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Aramis

Faltou melhor sabor no bolo dos 60 anos do titio Oscar

As aventuras da Enterprise em seu segundo longa-metragem na série cinematográfica da "Jornada nas Estrelas" - na tela quente para tentar roubar a audiência do Veja o Gordo fez com que a transmissão da 60ª festa de entrega dos Oscars não acontecesse ao vivo - mas sim pré-gravada e já com alguns cortes. Com isto, evitou-se ter que aguentar aquelas piadinhas típicas para americano rir mas que não tiram nem sorriso amarelo abaixo do Rio Grande - como fez por mais de 30 anos o eterno sorridente Bob Hope, substituído depois por Jack Carson e, nos últimos três anos a cargo do insonso [insosso] Chevy Chase, que apesar de toda a mídia que a festa do Oscar tem ainda não emplacou em termos de popularidade nas telas. Ao menos no Brasil. Enxugada, assim, em sua abertura - mas que também podou algumas informações adicionais, além do desfile dos superstars que chegavam para a festa no Shrine Civic Auditorium - a produção da festa, que tem uma das maiores (se não a maior) audiência do mundo, perdeu muito de seu charme - o que aliás vem acontecendo de ano para ano. Sem maiores protestos, escandalosos ou mesmo grandes encenações musicais, o titio Oscar mostra que a senilidade o ameaça, justamente agora que se tornou um produto de marketing tão comercializado em todo o mundo. Dirigido no passado por grandes nomes do cinema e da Broadway, que, ano a ano, esforçavam-se em superar a festa do ano anterior, em termos de luxo e cores, a condução foi fria, com os apresentadores sucedendo-se monotonamente e, a grande atração que sempre foram as músicas concorrentes, compactadas num único bloco. O que, ao menos serviu para compensar a mediocridade das canções indicadas, pois nunca a seleção foi tão fraca. Tanto é que os apresentadores, Liza Minelli e Dudley Moore (além de ator, bom pianista), que juntos acabam de fazer "Arthur's II", foram melhor fazendo a canção introdutória às indicações - do que as próprias concorrentes. Liza nos vocais, segura e charmosa como sempre, Dudley Moore, ao piano, só interromperam esta fórmula para a introdução de "Cry Freedom", de George Fenton e Jonas Guangwa, "Um Grito de Liberdade" - que com uma letra de forte sentido social, mereceria ter levado a premiação. Mas qual o quê! O Oscar de melhor canção foi para a insossa e medíocre "(I've Had) The Time of My Life", de "Dirty Dancing - Ritmo Louco", um dos piores filmes do ano mas que tem agradado ao público adolescente. Mas para uma instituição que, por décadas, premiava compositores do nível de Henry Mancini, Michel Legrand, Adolph Deutsch, Richard Rodgers, Cole Porter e tantos outros, não deixa de ser (mais uma) significativa mostra de decadência. Aliás, o fato de "Hope and Glory" não ter sido indicada nem como tema-canção ou na trilha original já foi significativo. E na premiação do escore, por mais méritos que o trabalho que o japonês Ryuichi Sakamoto, o chinês Cong Su e o americano David Byrne fizeram para "O Último Imperador" (trilha sendo lançada esta semana pela Barclay), não se compara à magnífica trilha de John Williams, aliás, concorreu (e perdeu) duplamente: por "The Empire of Sun" e "As Bruxas de Eastwick". xxx Sem grandes produções na área musical e conduzido de maneira quase fria, o melhor da festa do Oscar foram algumas montagens com filmes ligados aos seus 60 anos de existência. Entretanto também nisto a produção pisou na bola: um aturdido Charton Heston, 66 anos, convocado para introduzir este segmento, pouco disse em torno das imagens que procuravam mostrar alguns dos grandes momentos da festa - desde suas primeiras edições, quando se realizava em torno de mesas de banquetes no Hollywwod Roosevelt Hotel ou Biltemore Hotel (1924/1943), passando para o luxuoso Gruman's Chinese Theatre, inaugurado em março de 1944 - e no qual aconteceram apenas três edições. Há 41 anos, quando "A Luz é para Todos" (Gentlemen's Agreement), era escolhido o melhor filme e dava ao seu diretor, Elia Kazan, o seu primeiro Oscar, a festa acontecia no Shrine Civic Auditorium - mesmo espaço, só que hoje ampliado e modernizado, para o qual a festa voltou agora. Em 1949, a festa da noite de 24 de março, foi na Academy Award Theatre - mas que não se ajustou. Tanto é que nos 11 anos seguintes seria realizada no RKO Pantages Theatre. Entre 1961 a 1967 passou para o Santa Monic Civic Auditorium e, em 14 de abril de 1969, se instalou no Dorothy Chandler Pavilion, de onde só mudaria este ano. Nesta trajetória de diferentes auditórios - sempre imensos, luxuosos e com condições