Laertes e o filme "O Diabo de Vila Velha"
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 04 de maio de 1988
O trágico acidente que custou a vida de Laertes Moreira, o simpático "jornalista do cachimbo", no último fim-de-semana, não deve ficar no registro apenas nas páginas policiais ou nas curtas notas de um obituário que surpreendeu seus (muitos) amigos. Bonachão, simpático, identificado sempre com o cachimbo, Laertes era na verdade mais um (atuante) corretor de espaços publicitários do que um jornalista, embora, na prática, cobrisse sempre muitos fatos, especialmente ligados a prefeitos do Interior, seus clientes.
Entretanto, há ao lado deste Laertes, um outro, que merece registro para que conste, um dia, de uma possível (e necessária) história do cinema no Paraná.
Em 1964, logo depois do golpe de 1o. de abril, um próspero empresário paulista, Nelson Teixeira Mendes, que havia, anteriormente, produzido uma versão para a tela do romance "O Cabeleira" de Franklim Teávora (1842-1888) animou-se a rodar um bang-bang na região dos Campos Gerais, no Paraná. Convocou Ody Frega, roteirista de programas de rádio e televisão em São Paulo para escrever o argumento e montou a produção. Laertes Moreira conheceu Nelson, ganhou sua confiança e acabou tornando-se uma espécie de diretor de produção do filme em Curitiba, acertando esquemas financeiros, procurando cenários e quebrando mil e um galhos que aparecem durante as filmagens.
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As filmagens de "O Diabo de Vila Velha" tiveram início com algumas seqüências de interiores - um cenário reproduzindo uma cadeia, construída no amplo espaço do grande auditório do Teatro Guaíra, então com suas obras paralisadas. As filmagens alongavam-se madrugadas a dentro e as tensões explodiam. Ody Fraga desentendeu-se com o produtor Nelson Teixeira Mendes que convocou então José Mojica Marins - o Zé do Caixão - na época começando a ficar conhecido pelos seus filmes de terror ("Esta Noite Levarei Tua Alma", "A Meia Noite Encarnarei em Teu Cadáver"), mas que já tinha uma experiência de diretor de filmes de ação.
Entretanto a produção foi difícil. Até o co-produtor, Alfredo Palacios, chegou a palpitar em algumas seqüências.
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Só a duras penas o filme foi concluído e lançado, em sessão de gala dois anos depois, no cine Plaza. Sua carreira comercial foi lamentável pois as diferentes substituições na direção, troca de intérpretes e mudanças na história fizeram com que do argumento original pouco restasse.
Nelson Teixeira Mendes apaixonou-se por uma das atrizes do filme, por sinal que conheceu em Curitiba, e com ela se casou, fazendo outros filmes na tentativa de torná-la uma star. O que não conseguiu.
Ody Fraga viria a fazer carreira na chamada Boca do Lixo, dirigindo meia centena de filmes pornográficos, defendendo inclusive a estética do sexo explícito numa entrevista a "Playboy" que ficou famosa. Morreu há dois anos.
Laertes Moreira, em Curitiba, tentou inclusive viabilizar outras produções mas acabou transferindo-se para o jornalismo comercial, produzindo suplementos e edições especiais, especialmente sobre administrações municipais.
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Do filme "O Diabo de Vila Velha" - que tinha muitas seqüências externas, inclusive de Vila Velha e Foz do Iguaçu (na história, havia uma aproximação geográfica das duas atrações naturais) acabou se perdendo. Há 10 anos, quando implantou a Cinemateca do Museu Guido Viaro, o pesquisador Valêncio Xavier tentou, inutilmente, obter cópia. O máximo que conseguiu foi o "trailler" do filme - possivelmente a única memória que ficou daquela experiência de rodar bang-bang no cenário do Parque Estadual de Vila Velha.
LEGENDA FOTO: Laertes Moreira, o homem do cachimbo.
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