Aqui, como em toda parte, os nominados para o Oscar
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 23 de março de 1989
Se em termos de teatro - especialmente os musicais - a frustração é grande, por se saber que os espetáculos que dão certo no eixo Londres-Nova Iorque só serão mesmo vistos por quem possa passar nestas duas metrópoles, em termos de cinema não há a menor razão para se gastar as preciosas horas de uma viagem ao Exterior e assistir aos filmes de momento. Especialmente nesta época, na qual ao menos os filmes indicados ao 61º Oscar (dia 29, transmissão via satélite para o Brasil) estão tendo lançamento no Brasil.
Quatro dos principais "oscarizáveis" estréiam hoje em Curitiba: "As Ligações Perigosas", "Mississipi em Chamas", "Rain Man" e "Um Peixe Chamado Wanda". Estes filmes - assim como outros que também disputam, em diferentes categorias, os dourados prêmios, estão em exibição em Nova Iorque, Paris, Londres e dezenas de outras cidades porque a indústria cinematográfica é hoje, mais do que qualquer outra, extremamente descartável, com cada produto audiovisual tendo uma vida cada vez mais curta.
Muitos dos filmes estreados neste primeiro semestre já estão à disposição para venda em vídeo (ao redor de US$ 50), programados para Networks (televisão) e negociados para exibições nos mais diferentes veículos - TV a cabo, aviões, etc. Enfim, mais do que nunca o cinema perdeu aquele encanto, de se esperar meses (às vezes até anos) por um filme premiado.
Nesta época de comunicação instantânea e frias regras de marketing, quase 100 mil "produtos" audiovisuais são necessários anualmente para suprir milhares de horas de programações de televisão (só em Nova Iorque são quase 50, funcionando ininterruptamente), fazendo com que suas explorações nos cinemas tradicionais se transformem, cada vez mais, num processo frio, sem o charme e mesmo a mitologia que fazia do cinema um entretenimento que encantou gerações por sete décadas.
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Evidentemente que a força do Oscar - cuja festa transmitida por televisão, de Los Angeles, constitui hoje no programa de maior audiência mundial, significa a maior mídia promocional para o cinema e todos os filmes indicados ganham com isto. Obras que, muitas vezes, passariam despercebidamente - e em Curitiba, como acontece com os melhores filmes (vide caso de "Bird", de Clint Eastwood, fracasso de público) talvez nunca chegassem - mas com o charme do Oscar estão com suas bilheterias garantidas. Obviamente, que os membros da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, mesmo cometendo injustiças, não são idiotas e os que obtêm nominations possuem méritos - só que dentro de critérios que também os aproximam cada vez mais do gosto de grandes faixas de público.
Dos principais candidatos do Oscar, três deles poderão ser vistos a partir de hoje e, independente das premiações na próxima quarta-feira, terão, por certo, garantidas várias semanas de exibição.
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Na cabeça da disputa, "Mississipi em Chamas" (Mississipi Burning), de Alan Parker ("Fama", "Coração Satânico") é o trabalho mais vigoroso, levantando uma questão que até hoje poucas vezes o cinema americano foi a fundo: a violência da Ku-Klux-Klan no início dos anos 60, quando o presidente John Kennedy decidiu pela implantação das leis de Direitos Humanos. Baseado em fatos reais, este filme que concorre aos Oscars de filme, direção, ator (Gene Hackmann), atriz coadjuvante (Frances McDormand), entre outras categorias - mostra a luta de dois agentes do FBI (Hackmann e Willem Dafoe) na investigação de 3 ativistas pelos Direitos Humanos assassinados pela KKK. Com fotografia de Peter Biziou, música de Trevor Jones e roteiro de Cris Gerolmo, "Mississipi Burning" é daqueles filmes-denúncia, válidos por trazerem à discussão aspectos recentes da história contemporânea que ficam esquecidos - mas que justificam revisões. Um trabalho que confirma a seriedade de Parker, 45 anos, inglês, que desde "Bugsy Malone, Quando as Metralhadoras Cospem" (1976) vem fazendo uma carreira das mais sérias - que em termos de crítica cresceu a partir de "O Expresso da Meia Noite" (78).
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Desde que estreou no longa-metragem, com "Quando os Jovens se Tornam Adultos" (Diner, 1982, a disposição em vídeo), Barry Levinson impressionou pela segurança como diretor - que confirmaria em filmes posteriores ("Um Homem Fora de Série/The Natural", 84; "O Enigma da Pirâmide", 85). Seu recente (1988), "Bom Dia Vietnã" (Good Morning Vietnan"), passou desapercebido (e seria diferente?) no Bristol há 3 semanas, mas para "Rain Man" as coisas mudam: com 8 indicações ao Oscar - filme, direção, ator (Dustin Hoffman), roteiro, fotografia, direção de arte, montagem e trilha sonora - esta história de dois irmãos, numa longa caminhada de reencontro, se afigura como um dos favoritos ao Oscar e que garantirá casas lotadas no Condor e Palace Itália por mais de um mês.
