Medicina e a música, paixões de um exemplo para gerações
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 09 de fevereiro de 1991
O sonho do casal Hélio e Ofélia Brandão seria aproveitar uma parte da belíssima propriedade que adquiriram há 30 anos nas Mercês para ali construir uma escola de música, acoplada a um grande auditório - aproveitando inclusive a própria formação do terreno. Construída pelo madeireiro Ruy Itiberê da Cunha, já falecido (que foi o primeiro sogro do artista Juarez Machado), a mansão ergue-se numa pequena colina, entre dezenas de árvores e um bem cuidado jardim.
O talento musical dos filhos (e muitos amigos) faria com que o professor Brandão fosse um homem disposto a fazer "florescer" - uma palavra que gosta de repetir - "um espaço agrupando a música" - um centro de ensino e pesquisas, auditórios, etc. Infelizmente, frente à fria realidade econômica do país, um projeto desta ordem seria inviável. Afinal, há alguns anos, teve que sacrificar poupanças para auxiliar a sua filha, Maria Eunice, que, idealisticamente, acreditou nas promessas dos "donos" do poder cultural da cidade e aqui organizou um encontro de música antiga, trazendo nomes importantes da Europa. Acabou tendo que arcar com despesas, hospedando-os em sua casa e pagando até passagens aéreas.
Isto, entretanto, não traz mágoas ao médico Hélio Brandão, uma das pessoas mais generosas de Curitiba. Como um dos maiores especialistas em tratamento de doenças do esôfago, sua preocupação com o drama das pessoas - especialmente crianças vítimas da ingestão de soda cáustica - o fez idealizador e fundador do Clube da Soda, que, funcionando anexo ao Hospital Nossa Senhora das Graças, transformou-se em exemplo nacional. Filho de uma família numerosa - seu pai, baiano de nascimento, era padeiro e se fixou em Curitiba em 1942, para que os 9 filhos pudessem fazer cursos universitários, Hélio Brandão formou-se em medicina em 1949. Trabalhando com um dos maiores especialistas em doenças do pulmão, Giocondo Villanova Artigas, especializou-se nesta área e, em seus 40 anos de medicina já atendeu 680 casos de pessoas, especialmente crianças, vítimas da soda cáustica. Embora, nos últimos anos, graças a campanhas de esclarecimento e o trabalho do Clube da Soda, estes casos tenham se reduzido, ainda continua a aparecer uma média de um por semana. Por três vezes, o professor Brandão colaborou com parlamentares (especialmente o falecido deputado Arnaldo Busato) para que a venda da soda cáustica fosse proibida em todo o país. "Infelizmente, o lobby das indústrias tem sido mais forte e os projetos tem sido engavetados", lamenta, acrescentando que, "Curiosamente, a proporção da soda vendida como detergente, diretamente ao público, não é significativa em termos de consumo, sendo mais utilizada em indústrias. Detergentes vendidos em supermercados e armazéns do Interior, mesmo tendo sódio em menor escala, igualmente são perigosos", acrescenta.
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Como médico e professor da Universidade Federal do Paraná, o professor Hélio Brandão dispõe de importantes informações sobre esta área da medicina, atendendo também em seu serviço especializado junto ao Hospital Nossa Senhora das Graças centenas de casos mensalmente, com dados alarmantes (casos de câncer provocado pelo cigarro; tentativas de suicídio por adultos por ingestão de sódio, etc.). Entretanto, o que fascina, é lembrar seus tempos de músico amador, junto aos idealistas que criaram a Orquestra Estudantil do Paraná - conforme ficou registrado no depoimento gravado para a Memória Histórica do Paraná, que o Bamerindus patrocina há 4 anos.
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