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Aramis

Os pecados da Igreja segundo o frei Cesar

A repercussão nacional que obteve a I Semana de Arte e Erotismo, realizada no ano passado pela Fundação Cultural, fez com que o seu principal idealizador, o frei dominicado Paulo Cesar Botas, 43 anos, ficasse conhecido como uma espécie de expert (religioso) em erotismo. Prova disto foi a sua escolha para escrever o "Ponto de Vista" sobre a Igreja e o sexo, em inflamado texto que ocupa a última página da revista "Veja" desta semana. Doutor em Filososfia, autor de uma tese sobre a experiência do semanário "Brasil Urgente", editado pelos dominicanos, em São Paulo, nos anos 60, com longa permanência em Paris, amigo pessoal de Geraldo Vandré e Milton Nascimento (com quem, inclusive, fez o lp "Ânima", Ariola, 1983), Paulo Cesar é uma personalidade polêmica. Agora tem sido lembrado como o futuro diretor executivo da Fundação Cultural - com a ascensão do carnavalesco Glauco Souza Lobo para a Secretaria de Turismo. Só que apesar de sua simpatia e cordialidade, Paulo Botas encontra bolsões de resistência ao seu nome - e no que pese ter sido o mais influente assessor do presidente da Fundação Cultural, Carlos Marés de Souza (agora com o status de secretário da Cultura), a sua nomeação ainda não está decidida. Mesmo com uma amizade do prefeito Roberto Requião que tem origens nos tempos mais brabos da repressão. xxx Com o título de "A Igreja também tem pecados", Paulo Cesar Botas inicia seu "Ponto de Vista" lembrando a condenação pela Igreja de "Je Vous Salue Marie", o filme de Jean-Luc Godard, "porque nossos bispos consideram sacrílega a aparição na tela de uma Virgem Maria atual, jovem, bonita - e nua". Diz o frei Paulo Cesar: "É uma privação pequena, porém, se comparada àquela imposta a milhões de casais divorciados pelo recente Sínodo dos Bispos realizado em Roma por convocação de João Paulo II, reafirmando o que o Papa já havia estabelecido em 1980: os católicos que se divorciam e se casam novamente só podem receber sacramentos se não mantiverem relações sexuais. Isso equivale a uma condenação perpétua à abstinência sexual, a uma impositiva e absurda extensão dos votos de castidade para dentro do matrimônio". O artigo de Paulo Botas é contundente e claro - e naturalmente já começa a provocar reações nos meios católicos. Por exemplo, após fazer uma citação do livro do Gênesis, o frei diz que "negar ao homem o prazer e a ternura de seu corpo, ou reduzir a sexualidade a mera reprodução genital da força do trabalho é perverter a ternura humana e divina. Nesta perversão, a moral sexual da Igreja Romana distorceu e atrofiou a vivência imediata do prazer da vida, em nome de uma virtude estática denominada "contenção racional" do prazer para a formação de reprodutores assépticos que devem carregar nos seus corpos e mentes a culpabilidade da ternura da pele e do lúdico amoroso". xxx Com um certo toque de ironia, lembra também a imagem dos congregados marianos e filhas de Maria, "com suas fitas azuis ornamentando os peitos arfantes e heróicos e tendo como modelo a Virgem Maria, casta e ilibada. Ao se casarem, as filhas de Maria continuavam a carreira no apostolado de oração, mas nos templos tinham de substituir o véu branco pelo véu preto, ornavam o peito de fitas vermelhas e tinham como modelo a dor e sofrimento do Sagrado Coração de Jesus, com sua coroa de espinhos cravada no próprio coração sangrante. Desta forma, sub-repticiamente, o recorte sexual organizava os leigos católicos, como que penalizando os casados". xxx Quase ao final, Paulo Cesar Botas diz: "A Igreja Romana deveria aprender a amar o mundo e não só fazer sínodos para julgá-lo e também os homens que o amam. Em vez disso, ou de censurar filmes e silenciar teólogos que se entregam aos pobres, deveria entender que é a sexualidade que pode trazer à tona a dimensão perdida do paraíso: a da ternura prazerosa da vida".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
13
22/01/1986

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