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Aramis

30 anos sem Carmen

Aquela que foi, talvez, a maior sambista do Brasil, não nasceu no Brasil. Mas, como escreveu Marquês Rebelo, há 30 anos passados, quando da chegada do corpo de Carmen Miranda, falecida em Los Angeles, a 5 de agosto de 1955, "é como se tivesse nascido, pois nasceu em Portugal". Há 30 anos morria Carmen Miranda. Coincidentemente, 20 anos antes - 1935 - pela primeira vez ela deixava o Brasil, para uma excursão internacional. Quem a contratou - do mesmo modo que a Francisco Alves e Josué de Barros, foi o dono do cinema Broadway, de Buenos Aires. Josué de Barros - já que falamos nele - tinha sido uma figura decisiva na carreira de artista. Compositor e violonista dos mais inspirados, foi o primeiro a entusiasmar-se com a musicalidade da jovem portuguesa, que, na época em que ele a conheceu, tinha apenas 19 anos de idade e era caixeira de uma loja de chapéus, no Rio. Para evitar confusões, esclareça-se: Carmen na verdade chamava-se Maria do Carmo Miranda Cunha e nasceu em Marco de Canavezes, Portugal, a 9 de fevereiro de 1909. Filha de José Maria Pinto da Cunha e dona Maria Emília Miranda da Cunha, chegou ao Brasil com apenas um ano de idade, sendo educada no colégio das religiosas de Santa Teresa. A PRENDADA JOVEM Sejamos biográficos, com bases nas pesquisas que Ary Vasconcelos fez há muitos anos. Carmen - ou Maria do Carmo - revelou desde cedo um jeito extraordinário para cantar, fazendo-o com muita graça e personalidade nas festas escolares. Mas seu pai, homem de muito senso prático, barbeiro de profissão, contrariou logo essa tendência. Ser artista naquela época - segunda década do século - era a pior recomendação que alguém poderia apresentar. Encaminhou-a no comércio, arranjando-lhe um emprego em uma oficina de chapéus femininos. E talvez Carmen tivesse permanecido chapeleira por muitos anos se um destino, inteiramente diverso, não tivesse batido à porta de seu modesto quarto, na casa da Travessa do Comércio. O DESTINO BATE À SUA PORTA Aconteceu em 1928. O deputado baiano Aníbal Duarte encarregara Josué de Barros de organizar uma festa de caridade no Instituto Nacional de Música. E, quando se aproximava o dia da festa, o próprio Aníbal Duarte disse a Josué: "Olhe, conheço uma garota que sabe cantar e gostaria que V. a ouvisse. Ninguém acredita na menina. Mas eu aposto em seu talento". Foi marcado um encontro à noite, embaixo do relógio da Galeria Cruzeiro - palco de tantos fatos da história da MPB. Josué levou o violão. Quando ele chegou, Carmen - na beleza de seus 19 anos - estava à espera. Horas mais tarde, na residência de um embaixador na Lagoa Rodrigo de Freitas, Carmen desfilava tangos ("Garufa", "Mama, Yo Quiero un Novio"), toadas ("Chora, Violão") e até o "Linda Flor", de Henrique Vogeler. Deste dia em diante, pela mão de Josué, Carmen começaria sua carreira. Seu primeiro disco na Victor trazia duas composições de Josué de Barros: "Triste Jandaia" e "Dona Balbina". A estréia em rádio também foi um êxito, tendo ela apresentado outra composição de Josué - "Ia-Ioio". Em 1930, com "P'ra Você Gostar de Mim" ("Tai"), de Joubert de Carvalho, tornou-se um nome nacional. Raimundo Magalhães Júnior, então repórter de "A Vida Doméstica" - uma espécie de "Cláudia"para nossas avós - lhe dedicou matéria de capa. Em 1935 foi à Argentina, viajando em companhia da vigilante mamãe, dona Maria Emília. Carmen estava com a corda toda, lançando músicas como "Good Bye Boy", "Camisa Listada", "Uva de Caminhão", "Recenseamento"- todas de Assis Valente (1911-1958) protético e compositor, que, consta, apaixonado por Carmen, acabou cometendo suicídio anos depois, quando ela já morava nos EUA. NEW YORK, NEM YORK Exatamente a 4 de maio de 1939, Carmen cantava no Cassino da Urca e ali foi ouvida pelo empresário norte-americano Lee Schubert que, entusiasmado, convidou-a a fazer uma excursão aos Estados Unidos. Carmen aceitou, exigindo porém que o Bando da Lua - liderado por Aloísio de Oliveira - a acompanhasse. A estréia de Carmen em Nova Iorque aconteceu na Broadway, no Teatro Broadhurst na arevista "Strets of Paris". Do grandioso elenco, participava, também o chanssonier Jean Sablon, o tenor Ramon Vinay e os então principantes Bud Abbott e Lou Costello. Carmen fazia o final do primeiro ato, cativando o público com seus trejeitos e vivacidade de cantar. Para isto contava muito o apoio do ótimo Bando da Lua - que na época era formado por Aloysio de Oliveira (violão e crooner), Hélio Pereira (violão), Ivo Astolfi (violão - tenor), Stênio Osório (cavaquinho), Afonso Osório (tã-tã) e Osvaldo Ebol (pandeiro). Depois da temporada na Broadway, Carmen e o Bando da Lua foram a Los Angeles - participando de um filme de sucesso intitulado "Serenata Tropical", da Fox - ao lado de Betty Grable, Don Ameche e Fortunio Bonanova. Fizeram ainda programas radiofônicos famosos e gravaram alguns discos (então 78 rpm) na Decca (hoje MCA). Na volta ao Brasil, em 1940 - após um ano de EUA - Carmen foi recebida com críticas - o que a levou a gravar o samba especialmente composto para ela por Vicente Paiva - Luis Peixoto: "Disseram Que Voltei Americanizada". Na verdade, a imagem que os empresários exigiram de Carmen foi da personificação estilizada de baiana. Mais adiante - como acentuou o pesquisador João Luis Ferreti - "iriam transformá-la em "artigo de consumo", lançando, nos EUA, "turbante à la miranda", "colares à la miranda" e tudo o mais que se possa imaginar tirado da imagem que se projetara". O fascínio americano a havia conquistado e no mesmo ano ela voltaria para Los Angeles - onde faria longa carreira no cinema. Só em 1954, Carmen Miranda retornaria ao Brasil, já então como ["Ídolo"] internacional. Mas muito abatida, consumida por medicamentos que pretendiam mantê-la em forma, e dando a todos que a reencontraram a sensação de penúria física e espiritual. Milionária (tinha ações em companhia petrolífera do Texas), tinha luxuosa casa em Palm Springs. Ficou pouco tempo no Rio. Voltou para morrer seis meses mais tarde, a 5 de agosto de 1955, horas após ensaiar com Jimmy [durante] uma dança para o seu próximo show de TV. Tinha apenas 46 anos, que completara em 2 de fevereiro. LEGENDA FOTO 1 - Há 30 anos morria a mais brasileira das portuguesas. LEGENDA FOTO 2 - Carmen Miranda no auge da fama e da glória.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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04/08/1985

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