Com Jeito Natural, o rock paranaense também protesta
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 04 de fevereiro de 1988
"Vou até o supermercado
pra comprar arroz, feijão...
Mas quando vejo tá tudo remarcado
Tive uma decepção
O preço subiu de novo
O meu salário que gracinha
Com a grana que levei
Comprei um quilo de farinha
É que eu não tenho dinheiro
O meu defeito é financeiro"
("Defeito Financeiro", Antônio Luiz / Antônio Carlos / Marcos Serra).
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Com "Jeito Natural", Curitiba também entra no rock-protesto. As vozes dos garotos do grupo formado há cinco anos, como tantos outros, nos fundos de uma garagem, começa a ser ouvido nas FMs, em seu protesto contra a carestia:
"O meu defeito é financeiro
Fui comprar à prestação
Uma TV pra minha filha
O preço era tão alto
Comprei um rádio de pilha
A geladeira tá vazia
O telefone desligado".
A exemplo do que estão fazendo os mais bem sucedidos grupos de rock surgidos nestes anos 80, o "Jeito Natural" também usa da ironia e da sátira para se queixar dos tempos bicudos que vivemos.
- "O que não significa que não tenhamos também o nosso lado romântico" - apressa-se a explicar Wilson Quintiliano, 29 anos, londrinense, vocalista e líder do grupo, que com elepês gravados, autonomia em termos de transporte e som (possui um microônibus e moderno equipamento de som e luz), não vence os compromissos para apresentações em cidades do Paraná e Santa Catarina.
Organização e garra fazem com que os cinco rapazes do "Jeito Natural" estejam conseguindo abrir seu espaço. E, principalmente, o trabalho de sua manager e relações públicas, a bela Cristina da Silva Oliveira, curitibana, 27 anos, ex-publicitária e radialista, que mergulhou de cabeça no gerenciamento do grupo.
- "Talento os meninos possuem. Precisavam é de uma boa administração" - explica.
Há quatro anos, o produtor Esdras, da Companhia Industrial de Discos, ouviu o conjunto durante sua passagem por Curitiba. Imediatamente os contratou para fazerem um "disco cover", ou seja, com sucessos do momento, para venda na linha de discos baratos, que a CID comercializa nas redes de supermercados. A edição esgotou (nem o próprio grupo ficou com um único exemplar), mas pelo fato de executarem músicas já conhecidas, o disco passou despercebido. No ano passado, depois de muitas idas e vindas a São Paulo, o "Jeito Natural" conseguiu fazer um elepê na Copacabana ("Nosso Filme"), lançado em outubro, mas que só agora está sendo devidamente promovido. Com músicas próprias e afetivas participações especiais - incluindo a do afinadíssimo Markinhos Moura em "Estrela Guia" - o "Jeito Natural" briga por um espaço - sendo, afora o Blindagem (com seu segundo elepê na praça), o único grupo de rock de Curitiba que já conseguiu fazer um disco para lançamento nacional.
Wilson Quintiliano, e mais seus quatro colegas - Ubiratan Fernandes, 30 anos; Bido Porfirio, 27 anos; César Reis, 25 anos - curitibanos, mais Gerson Rosa Martins, gaúcho de Porto Alegre, 26 anos, estão integrados num projeto que não recusa trabalho: fazem shows em ginásios, teatros, bailes - "tocamos até para dançar", diz César Reis, explicando:
- "Nesta fase não podemos recusar nada!"
Morando juntos numa casa-estúdio, no bairro de Uberaba (Rua Alfredo Vieira Barcelos, 1 - fone 276-1172), vivem e respiram música 24 horas por dia. Em faixas como "Herói do Gibi", "Sensual", "Trem de Ferro", "Amizade Cor de Rosa" - incluídas no primeiro elepê - mostraram já uma diversificação de temas. Agora, Quintiliano, Porfirio e Gerson - como compositores, afirmam que estão voltados a levantar temas atuais:
- "Não somos políticos mas não podemos nos alienar de uma realidade. As coisas estão precisando ser ditas e uma das questões que nos preocupa é a destruição do meio ambiente. É por aí que a gente está trabalhando em várias músicas novas".
LEGENDA FOTO - "Jeito Natural", grupo de rock curitibano, também entrou na onda de protesto: "Defeito Financeiro", um hino à inflação.
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