de abrigar produções cada vez mais audaciosas (e que fizeram escolas para festas & festivais em todo o mundo), o Oscar colecionou imagens que, naturalmente, sempre trazem um frissom de emoção ao serem projetadas na tela ampla onde se realiza - e reproduzidas em vídeos de cinemaníacos espalhados por todo o mundo. Por exemplo, antecedendo a entrada de uma linda e elegante senhora chamada Olivia de Haviland, 72 anos a serem completados no próximo dia 1º de julho, convidada a anunciar o vencedor da categoria de direção de arte, houve uma viagem no tempo com suas imagens em filmes como "Sonhos de uma Noite de Verão", "As Aventuras de Robin Hood", "Só Resta uma Lágrima" (que lhe valeu o primeiro Oscar), "Tarde Demais" e, naturalmente "E o Vento Levou". Sempre bem informado, Rubens Ewald Filho, com comentários ajustados na transmissão, dizia que, na platéia do Shrine Civic Auditorium estava sua irmã, a também atriz Joan Fontaine, 71 anos, sua inimiga fidagal [figadal] há mais de três décadas. (Qualquer semelhança com "O que Aconteceu com Baby Jane?" não é mera coincidência). Um dos atores favoritos de Billy Wilder, Jack Lemmon, 63 anos, teve a alegria de apresentar o próprio Wilder, 82 anos, 21 indicações e por seis vezes premiado com o Oscar, que mereceu, este ano o troféu Irving C. Thalberg. Forte, rijo e objetivo, o mestre do cinema sofisticado, tão marcante no drama quanto na comédia, austríaco que fugiu do nazismo no início dos anos 30, contou uma história emocionante: em 1934, tendo chegado há pouco nos Estados Unidos, o seu visto de permanência exigia uma renovação. Como não tinha maior documentação procurou o consulado americano no Mexicali, a cidade do México mais próxima da Califórnia. Ali, em seu inglês imperfeito expôs ao diplomata a sua necessidade de ficar nos EUA. As dúvidas do cônsul pararam quando ele declarou sua profissão - "eu escrevo filmes". O cônsul carimbou o passaporte e lhe disse: "Então tente fazer bons filmes". Comentário de Billy, encerrando seu discurso: - E eu venho tentando fazer isto há 54 anos. Aplausos em pé, de uma platéia repleta de superstars - (por sinal pouco focalizadas pelas câmeras) mereceram, além de Olívia de Havilland e Billy Wilder, também Gregory Peck, 73 anos, e Audrey Hepburn, 59, rememorados, numa das mais deliciosas seqüências de "A Princesa e o Plebeu" (Roman Holiday, 53, de William Wyler). Falaram da importância do roteiro e anunciaram os vencedores nestas categorias: Bernardo Bertolucci e seu cunhado, Mark People, por "O Último Imperador", como roteiro adaptado e John Patrick Shanley por "Feitiço da Lua". Merecidos? A roteiro adaptado concorriam, entre outros, Stanely Kubrick (por sinal, nunca premiado pela Academia) com "Nascido para Matar" e Tony Huston, por "Os Mortos" (último filme de John Huston, do conto de James Joyce). Na categoria de roteiro original, Woody Allen, com "A Era do Rádio" - (outro dos filmes injustiçados: concorreu também na categoria da direção de arte mas não teve premiação). Robbie Williams, ator ainda pouco conhecido (fez "Popeye", de Robert Altman, e concorreu este ano como melhor ator por "Bom dia, Vietnã", que a Warner lança em maio), foi quem fez apresentação do melhor diretor. Deu Bernardo Bertolucci, é claro! O cineasta italiano já havia tido indicações em 1971, como roteirista por "O Conformista" (perdeu para Ernest Tidyman, por "Conexão Francesa", de William Friedkim) e, como diretor em 73, por "O Último Tango em Paris" (perdeu para George Roy Hill, por "Um Golpe de Mestre"). Agora teve a sua noite de glória. Poderia ter sido um banquete inesquecível de imagens. Merecido, aliás, para uma festa que em seus 15 primeiros anos era ao longo de jantares hollywoodianos. Mas, nos tempos de mídia eletrônica e robotização (um dos momentos divertidos foi o duelo entre o Robcop e um vilão que "ameaçava" o ator Pee Wee Hewrmann, popularíssimo nos EUA e Europa, mas totalmente desconhecido no Brasil), o bolo servido para a festa dos 60 anos de titio Oscar acabou falhando em seus ingredientes, e no sabor especial que se esperava nesta data redonda. Não faz mal, em 1989 tem replay... LEGENDA FOTO - O grande injustiçado: "Império do Sol", de Steven Spielberg, com o garoto Christian Bale, mereceria indicações a melhor filme e direção. Ganhou nominações as categorias de trilha sonora, fotografia, figurinos, montagem e som. E perdeu em todas para "O Último Imperador". Mas o filme em exibição no Cinema I/Astor está fazendo a maior renda do ano.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
13/04/1988

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