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Aramis

Os Nossos Caipiras (V)

Na análise sociológica da música sertaneja, em termos de consumo, não se pode esquecer um tipo muito especial: uma parcela da classe média e mesmo superior adepta da música sertaneja, mas que não se revela como tal, dada a existência de determinado preconceito classista em relação ao consumo desse gênero. O sociólogo Waldenyr Caldas, em "Acorde na Aurora" (Companhia Editora Nacional, 167 páginas) acentua que esta faixa de apreciadores e consumidores deste gênero musical teria origens no proletariado rural, cuja afeição pelo gênero sertanejo se manteve. No decorrer de sua vida nas grandes cidades, conseguindo ascender ao status da classe média abandona o seu antigo estilo de vida. Entretanto, como sempre ocorre, tal ascensão se dá muito mais no nível sócio-econômico. Quanto ao gosto estético, a mudança é apenas superficial, uma vez que o indivíduo não consegue desvincilhar-se de suas raízes, ocorrendo mormente no sentido de satisfazer à exigência imposta pelo novo status. Ainda recentemente, o bem informado colunista Carlos Jung deu uma notícia em sua coluna que confirma a existência de nomes conhecidos nesta faixa. Por exemplo, o rico engenheiro-agrônomo Joaquim Severino, poderoso diretor-geral da Secretaria da Agricultura, paulista de Barretos, é proprietário de uma das maiores coleções de discos sertanejos, sendo fã em especial dos veteranos (Tonico( & Tinoco. Outro exemplo de pessoa de nível universitário Ivanir José Vieira, mineira de Ouro Preto, há anos no Paraná, que em suas viagens automobilísticas se delicia com uma completa coleção de seus ídolos sertanejos, em minicassetes. Entretanto, são poucas as pessoas que assumem uma posição aberta, em favor da música sertaneja. Pois a existência de preconceito classista com relação ao gênero faz com que o consumo por parte desta faixa de maior status se dê às escondidas. O veterano Murilo Alvarenga, da dupla Alvarenga e Ranchinho, há 2 anos, entrevistado pela "Folha de São Paulo", denunciava a existência desse preconceito classista: "Existe na verdade um certo preconceito urbano contra a música caipira e sertaneja no Brasil. Já confirmei isso pessoalmente; como se não bastasse o horário pré-determinado, numa pequena faixa da tarde e da manhã, em que as rádio-emissoras transmitem o gênero, a segregação existe nas próprias casas revendedoras de discos". No tocante aos horários de divulgação, o problema é estratégico: a maioria dos programas sertanejos vai ao ar entre 4 e 7 horas, espaço de tempo que coincide com (aquele( de que o trabalhador dispõe antes de iniciar a jornada de trabalho. Ao anoitecer, por outro lado, coincide com o término do expediente do trabalho. Mas a maior faixa de consumidores de música sertaneja é, naturalmente, do meio rural e do interior. Onde, tal como se dá nos grandes centros urbanos, o consumo é determinado pelo maior ou menor ajustamento econômico. Há assim o homem do campo, que realmente trabalha a terra e que por uma questão de localização geográfica, ainda não está, de certa forma, inteiramente integrado no mercado de consumo. Apesar disso, é receptível do gênero, principalmente pelo rádio. Há o consumidor da cidade do interior, que ouve rádio e compra discos das duplas. Ele é formado por uma parcela da população que já goza certa estabilidade (econômica(. Isso se nota, perfeitamente, em todas as comunidades do Paraná, onde, em qualquer povoamento há um ponto de venda de discos sertanejos. Em Cascavel, por exemplo, a cidade paranaense com maior boom de progresso, a principal loja de discos, moderníssima, na Avenida Brasil, concentra 90% de suas vendas em músicas sertaneja e gauchesca, esta com maior (preferência( devido a formação da população. A maior parte provinda do Rio Grande do Sul. A presença de discos sertanejos nas lojas do Interior é tão grande que certas gravadoras mais sofisticadas, como a BASF, Odeon e mesmo Warner, praticamente desistiram de tentar seus produtos nesta faixa - que atinge pessoas de imenso poder aquisitivo mas uma preferência musical muito bem definida e, naturalmente limitada.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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Tablóide
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25/08/1977

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