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Aramis

Uma noite tranquila na festa do Oscar

Ao contrário dos anos anteriores a 52ª Festa de Entrega do Oscar, realizada na noite de segunda-feira, no Pavilhão Dorothy Chandler, Los Angeles - e que transmitida via satélite, com imagens da ABC, chegou a muitos países do mundo - transcorreu tranqüila, sem contestações. Ao contrário, a partir dos próprios resultados das 22 [categorias] indicadas, parece ter havido uma distribuição, que só foi desequilibrada a Francis Ford Coppola, que, com 9 indicações por seu "Apocalypse Now", deve ter ficado decepcionado com apenas dois troféus, em categorias bem técnicas: melhor som (Walter Murch/Mark Berger/Richard Beggs/Nat Boxer) e fotografia (o italiano Vittorio Soraro). Se "O Franco Atirador" (Deer Hunter) de Michael Cimini e "Amargo Regresso" (Coming Home), de Hal Hashby, levaram no ano passado vários Oscars, talvez por sensibilizarem profundamente os 3.200 membros da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, pela catarse crítica da guerra do Vietnã, a superprodução que quase levou Coppola a ruína, abordando a mesma temática, teve 9 indicações, mas perdeu em sete. Em compensação, o grande vitorioso da noite, "Kramer x Kramer" (cine Astor, 4 sessões lotadas por dia, previsão de mais um mês em exibição), provou a empatia do tema, tão atual quanto emocionante a milhões de pessoas em todo o mundo: a separação de um casal e a grande vítima do desencontro, uma criança, cuja custódia é disputada pela mãe, 18 meses após ter abandonado o pai. Os Oscars de melhor ator a Dustin Hoffman (4 vezes indicado anteriormente, mas sempre derrotado) por sua interpretação de "Ted Kramer", a melhor atriz coadjuvante a Merryl Streep pela mãe "Joanna Kramer", os dois Oscars a Robert Benton (diretor e roteiro adaptado, do romance de Avery Corman, reeditado agora pela Record) e, finalmente, melhor filme, provaram, mais uma vez, que neste final de século, ante tanto progresso tecnológico, as obras que se voltam as indagações do ser humano, da solidão de todos nós, do fracasso do relacionamento conjugal, são as que mais de perto falam não só as pessoas sensíveis, mas também aos críticos. No ano passado, foi "Uma Mulher Descasada", de Paul Mazursky, que valeu várias "nominations" - inclusive a Jill Claybyrgh (que perdeu para Jane Fonda, por "Amargo Regresso"), que voltou a concorrer novamente por "Encontros e Desencontros" ("Starting Ove", de Alan J. Pacula, ainda inédito no Brasil), Woody Allen e Marshal Brickman, pelo roteiro de "Manhattan" - outro filme sobre a solidão urbana, também mereceram indicação, aliás, a única nomination que Allen teve este ano. O fato de "Kramer x Kramer estar em exibição na cidade, lotando sessões, possibilita que se aprecie melhor os critérios dos membros da Academia de Artes e Ciências Cinematográficos de Hollywood, já que os 4 outros filmes concorrentes ao troféu máximo também são vigorosas obras: "Apocalypse Now" (que talvez venha a ser relançado no Cinema 1), "All That Jazz" (O Show Não Pode Parar), "O Vencedor" (Breaking Away) e, especialmente para nós, significativo, "Norma Rae". Se "O Show Não Pode Parar" (All That Jazz), espécie de "8 e 1/2" musical de Bob Fosse (que em 1972 conseguiu mais Oscars com "Cabaré", do que "O Poderoso Chefão", além de ter, no mesmo ano, recebido os primeiros Emmy e Tony, os troféus máximos da televisão e do teatro americano, respectivamente, por "Liz With Z" e "Peppin") outro dos favoritos, igualmente com 9 indicações, ficou com 4 Oscars, os dois concedidos a "Norma Rae" tiveram ainda um significado mais amplo. O musical-autobiográfico de Bob Fosse - premiado em cenografia (Philip Rosenberg e Tony Walton), figurino (Albert Wolsky), trilha sonora adaptada (Ralph Burns) e montagem (Alan Heim) é uma revitalização de um gênero essencialmente