Poemas de Simões, Drummond e outros
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 20 de junho de 1987
João Manuel Simões está deixando de ter que custear as edições de seus livros e ter a satisfação de vê-los editados nacionalmente. Afinal, são mais de 20 anos de atividades literárias, de extrema regularidade, que se traduzem em quase três dezenas de títulos - nos campos da poesia e prosa, com poemas, contos e ensaios que tem, hoje, reconhecimento da crítica mais rigorosa.
Agora a Philobiblion, editora dirigida pelo admirável Enio Silveira, reedita "Ode ao alferes Joaquim José da Silva Xavier", obra pequena em número de páginas (apenas 17), mas grande em conteúdo literário. Reynaldo Bayrão, do "Jornal de Letras", lembrou na introdução que Simões extrapola a poesia de caráter apenas nacionalista ou louvaminheiro no sentido de se cantar um grande herói nacional.
Diz Bayrão:
- "Sem dúvida, aqui a coisa vai muito além. Felizmente. Todo ele construído numa linguagem lírica, quase diáfana, não conseguimos associar este poema nem a Cecília Meireles, nem a Oswaldo de Andrade, nem a nenhum outro poeta que se utilizou do tema anteriormente. Esta ode salienta-se por uma genialidade calma e muito pensada, por um fluir vocabular antiprecioso, por um utilizar-se de dados históricos transfigurados ao passar para o plano da poesia.
O crítico do "Jornal de Letras" lembrou que a preocupação de Simões com a palavra salva-o "de qualquer demagogia declamatória (tão comum em obras congêneres) fazendo mesmo o poeta confessar em certa passagem de sua ode:
Palavras ditas, reditas
Proibidas, interditas
Palavras que são carícias
Palavras que são veneno
Palavras cujas milícias
Se malbaratam no ar
Palavras são chicotes
Punhais, cilíciso, archotes
Ó palavras, ó palavras
áspides frias, sonoras
mordendo as noites caladas
ruminando a solidão!
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João Manuel Simões é um dos curitibanos que mantém correspondência mais assídua com Carlos Drummond de Andrade. E falando no Poeta Maior, a Record - que passou a deter os direitos de sua obra - continua reeditando-a em caprichados volumes. Agora temos os volumes I e II de "Boitempo", que reúne poemas de CDA publicados anteriormente nos livros "Boitempo", "Menino Antigo" e "Esquecer para Lembrar".
Drummond preferiu esta reunião, uma vez que os poemas tratam da mesma seqüência de tempo, existindo nos três livros uma única temática: sua infância e adolescência, emolduradas pela tradição de tempo e de lugar. Os títulos das divisões da obra indicam as intenções do poeta: "Pretérito Mais-que-perfeito", "Morar nesta Casa", "Notícias de Clã", "Primeiro Colégio", "Mocidade Solta", etc.
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Mas nem só do curitibano Simões ou nacional Drummond, vive a poesia - pois livros de poetas surgem diariamente. Como também obras reunindo "poemas" de outros gigantes da palavra, o maranhense Ferreira Gullar, de quem a José Olimpio lança "Toda Poesia" (452 páginas, Cz$ 220,00), uma antologia que possibilita se ver a grandeza deste nordestino rijo e lírico, 57 anos - (a serem completados no dia 10 de setembro) e que a partir de "A luta corporal" (1954), abriu caminho para a poesia concreta, do qual participou inicialmente e com a qual rompeu para, em 1959, organizar e liderar o grupo neo-concretista cujo manifesto redigiu e cujas idéias fundamentais expressou num ensaio famoso: "Teoria do não objeto". Em 1961, após ter levado suas experiências poéticas às últimas conseqüências, voltou-se a cultura popular, integrando-se ao CPC da UNE, do qual era presidente quando houve o golpe de 1º de abril. A partir de 1962, a poesia de Gullar reflete a necessidade moral de lutar contra a injustiça social e a opressão. Seus versos são claros, críticos e sinceros. Gullar, como dos dizia quando de sua última passagem por Curitiba, se interessa pelo "que é verdadeiro".
"Toda Poesia" reúne os seguintes livros: "A Luta Corporal" (1050/1953), "O Vil Metal" (1954/60), "Poemas Concretos/ Neoconcretos" (1957/1958), "Romances de Cordel" (1962/1967), "Dentro da Noite Veloz" (1962/1975), "Poema Sujo" (1975) e "Na Vertigem do Dia" (1975/1980).
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A mesma José Olympio que traz "Toda Poesia" de Gullar, apresenta um novo poeta: Sylvio de Oliveira, em "Amoressencia" (118 páginas, Cz$ 45,00). Um poeta romântico, tanto é que subintitulou seu livro de "Poemas de amor". E que admite, francamente:
- "É difícil falar de amor. Mais difícil ainda é escrever sobre eles, cirando imagens novas, seduzindo o leitor para um convívio delicado com as entranhas do texto, fazendo bater um coração, hoje em dia, sempre apressado."
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Outro novo poeta que aparece é Gastão Castro Neto, 24 anos, que lança "Materia Mater" (Editora Anima, 96 páginas). Poeta, desenhista, músico, com vivência nos EUA, Gastão estreou em 1978 com "Moderna Carpintaria", seguindo-se "Plenitude Relativa". Sobre "Matéria Mater", diz:
- "É um livro lírico que mostra uma consciência, até certo ponto sofrida do que é o EU, do que é o EU do poeta, o EU lírico. EUA que é ao mesmo tempo um EU, dramático. É um livro que mescla às vivências da rua, encontros, desencontros, com certas reminiscências."
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