O Musical som dos bichos do Paraná
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 27 de setembro de 1986
Se de um lado existem as duplas que deixaram o Paraná, em suas formações espontâneas e com uma linguagem rurbana em busca de um espaço nacional - das quais, o exemplo mais bem sucedido é Milionário e José Rico, conforme registramos em nossa coluna de ontem, há, em contrapartida, os artistas jovens que, sem negarem influências rurais, aqui permanecem em busca de um espaço difícil. Dois exemplos: João Lopes e Alecir de Antonina.
Paranaense do município de Califórnia, filho de família humilde, João Lopes chegou a gravar um elepê da Continental , com uma faixa que pelo seu apelo regional ("Eu não sou gato de Ipanema/ Sou bicho do Paraná"), virou gancho para uma das mais belas campanhas da Umuarama, a house-agência do grupo Bamerindus, que agora lhe retribui, dando grande força na divulgação do show que apresenta neste fim de semana ( hoje e amanhã, auditório Bento Munhoz da Rocha Neto, 21 horas), dividido com o grupo Blindagem.
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Também de família humilde, Alecir Gomes (Antonina, 19 de maio de 1955), é outro exemplo de bicho do Paraná com talento e vigor. Buscando as raízes folclóricas, mas já com uma (in)formação musical que lhe permite retrabalhar os temas, Alecir acaba de gravar com recursos próprios, um compacto. Com o nome artístico de Alecir de Antonina, num trabalho em que fez os arranjos, produção que pelo seu sentido de documentação supera as limitações técnicas do estúdio (Gravasom) em que foi feito, Alecir merece destaque muito especial.
"Pinheiro, Pinha, Pinhão" e "Louvação a Chimarrita" são duas canções nas quais fala de coisas de sua terra, resgatando, inclusive o Fandango como gênero musical. A exemplo da dupla Zezé & Simões, que fez também um segundo compacto mas que não teve qualquer divulgação devida a grave doença de um dos seus integrantes, Alecir preocupa-se, saudavelmente, em fazer aquilo que de mais legítimo um compacto popular pode realizar: falar de sua aldeia e se tornar universal, como já ensinava Tolstoi há mais de um século. Só que não é fácil, sem um bom esquema promocional, deixar as limitações de um círculo restrito para fazer com que se conheça uma música que não é produzida dentro dos padrões de consumo. Se João Lopes, mesmo com um elepê gravado na Continental - e hoje tendo a simpatia do grupo Bamerindus ainda continua restrito a pequenos círculos (embora tenha feito muitos shows no Interior), o que dizer de Alecir de Antonina que, com seu disquinho independente debaixo do braço, tenta, em vão, conseguir divulgação de nossas emissoras, às quais em sua maioria, preferem colonizadamente em termos culturais, divulgar o mais supérfluo som pop imposto pelos multinacionais do som, do que as criações de nossos autores?
João Lopes, é bem verdade, interrompeu sua carreira há alguns anos, justamente quando seu "Bicho do Paraná" começava a ser ouvido. Voltou às origens e foi plantar feijão em Sengés, só há pouco retornando ao mercado musical.
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Alecir Gomes, com seu disquinho (no qual, teve o acompanhamento de Dirceu Wolff no violino; Tony Nelson Costa na percussão; Hélio Brandão no sax e Celso Pirata, no violão e flauta), está disposto a levar o nosso ritmo fandango a outros Estados. Inscreveu uma composição inédita para a 4ª edição do Musicanto (Santa Rosa, 22 a 26 de outubro, e mesmo que não seja classificado, pretende viajar aquele distante município do Rio Grande do Sul para acompanhamento nacional do Folclore. Garra , idealismo e, sobretudo, disposição de cantar a música da terra faz com que Alecir - assim como João Lopes, José Simões e Zezé, mereçam apoio e estímulo.
LEGENDA FOTO - João Lopes: depois do feijão, o canto do Bicho do Paraná.
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