O cenário de Martinho
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 12 de outubro de 1975
Após uma crise de três anos (1968/70), o Samba ressurgiu com força em nosso mercado, apesar de toda alienação provocada pela [supérflua] música pop. Analisando, lucidamente, este tema, o jornalista Sérgio Cabral escreveu ("Opinião", 3/10/75), que "a virada do mercado musical para o samba, desencadeada há quatro anos, ocorreu pouco depois de uma fase de mais ou menos três anos em que o samba sofreu a sua pior crise de consumo desde 1916, quando foi editado o "Pelo Telefone", de Donga e Mauro de Almeida (...) Nessa fase um único sambista de sucesso assumiu inteiramente o samba: Martinho da Vila".
Hoje, "Claridade" (Odeon) com Clara Nunes vende em menos de duas semanas nada menos que 250 mil exemplares, a Tapecar coloca em um único suplemento mais de 6 elepes de novos sambista) e as previsões de vendas do novo disco de Martinho da Vila ("Maravilha de Cenário", RCA Victor 110.008, setembro/75) são de 800 mil cópias - superando, em muito, o decantado "rei" (da ex-Jovem Guarda) Roberto Carlos. O novo disco de Martinho, a exemplo do anterior (Canta Canta, Minha Gente", RCA 110.0002, agosto/74) é um álbum produzido com todo o esmero: capa dupla, ilustrações de Elifas Andreato, repertório selecionadissimo, bons músicos. Sétimo elepe de sua carreira, "Maravilha de Cenário", pretende ser uma espécie de aquarela (popular) brasileira, inclusive plasticamente ilustrada nas fotos de Iolanda Husak, no encarte que acompanha o álbum.
Partindo de um belo samba-enredo do falecido Silas de Oliveira, "Aquarela Brasileira", Martinho traz sete novas músicas: "Você Não Passa de Uma Mulher", "Maré Mansa", "Salve A Mulata Brasileira", "Verdade Verdadeira", "Cresci no Morro", "Se Algum dia" e "Glórias Gaúchas". Quatro outras faixas foram reservadas a compositores amigos: "Andando de Banda" (Rildo Hora/Sérgio Cabral), "Lá Na Roça" (Mês de Maria) (Candeia-Alvarenga) e "Hino dos Batutas de São José" (João Santiago, onde há a participação especial da Orquestra Tabajara de Severino Araújo). "Maré Mansa", uma das melhores faixas do elepe, é uma parceria com Paulinho da Viola.
Uma prova dos recursos que a RCA Victor colocou a disposição de Martinho na produção deste elepe é o fato de mais de 50 músicos terem participado desta gravação, incluindo nomes de prestígio como Rosinha de Valença e Luiz Cláudio (violões) - o que deve ter elevado bastante o custo de sua realização. Três arranjadores - Rildo Hora (que executou harmônica, em algumas faixas), José Roberto Bertrami e Rosinha de Valença e três maestros, Severino Filho, Rildo e Bertrami, foram convocados pelo diretor artistico Carlos Guarany, para dar ao disco excelente acabamento. Aliás, em termos de produção, não há dúvida de que de agora em diante, a indústria fonográfica terá que se esmerar, cada vez mais, na apresentação dos álbuns - já que o público está cada vez mais exigente. O que já não era sem tempo.
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