Palcos iluminados para o talento de Marchioro
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 02 de janeiro de 1989
1988 terminou com um positivo saldo e 1989 inicia com grandes perspectivas profissionais para Marcelo Marchioro, hoje o paranaense que vem obtendo a melhor performance no difícil (e altamente competitivo) ranking dos diretores do teatro brasileiro.
Nas últimas semanas, os mais importantes veículos da imprensa paulista publicaram críticas elogiando a ultima encenação de Marcelo, "O Olho Azul da Falecida" (Loot, 1967) de Joe Orton (em cartaz no Teatro Paiol, Rua Amaral Gurgel , 164, em São Paulo ), com Paulo Goulart e Bárbara Bruno, Haroldo Bolta e Chico Martins .
Esta é a terceira produção em que Marchioro trabalha com a família Paulo Goulart / Nicete Bruno, de profundas ligações curitibanas: anteriormente foi assistente do diretor Antônio Abujamra em "A Margem da Vida", de Tennessee Williams - com Nicete e seus filhos, Bárbara e Paulinho (este nascido em Curitiba, 1964), quando o casal aqui morava, atuando no então Teatro de Comédia do Paraná. Depois, em co-autoria com Bárbara Bruno, Marcelo fez um espetáculo sobre Camões.
Agora, recuperando a idéia do chamado "teatro de repertório", a família Goulart (a outra filha do
casal, Beth, também é boa atriz, além de cantora já com elepês gravados) vai viajar por cidades do Sul neste primeiro semestre - começando por Curitiba e aqui trazendo, numa mesma semana, as peças de Orton, Williams e o espetáculo sobre Camões.
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Enquanto cruza as madrugadas, entre dezenas de livros (em francês, inglês, espanhol, italiano e português) do escritor, músico e, sobretudo, extraordinário intelectual que foi Boris Vian (1920-1959), completando uma peça ("Nenúfar") sobre sua vida e obra, Marcelo já começou a dirigir o espetáculo, que marcará a estréia de um novo grupo profissional, formado por sete vigorosos jovens recém-formados pelo Curso de Artes Cênicas da Fundação Teatro Guaíra/Universidade Católica: Erica Migon, Ana Fabrício, Adonis Rique, Guácomo Glausi, Giovani Soar, Joelson Medeiros e Kátia Drumond.
Com música de Duke Ellington (1899-1974), coreografia de Sandra Zuguim, "Nenúfar" estréia em Curitiba (Teatro do Sesc), para uma temporada que prevê apresentações no eixo Rio/São Paulo.
Estudioso da obra de Boris Vian - que até pouco tempo era totalmente desconhecido no Brasil (agora, existem traduções de três de seus livros "A Espuma dos Dias", "Escritos Pornográficos" e "Vou Cuspir no teu Túmulo" (que publicou com o pseudônimo de Vernon Sullivan), Marcelo vinha trabalhando há mais de seis anos num espetáculo a seu respeito. Assim como fez no espetáculo que criou e dirigiu em torno de Lewis Carrol (1832- 1898) - "O Outro Lado da Paixão" - Marcelo mergulha no universo fascinante de Boris Vian, para um espetáculo que deverá ter repercussão nacional.
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Outra peça que Marcelo dirige é "Eu, Fuerbach", último texto de Tankred Dorst, 64 anos, conhecido no Brasil por "Gritaria nos Muros da Cidade" (direção de Ivone Hoffman) e a leitura de "Merlin" - quando veio a Curitiba para fazer palestras.
Tendo por tema um velho ator que decide retornar aos palcos e um diretor de uma nova peça, Dorst analisa os conflitos e a precariedade da vida humana em "Ich, Fuerbach" (auditório Bento Munhoz da Rocha Neto, a partir do dia 18 de janeiro), que terá interpretações de Emílio Pita, Carlos Manuel e Marília Bruenning.
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Para este primeiro semestre, um projeto já bastante desenvolvido: a primeira montagem de "Boca de Ouro", ópera do compositor Zé Rodrix, até hoje inédita, baseada na peça de Nelson Rodrigues (1912- 1980) - e que Nelson Pereira dos Santos filmou em 1962. No papel de Boca de Ouro, um cantor convidado do Rio de Janeiro. A ópera após a estréia em Curitiba será levada ao Rio e São Paulo. Zé Rodrix (ex-integrante do Som Imaginário, autor de "Casa no Campo", parceria com Tavito, um dos maiores êxitos de Elis Regina) vem a Curitiba no próximo fim-de-semana para acertar detalhes finais da produção.
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Aos 36 anos, ex-diretor de arte e programação do Teatro Guaíra e do Museu da Imagem e do Som - nos quais desenvolveu excelente trabalho, há menos de dois anos, Marcelo, ex-técnico do Badep, engenheiro químico com cursos de especialização, fez sua opção pelo teatro. Relacionado nacionalmente, passou a ter várias propostas de trabalho em São Paulo, embora continue a manter residência em Curitiba. Nos últimos meses além de ter feito trabalhos de pré-produção de "O Drama da Fazenda Fortaleza" (assistência da diretora Berenice Mendes e direção de atores, que, infelizmente foi adiado devido a falta de recursos, Marcelo dirigiu a ópera "O Refletor" - também em estréia nacional, e, em São Paulo, além das montagens de "A Margem da Vida" e "O Tempo e o Tempo na Vida de Carlos & Carlos" (assistência de Emílio Di Biasi, autor e diretor geral), foi também assistente de direção de "Gepeto", de Roberto Cossa, co-escreveu e dirigiu, fez a sonoplastia e iluminação de "Camões" (que ficou todo o segundo semestre em cartaz no Teatro Paiol, SP). Encontrou ainda tempo para traduzir "Seascape", de Edward Albee - que no Brasil vai se chamar "Quarteto de Cordas".
Organizado, com, uma informação up to date do que acontece de mais importante no teatro de todo o mundo e hoje com um know-how que o credencia a curto prazo, atingir o círculo dos grandes diretores de teatro, Marcelo preocupa-se, generosamente, em valorizar os nossos artistas, sacrificando inclusive chances financeiramente mais atraentes para aqui realizar trabalhos que considera importantes quando encontra pessoas com entusiasmo. Assim fez na encenação de "Do Outro Lado da Paixão" e repete com "Nenúfar", entusiasmado com a garra, juventude e "beleza de intenções" dos jovens que o procuram para esta primeira montagem do grupo que acabam de organizar.
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