Ironia! O público curitibano, tido como "intelectualizado" e "exigente", não soube prestigiar o excelente "O Amor Não Tem Sexo" (Prick Up Your Ears, 86), que há 60 dias teve magríssimo público durante uma semana em exibição no Bristol, agora vai lotar, por certo, os cines Astor e Cinema I, no qual o novo filme do mesmo diretor inglês - Frears - estréia: "As Ligações Perigosas", sucesso internacional há mais de 4 meses e que é também um dos favoritos ao Oscar, com 7 indicações: atriz (Glenn Close), atriz coadjuvante (Michelle Pfeiffer), roteiro adaptado (Christopher Hampton), direção de arte (Stuart Craig/Gerard James), cenografia (James Acheson) e trilha sonora original (Geroge Fanton).
Há exatamente 30 anos, em seu quarto longa-metragem, Roger Vadim, então com 31 anos, fez uma adaptação moderna de um dos mais famosos (e escandalosos) romances franceses, "Les Liasons Dangereuses", que Pierre Ambroise François Choderlos de Laclos (Amiens, 1741 - Tarento, 1803) publicou em 1782, uma análise penetrante dos costumes eróticos do século XVIII e considerado pelos críticos como modelo de "estratégia" na ficção. Com Jeanne Moreau (no auge de sua carreira) e Gerard Philippe (1922-1959), em seu penúltimo trabalho no cinema, versão moderna que Vadim fez do romance de Laclos provocou um novo interesse pelo romance - (que posteriormente teria outras adaptações, inclusive para o teatro).
No ano passado, Stephen Frears, 58 anos, um dos mais importantes nomes do cinema inglês contemporâneo (só agora começando a ser conhecido no Brasil) fez uma adaptação fiel à época, mas com sua visão corrosiva e corajosa (que tem marcado filmes como "Minha Querida [Adorável] Lavanderia" e, especialmente, "Sammy and Rosie Get Laid", 87, ainda inédito no Brasil). Com John Malkovitch, Swoosie Kurtz, Mildred Natwick - além de Glenn ("Atração Fatal") Close e Michelle Pfeiffer, "As Ligações Perigosas" tem tudo para ficar entre os filmes de maior bilheteria de 89. Independente dos Oscars que venha a receber.
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Com três indicações ao Oscar, "Um Peixe Chamado Wanda" (de Charles Crichton), com Jamie Lee Curtis, Kevin Kline e John Cleese (do grupo "Monty Python"), é uma comédia deliciosa, também com segura receita de sucesso (cine Condor). Outra comédia com tudo para agradar ao grande público é "Irmãos Gêmeos" (Twins), de Ivan Reitman, com Arnold Schwarzenegger (afinal mostrando que não é apenas um halterofilista visual) e o baixinho Danny DeVitto (cujo público cresceu depois de "Jogue a Mamãe do Trem") (Lido I).
Como o mito Lennon Vive, nada mais seguro do que um documentário a seu respeito que, desde seu lançamento internacional, há menos de um ano, tem feito grande sucesso: "Imagine" de Andrew Wolt (Bristol) é, ao contrário da biografia do oportunista Albert Goldman (até agora ainda sem tradução no Brasil), um tributo ao mais famoso dos Beatles, cujo assassinato na noite de 8 de dezembro de 1980, somente fez crescer em termos de interesse do seu público.
Num trabalho paciente entre imensa documentação - filmes e tapes, milhares de fotografias, entrevistas de rádio e televisão, enfim mais de 200 horas de precioso material, Andrew Wolt trabalhou num longa-metragem no qual utilizou a própria voz do homenageado para a narração e teve, obviamente, na sala de montagem, o seu ponto básico para o bom resultado deste tributo - que, em termos de cinema e música, se constitui em momento importante. A EMI foi quem editou a trilha sonora, tanto em fita, disco e CD.
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Como não tem cacife para conseguir filmes inéditos, a Fucucu também decidiu esnobar nesta semana: programou no Luz um clássico inglês, "Henrique V" (Henry V), primeiro longa dirigido e interpretado por sir Laurence Olivier, realizado em 1944 (em 1948, faria "Hamlet", Oscar - melhor filme estrangeiro; 1955, "Ricardo III" e 1984, "King Lear"). Com Laurence Olivier, aos 37 anos, à frente de um grande elenco de atores shakespeareanos, "Henrique V" é daqueles filmes de arte que merece atenção especial, constituindo-se quase que numa estréia já que há 4 décadas não era exibido (a cópia chega agora como subproduto de sua versão em vídeo, feita pela F.J. Lucas). Só que numa semana de tantas estréias atraentes, poderá faltar público no Luz (4 sessões, 14, 16, 20 e 22 horas) e o filme ser retirado de cartaz já na próxima semana. Se não fosse tão inabilidosa, a Fucucu deixaria este filme para outra época e não a "queimaria". Mas o que adianta falar, se a pretensa auto-suficiência de seus "gênios" consegue fazer com que o circuito oficial seja um desastre permanente?
LEGENDA FOTO - Requintado, malicioso e profundo, "As Ligações Perigosas", segunda versão do romance de Choderlos de Laclos, teve 7 indicações ao Oscar, é sucesso de público internacional e estréia hoje em Curitiba. Em cena, a aristocracia que é vista com olhar satírico nesta obra do inglês Stephen Frears: Cecile de Volanges (Uma Thurman), Madame de Rosemond (Mildred Natwick) e Madame de Volanges (Swoosie Kurtz) na primeira fila - e, atrás, os amantes Madame de Merteuil (Glenn Close) e o Visconde de Valmont (John Malkovitch).
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