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Aramis

Terra do Sonho Distante

"A Rua da Esperança" (Cinema 1, hoje último dia em exibição) é um tipo raro de filme em nossos dias: em preto-e-branco, com elenco de nomes desconhecidos, personagens simples, falando entretanto de forma objetiva e direta em torno de temas eternos: o amor, o casamento, e a fidelidade, encontros e desencontros. Produção classe "B", realizada sem grandes recursos, este filme de estréia da Roteirista e cineasta Joan Micklin Silver obteve repercussão no Festival de Cannes, há seis anos passados, mas importado pelo Ouro Filmes, em 1978, levou dois anos para chegar às telas de Curitiba assim mesmo só obteve lançamento domingo, 9, dentro de um festival de filmes de alto nível artístico mas reduzidas possibilidades de bilheteria que, em tão boa hora, João Aracheski programou no Cinema 1. Tradicionalmente a colônia israelita é tida como uma das que mais prestigiam eventos artísticos. O atual presidente do Centro Israelita do Paraná, empresário Jacques Raul Riegler pensa, inclusive, em formar um cineclube dentro do CIP. Estas duas considerações estão a propósito da estréia de "Hester Street": poucos filmes estariam mais apropriados para merecerem atenção especial dos israelitas do que este filme centrado totalmente entre a comunidade judia de Nova Iorque, ou melhor, da Rua Hester e adjacências no Lower East Side, em 1896. As primeiras cenas, quando ainda estão sendo projetados os créditos, são rodadas numa academia de danças - ou melhor, num local onde se dança. A simpatia e empatia dos personagens se define com uma clareza meridiana, numa visão profunda de pessoas que procuram se ajustar no novo mundo. "Hester Street" não pretende ser um filme sobre imigrantes embora a imigração seja o leit motiv de sua construção. Aliás, este tema tem proporcionado verdadeiras obras primas desde o autobiográfico "Terra do Sonho Distante" ( América, América) que Elia Kazan realizou há 17 anos, ou no sensível "Gaijin", 1980, da nissei Tijuka Yamassaki. Evidentemente a saga dos emigrantes, a luta pelo espaço na nova terra, a integração num novo continente é tema que o cinema tem se ocupado em centenas de títulos embora na maioria das vezes sem a profundidade psicológica, substituindo a visão sociológica e comportamental pela saga de aventuras e intrigas. Kazan, que ao rodar seu "América, América" tinha 54 anos ou Tijuka, com pouco mais de 30, deram aos seus filmes esta visão profunda, épica, sem cair na glorificação de lutas ou dificuldades, em seus filmes onde os emigrantes gregos ou japoneses, chegam à terra sonhada em busca de seu espaço. A saga dos judeus, ao longo de milênios de perseguições, lutas e tradições tem sido focada em dezenas de filmes e, em termos de fixação no continente latino-americano, existe uma elogiada superprodução argentina, "Los Gauchios Judios", que Juan José Jusid realizou há 10 anos passados, a partir do romance de Albert Gerchunoff sobre a fixação de imigrantes judeus em Villaguay, Entre Rios, na Argentina, a partir de 1892. Com um grande elenco e uma magnífica trilha sonora onde se destaca a participação especial de Alfredo Zitarrosa e Mercedes Sosa, com músicas de Gustavo Beytelmann (editada em LP pela Microfom, SE-572, 1970), "Los Gauchios Judios" é uma das poucas produções realizadas em nosso continente em torno da fixação da comunidade israelita. Um filme que poderia ter encontrado uma repercussão internacional mas que, ao menos no Brasil, nunca teve uma única projeção. O mesmo destino teria "Hester Street" se não fosse a repercussão que a obra de Joan Micklin Silver, baseado em uma história de Abraham Cahan ("Yeki") encontrou no festival de Cannes, há quatro anos. Apesar de lançada no Rio e São Paulo, "Hester Street" teve poucas críticas, chegando assim quase obscuramente entre nós. Um dos poucos jornalistas a escrever Gitl, durante um lírico piquenique) e de riscos. As diferenças entre a pátria e o novo país podem exigir vidas inteiras de descobertas e adaptação, mas nem tudo é tão diferente. Dois personagens lembram que eles viviam em um gueto na Rússia, mas também só há judeus na Rua Hester e adjacentes. As colocações de Azeredo que transcrevemos são das mais precisas para melhor entendimento (e admiração) do filme de Joan Micklin Silver: "a culpa é de Colombo, segundo o desabafo de Bernstein. De fato, sem os descobridores de novos mundos, jamais os resignados, os humilhados e os ofendidos sofreriam a tentação de sair da casca ancestral, de enfrentar as heresias dos estranhos, fazer face ao desafio com plumas e vestidos ousadamente baloiçantes, os personagens vivem as dores da mudança que posteriormente figurariam sob a denominação de choque cultural . Joan Micklin Silver vê essas dores com delicadeza, ternura e humor".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Tablóide
9
11/11/1980

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