Zimbo, a continuidade harmônica aos 24 anos
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 14 de junho de 1988
Os primeiros raios do sol penetravam pelas amplas janelas da acolhedora residência do professor Brasil Pinheiro Machado, no alto da Rua Carlos de Carvalho e, sentados no chão, em almofadas, um grupo de jovens, em silêncio total, ouviam com respeitosa religiosidade os improvisos de Amilton Godoy nos teclados do Essenfelder, enquanto Luiz Chaves fazia seu baixo acústico ter aquelas notas de equilíbrio e a bateria de Rubinho, com suavidade, dava os toques da Bossa Nova.
Foi na primavera de 1964, poucos meses após o Zimbo Trio ter iniciado sua carreira profissional - o que aconteceu de 17 de março, duas semanas antes do golpe de 1º de abril, acompanhando Norma Benguel em sua tentativa de ser cantora num show da boate Oásis (sim, a hoje briguenta cineasta de "Pagu" fez experiências como cantora e chegou a gravar dois elepês!).
O Zimbo havia vindo a Curitiba para um programa - ao vivo naturalmente, pois o vídeo-tape ainda não havia por aqui chegado - nos antigos estúdios da TV-Paraná, no térreo do edifício Mauá. Não lembro de quem foi a idéia, mas o fato é que os rapazes aceitaram o convite para uma esticada na casa de Maria Célia Pinheiro Machado - hoje doutora em Ciências Sociais, professora da USP (e que acaba de voltar de Londres, onde defendeu tese), uma espécie de musa de um grupo de estudantes que amavam a Bossa Nova e o jazz.
Simpáticos, entusiastas, Amilton, Luiz e Rubinho não se fizeram de rogados. Passaram horas conversando com os jovens e, animados pelo interesse de todos pela música, acabaram fazendo uma jam-session que cruzou madrugada e terminou quando o sol, iluminando a sala, fez com que as lâmpadas fossem apagadas.
Nestes 24 anos, o Zimbo Trio retornou várias vezes a Curitiba. Ainda em 1964, aqui estiveram para receber o Pinheiro de Ouro, uma promoção bolada por Luiz Carlos Sibut, na época assessor de relações públicas da Fundepar e que, como tantas outras iniciativas culturais paranaenses, não passou de uma primeira edição. Em 1972, quando dirigíamos o Departamento de Relações Públicas e Promoções da Prefeitura, em colaboração com a Universidade Federal do Paraná - graças à presença do Alceu Schwab, na época diretor de assuntos culturais da então menos esclerosada instituição, o Zimbo aqui fez uma apresentação do "Opus Pop", juntando sua criatividade instrumental à Orquestra Sinfônica da UFP (hoje desaparecida). Como vocalista, uma cantora de voz especialíssima - então começando a carreira, a bela Silvia Maria - que mesmo tendo todas as condições de fazer uma grande carreira, acabou praticamente se afastando da vida musical.
O grupo instrumental com maior longevidade dentro da música brasileira, o Zimbo conserva aquele entusiasmo que o fez ser um grupo de sucesso imediato ao gravar o primeiro lp ("Zimbo - volume I", RGE, 1964) e, superando todas as dificuldades, manter-se coeso e unido - podendo, assim mostrar hoje (21 horas, auditório Bento Munhoz da Rocha Neto) um espetáculo do maior vigor, como o que fará com patrocínio da DHL - Worldwide Express, que o escolheu para comemorar seus 10 anos de atuação no Brasil.
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Quem conhece o profissionalismo, competência e, sobretudo, harmonia de Luiz Chaves (Oliveira da Paz, Belém do Pará, 27/8/1931), Rubens (Alberto) Barsotti (São Paulo, 16/10/1932) e Amilton (Teixeira de) Godoy (Bauru, SP, 2/3/1941) sabe porque o trio consegue aproximar-se das bodas de prata, sem, praticamente, nunca ter interrompido uma carreira da maior dignidade profissional. Com mais de 20 elepês gravados, inúmeras excursões ao Exterior, trabalhos desenvolvidos com os mais importantes nomes da MPB - Elis Regina, Elizeth Cardoso, e Maisa, para citar só três exemplos - o Zimbo nunca se preocupou em modismos, em concessões fáceis, em jogadas comerciais. Estruturando uma das mais respeitadas academias de música do Brasil - a CLAM (Centro Livre de Aprendizagem Musical), criando sua própria etiqueta, desenvolvendo trabalhos com outros músicos (inclusive estrangeiros, como, por exemplo, o falecido Sonny Stitt, que com eles fez um de seus últimos discos), o Zimbo conseguiu um espaço especial dentro da nossa música.
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Uma vez, entre as tantas que aqui estiveram - sempre com sucesso - Rubinho estranhou a pergunta de um repórter, que insistia em saber "o que eles estavam fazendo".
- "Fazemos o que sempre fizemos e o que sempre procuraremos fazer: música da melhor qualidade".
Realmente, ao longo destes 24 anos, o Zimbo tem seu estilo, sua marca. Os eternos consumidores de modismo talvez acusem Chaves, Rubinho e Amilton de conservadores ou mesmo quadrados, se comparados as piruetas consumistas de tantos lançadores de novidades de vida efêmera. Entretanto, a música que fazem tem aquela harmonia e segurança, que desce redonda pelos ouvidos - seja numa gravação como neste novo elepê que acabam de lançar ("Tributo a Tom Jobim - Volume I", Clam, com previsão para sair em CD dentro de algumas semanas) seja ao vivo, como estarão mostrando hoje no Guaíra.
Tão simpático e cordiais quando no início de carreira, aceitaram o convite para antecipando sua vinda a Curitiba, desenvolver uma espécie de workshop com instrumentistas locais, na tarde de ontem, mostrando aquele "Zimbo touch", que dá a temas de Jobim - como os oito reunidos no primeiro volume deste novo lp "Felicidade", "Chega de Saudade", "Wave", "Só Danço Samba", "Desafinado", "Trieste" e "Samba de Uma Nota Só") - um toque suave e agradável.
A música do Zimbo Trio faz bem, desce suave, como um vinho branco do Reno ou mais caro dos conhaques franceses. Com uma vantagem de que com toda a influência do jazz, conservam-se brasileiríssimos há 24 anos.
LEGENDA FOTO 1 - Amilton: homenagem a Tom
LEGENDA FOTO 2 - Luiz: o bom baixo acústico
LEGENDA FOTO 3 - Rubinho, do Zimbo: "Fazemos música".
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