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Aramis

O homem que ama o mar

Entre as (muitas) adjetivações que caberiam a Wilson Galvão do Rio Apa estaria a de "o homem que ama o mar". Em uma obra que se espraia em mais de 50 títulos - entre romances, contos, ensaios e peças de teatro ao longo de 40 anos - o grande personagem tem sido o mar. Seus segredos, mistérios, e, especialmente, o seu povo, são as presenças e histórias & estórias nos quais se entrecruzam reflexões filosóficas, o imaginário e uma sempre presente consciência política ecológica-social, que, como um golfinho solitário (seria um lobo, se ao invés do mar vivesse nas estepes) tem provocado polêmicas, feito inimigos, assumido posições radicais - mas também influenciando jovens intelectuais - na literatura e no teatro - e procurado sempre chegar àquela platéia que mais o cativa: o povo do mar, os pescadores e agricultores que vivem em nossa Costa Atlântica. No domingo chuvoso, Wilson, mais uma vez, esteve no Litoral. Foi a Paranaguá, de onde pretendia alcançar algumas ilhas da baía para "cumprir uma promessa muito pessoal": mostrar ao povo-personagem os primeiros exemplares de "Os Vivos e os Mortos" (quatro volumes, acondicionados numa caixa, edição da Secretaria de Estado da Cultura). Antes do lançamento oficial (quinta-feira, 28, às 18 horas no hall da Secretaria; às 19h30 na Ypê Amarelo, Rua Comendador Araújo, 96), Wilson desejava que pelo menos algumas das pessoas simples, que o inspiraram nesta obra criada ao longo de seis longos anos, fossem os primeiros a conhecê-la. - "Queria fazer uma leitura de alguns trechos, pois tenho certeza que eles entenderiam". Quando o livro ainda não estava pronto já havia feito interessantes experiências neste sentido. A chuva e os ventos fortes no domingo impediram que a embarcação deixasse Paranaguá e assim Wilson retornou a Curitiba sem poder fazer este "lançamento marítimo" que teria uma documentação de uma equipe de televisão. "Mas voltarei outro dia para cumprir esta promessa", promete. Dentro de uma caudalosa, personalíssima e, sobretudo, coerente obra, "Os Vivos e os Mortos" é o 15º título na área de ficção e ensaios. - "Não tenho muita certeza da ordem cronológica, mas deve estar por aí", explica o autor. E dentre os lançamentos patrocinados pela Secretaria da Cultura do Paraná, "Os Vivos e os Mortos" é gratificante, o mais interessante o original. São quatro volumes na dimensão 20 x 50 cm, com capas em cores diferentes (azul, verde e rosa), sem nenhuma informação nas mesmas. Apenas as ilustrações de José Alvin (Mano), um artista que também se identifica aos segredos, mistérios e belezas do mar, que produziu mais de 50 belas pranchas, em preto e branco, traços fortes, quase lembrando xilogravuras (e que estarão em exposição no hall da secretaria), procurando traduzir o espírito do livro. Cristovão Tezza, escritor, professor da Universidade Federal do Paraná, amigo e uma espécie de afetuoso discípulo do Rio Apa desde seus dias de adolescência, define que "as belas ilustrações do artista plástico Mano, que acompanham o texto, são o texto contraponto em imagens do mundo da obra: do seu traço, tomam forma as sugestões poderosas do livro, acompanhando o leitor na mesma travessia poética". Da amizade e intimidade intelectual do Rio Apa, Tezza foi um dos privilegiados leitores que viu a gênese desta obra e um de seus primeiros leitores. Assim, mesmo antes da mesma chegar, na edição integral (os dois primeiros volumes haviam sido lançados originalmente pela Brasiliense e o terceiro estava programado para sair pela frustada CooEditora), Tezza mergulhou nos múltiplos caminhos que oferece e produziu um ensaio-tese de quase 300 laudas, ainda inédito naturalmente). Em três páginas e meia do primeiro volume, Tezza fala sobre "A Arte de W. Rio Apa", no qual em seu primeiro parágrafo, diz que de toda a sua produção iniciada na década de 40, "Os Vivos e os Mortos", assoma como um momento de síntese e referência obrigatória daquele que é, certamente, o mais singular de nossos escritores". Já René Dotti, secretário da Cultura e amigo pessoal de Rio Apa - e que se empenhou para a criação desta obra - diz que "Os Vivos e os Mortos" é muito mais que o espírito e a palavra de Rio Apa como passageiro de existência. A obra mostra o triunfo da vida sobre a morte quando a lembrança dos homens e das paisagens sugerem o cinzel e a argila que vão remodelando as margens desde as mais antigas paragens da saudade até os mais distantes portos do futuro". No entendimento do autor, o livro - apesar de amplo e caudaloso, ao longo de quatro volumes, média de 150 paginas cada um, é de uma leitura fácil e comunicativa, dando um exemplo: várias passagens foram adaptadas a encenações teatrais, "praticamente sem necessidade de mudanças dos textos-diálogos". Fugindo de classificações rígidas - pode ter leituras em diferentes gêneros - "Os Vivos e os Mortos" é, antes de tudo, uma obra pessoal, criativa e assumida por seu autor como uma ampla tentativa de expor sua visão do mundo através da simplicidade de personagens e cenários. LEGENDA FOTO - Ilustrações do artista plástico Mano nas capas e quatro volumes de "Os Vivos e os Mortos", de Rio Apa, que será lançado quinta-feira.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
26/09/1989

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