americano, o musical. Em compensação, "Norma Rae", de Martin Ritt - uma das vítimas do Machartismo nos anos 50 (tema que abordou há 4 anos, no excelente "Teste de Ferro Por Acaso/The Front), sem maior apelo promocional obteve várias indicações. Aos 60 anos, 24 de cinema - desde "Um Homem Tem Três Metros de Altura" (56), Ritt tem focalizado temas sociais em seus filmes, com honestidade e coragem, e mesmo não chegando ainda ao Oscar, fez com que a excelente Sally Field, a grane revelação do cinema americano nos últimos anos, concorrendo com atrizes como Jane Fonda ("Síndrome da China, já com 2 Oscars anteriores), Jill Clayburgh, Marsha Mason ("Capítulo 2: Em Busca da Felicidade") e Bette Midler ("The Rose"), merecesse o Oscar. Curiosamente, "Norma Rae", a história do despertar da consciência político-sindical de uma tecelã numa pequena cidade do Sul dos Estados Unidos, passou desapercebido em uma semana no Astor, com fraca renda. Trata-se, entretanto, de um filme dos mais importantes do ano, que, agora, com o Oscar a sua intérprete-título - e mais ao de melhor canção ("It Goes Like It Goes", de David Shire/-Norman Gimbel, na festa do Oscar cantada por Dionne Warwick) mereça um relançamento. Se em nenhum momento houve contestação política na festa, ao menos os dois Oscars concedidos a "Norma Rae", - que concorria também a melhor filme e roteiro adaptado (Irving Ravetche e Harrie Frank Jr.) valeram, mesmo que de leve, como uma manifestação social entre o glamour, cores, danças e músicas desta 52ª edição de uma festa tão polêmica e discutida, quanto significativa em termos promocionais para a indústria cinematográfica. Se Melvyn Douglas não fosse um ator tão admirável, já tendo merecido há 17 anos um Oscar de melhor coadjuvante por "Hud, O Indomado" (63, de Martin Ritt) e, em 1970, a indicação ao de melhor ator por "Meu Pai, Um Estranho" (I Never Sang for My Father, de Gilbert Gates), poderia-se até achar que houve injustiça, pois ainda sendo inédito "Being There", de Hal Hashby), que lhe valeu agora seu 2º Oscar de coadjuvante, muitos tinham como certo a ida deste troféu a Robert Duvall, que por sua curta - mas inesquecível atuação em "Apocalypse Now" (o militar que arrasa uma aldeia vietnamita para que [seus] homens possam praticar surf) - também concorria ao prêmio, junto com o veteraníssimo Mickey Rooney ("O Corcel Negro", o garoto Justin Henry (o Billy de "Kramer x Kramer") e o (ainda) desconhecido Frederik Forrest (que aparece em "The Rose", cinebiografia de Janis Joplin). Se há alguns meses apareceram denúncias, formuladas pela romancista Françoise Sagan, presidente do Festival de Cannes-79, em relação a pressão que houve para dividir a "Palma de Ouro" entre "Apocalypse Now" e "O Tambor", do alemão Volker Schlondorff, o fato desta produção da República Federal da Alemanha, ter recebido o Oscar de melhor filme estrangeiro (derrotando filmes como "Mamãe Faz Cem Anos" de Carlos Saura e "As Senhoritas de Wilko", de Adrezj Wajda), faz com que se repense no fato. Felizmente, a United Artits promete lançar em breve no Brasil o filme de Schlondorff, possibilitando que cada um faça o seu próprio juízo. Na área técnica, algumas surpresas: ninguém contava que "Alien, O Oitavo Passageiro" (8de Riddley Scott) valesse a sua equipe que criou os efeitos especiais, o troféu que todos esperavam fosse para o fascinante "Jornada nas Estrelas - o filme", já que só nesta área, foram gastos quase US$ 20 milhões. Infelizmente, muitos dos filmes premiados com o Oscar, dificilmente chegarão ao Brasil: melhor curta metragem ("Paul Robson: Tribute To na Artist"), desenho animado de curta metragem ("Every Child", produzido pelo National Filme Board of Canada) ou documentário de curta metragem ("Board And Care", de Ron Ellis e Sarah Plsbury). Já, como dois documentários de longa metragem, premiados