Lápis, adeus
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 12 de fevereiro de 1978
Lápis morreu. Na madrugada, que ele sempre amou e cantou. Sexta-feira, às 2h30m da manhã, seu coração - tão imenso e apaixonado - não resistiu e parou. Mais uma voz da noite curitibana se calou.
As palavras de carinho e homenagem ao bom amigo, compositor e violinista que se foi de nada adiantam. Fica a saudade, suas músicas, sua lembrança - sempre alegre, atencioso, disposto a mostrar "mais uma, que pode não ser boa, mas é minha", como dizia, brincalhão. Os problemas pessoais, a dor que sentia - principalmente nos últimos 2 anos, após a morte da Márcia, sua companheira querida - nunca o derrotaram e , como diz a máxima do mundo do show-business - o espetáculo não pode parar - ele não parava.
Lápis morreu sem ver suas músicas cantadas por todo o Brasil, como merecia. E, mais do que qualquer outro artista do Paraná, lutou para isso: Inúmeras tentativas no Rio de janeiro e São Paulo, contatos com produtores, cantores, empresários - sem que tivesse conseguido "furar" a barreira, as "panelinhas", que infelizmente, ainda dominam a MPB. Uma magra gravação em compacto simples na fantasma Orange, com "Vestido Branco" - sua música mais conhecida, três ou quatro sambas gravados por Eliane Pittman (com o qual trabalhou algum tempo) e Os Originais do Samba, o pouco da obra de Lápis - no registro civil Palmilor Rodrigues Ferreira - que ficou gravado. No mais, são dezenas de canções sozinho ou com bons parceiros (como Paulo Vítola), que permanecem conhecidas apenas de seus amigos - cantadas em madrugadas vazias e tristes, em bares e restaurantes.
Lápis morreu pobre - como sempre viveu - em termos financeiros. Mas rico em amigos e admiradores, que ontem foram lhe prestar sua última homenagem. Poderia-se dizer que a morte de Lápis vem mostrar, mais uma vez, o abandono e a indiferença a artistas populares que, preferindo a sensibilidade e a liberdade do que as regras do marketing promocional, permanecem anônimos em suas cidades. Mas o bom Lápis, que nunca fez questão de ter seu nome em jornal, preferindo mais a amizade do que a badalação, não gostaria disso. Para ele, o importante era a música que saía espontaneamente, a mulher amada ao lado - e ele foi bem amado, por mulheres compreensivas e sensíveis um copo do bom conhaque, o violão e poesia.
Oi! Bicho. É difícil por num papel branco as palavras que falem de V., em toda sua dimensão. Mas quem o conheceu, entenderá. E, por certo, sentirá algo na garganta quando ouvir, de agora, em diante, alguém cantar:
...Ponha o teu vestido branco...
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