com o Oscar anteriormente ("Corações e Mentes" e "Harlam Country") aqui chegaram, não é totalmente afastada a possibilidade do longa premiado este ano, "Best Boy", venha a ter distribuição comercial - mesmo sem muitas possibilidades comerciais. Na trilha sonora origina, a surpresa foi a premiação do compositor francês Georges Delerue por "Um Pequeno Romance" (de George Roy Hill, programado para breve no Astor), vencendo Henry Mancine ("Uma Mulher Nota 10", trilha já editada no Brasil pela WEA) e o argentino Lala Schiffrin ("O Campeão"), além do excelente trabalho que Jerry Goldsmith fez para "Jornada nas Estrelas". Como sempre, as canções que concorreram ao Oscar; intercalaram o espetáculo: logo após Johnny Carson - o mestre de cerimônia, ter aberto a festa (há 2 anos substituiu definitivamente Bob Hope, que por mais de 20 anos era o apresentador oficial), "Keamit", um dos personagens do "The Puppet Show", apresentava a ingênua "The Rainbow Connection" (Paul Willians/-Kenny Ascher) da trilha sonora para o filme que leva a tela ampla esta conhecida série de televisão. Helen Reddy e Doodley Moore interpretaram a belíssima "It's Easy To Say", de Mancine, de "10", que concorreu ao Oscar, enquanto Melissa Manchester, uma nova e bela [cantora] que começa agora a aparecer no Brasil (seu primeiro lp foi recém-.editado pela Ariola), interpretou duas canções indicadas ao Oscar, de melodramas que passaram desapercebidos em nossas telas: "Trough The Eyes of Love" (Marvin Hamlsisch/Carole Bayer Sager) de "Castelo de Gelo" e "I'll Never Say doodbye" (Fred Weintrub/Paul Heller) de "O Segredo de Uma Promessa", Dionne Warwick, tranqüila e afinada como no passado, defendeu a premiada "It Goes Like It Goes", do filme "Norma Rae". Em termos de entretenimento musical, o melhor momento foi a presença do veterano Donald O'Connor, 55 anos, gordo mais ainda ágil, cantando músicas como "Dancing On The Silver Screen", "I Only Have Eyes for You", "Check To Check", trechos de "Na American In Paris" e até o histórico "The Continental" (primeira canção premiada pela Academia, do filme "The Gay Divorcee"). Na área das premiações especiais, o Troféu Jean Hersholt de caráter humanitário, foi entregue postumamente de caráter humanitário, foi entregue postumamente a Robert Benjamin, dos fundadores da United Artits, falecido em outubro último, recebido por sua viúva das mãos de Douglas Fairbanks Jr. Richard Gere, o novo-ator sensação, 7 filmes em 3 anos e sucesso na Broadway, entregou o Oscar a Mark Seravier, filho do inventor da moviola (troféu de ciência e técnica) e o ex-presidente da Academia, o produtor Walter Mirish. Após 4 minutos em que foram mostrados cenas da evolução do cinema, reverenciou a um dos mais antigos funcionários da instituição, Hal Elias. A grande homenagem da noite foi para Alec Guinnes, 64 anos, 47 de cinema, apresentado por Dustin Hoffman, que, emocionado, falou da contribuição do ator inglês no cinema, desde 1946 ("- Grandes Esperanças") um dos favoritos de David Lean, que o dirigiu em 57, em "A Ponte do Rio Kwait", que lhe valeu o Oscar de melhor ator. Aliás, Hoffmann, que por 4 vezes concorreu ao Oscar, e nunca escondeu suas críticas a Academia, ao receber, depois, o seu troféu por "Kramer x Kramer", fez o melhor discurso da noite: lembrou que não encarava a sua escolha, como uma vitória sobre os 4 outros indicados (Jack Lemmon por "A Síndrome da China", Al Pacino por "Justiça Para Todos", Roy Scheider por "All That Jazz" e "Peter Sellers" por "Being There")., mas, considerando a existência de 60 mil atores nos EUA, de certa forma, dividia com eles, o troféu que levou tanto tempo para lhe chegar às mãos.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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Tablóide
10
16/10/1980

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