As artes gráficas do internacional Miran
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 15 de dezembro de 1987
"Para mim, o especial do talento de Miranda é a sua cabeça inventiva, sua disposição de aventurar e sua magistral habilidade gráfica. Mas é particularmente raro encontrar alguém que possa deslumbrar com o desenho sem ofuscar o significado·" (Herbert Lubalin, mestre do designer, falecido em 24 de maio de 1981)
Sem maiores introduções, tendo na primeira página um anúncio do Bamerindus cujo texto de Eloy Zanetti, na época diretor da Umuarama, apresentava uma nova publicação "que tem a virtude de abrir um importante espaço cultural, permitindo a livre manifestação de tendências e estilos diversos", há quatro anos circulava o número um da revista "Gráfica". Com capa e material principal dedicada a José Zaragosa (o "Z", de uma das mais famosas agências do País), a revista nascia com uma linha definida: fazer uma publicação voltada a diretor de arte, ilustradores, programadores visuais e tipógrafos contemporâneos.
Em formato 25 x 25 centímetros, papel de primeira qualidade, lombada, a revista impressionava mas o eterno pessimismo fazia prever vida curta. O que não aconteceu. Neste mês, seu idealizador e editor, Miran (Oswaldo Miranda, 39 anos, paranaense de Paranaguá, com lançamento de nada menos que dois números - o 16 e o 17 - comemora o quarto aniversário da publicação, fazendo, inclusive, uma exposição dos originais belíssimos apresentados nestes 18 números - que inaugura o mezanino do Bavarium Park (avenida Mateus Leme), na próxima segunda-feira.
Se tivesse encontrado patrocínio, Miran também comemoraria esta efeméride com a grande exposição de trabalhos de Saul Bass, um dos maiores nomes do designer mundial, famoso por ter renovado a apresentação de filmes americanos (especialmente os de Otto Preminger e Alfred Hitchcook), e que, seu amigo (sem conhecê-lo pessoalmente) e admirador do seu talento, há, mais de um ano já lhe remeteu material fantástico - incluindo cartazes que valem mais de US$ 20 mil e vídeos com alguns de seus trabalhos para o cinema. Mas a exposição de Saul Bass fica para 1988, a ser desenvolvida com o capricho e esmero que caracteriza tudo que Miran realiza. Para a mostra retrospectiva dos quatro anos de "Gráfica" há material de sobra.
O talento internacional - Pode-se dizer, hoje, que Oswaldo Miranda é um dos nomes internacionais da arte brasileira, em termos de comunicação visual, grafismo e designer. Se no Brasil, nos meios publicitários e de comunicação, há muito que já passou a ser reconhecido em seu talento e criatividade, internacionalmente tem um currículo alcançado por pouquíssimo profissionais.
Editado nas mais conceituadas publicações de artes gráficas como Graphis, Graphis Posters, Gebrauchsgraphik, Modern Publicity, Letter heads anual, 1/2/6/7/8 Illustrators, 20/23, Creativity , artigos especiais no UL & C (dezembro/80), Graphis 210 (janeiro 81) Mirandinha tem um portfolio que ocupa vários volumes.
Aliás, não foi fácil selecionar os trabalhos para o belíssimo livro "Miran" - 20 Anos de Desenho Gráfico (Secretaria da Cultura/Metal Leve/Bamerindus, 1250 exemplares), idealizado ainda na gestão da professora Suzana Munhoz da Rocha Guimarães, na Cultura, mas que só ficou pronto há poucos meses. O trabalho de Miran é tão notável que já tem os fotolitos para um segundo volume, que completará estas suas duas décadas de criação visual.
Com mais de 300 prêmios obtidos no Brasil, incluindo 23 medalhas de ouro e 20 de prata pelo Clube de Criação de São Paulo, e o reconhecimento internacional de seu trabalho, não foi sem razão que conseguiu estabelecer contatos com os maiores nomes das artes gráficas. Explica:
-Sempre fui tímido e tive dificuldades de me relacionar ao vivo. Entretanto sou um bom correspondente. Pouco a pouco, fui enviando meus trabalhos gráficos para os nomes que mais admirava nos Estados Unidos e Europa. As respostas vieram e com ajuda de um amigo que conhece inglês profundamente mantive a correspondência e, pouco a pouco os laços se solidificaram.
Miran passou a ser aceito em fechados clubes de criadores gráficos - como Type Club e Society of Publication Designers - e estimulado por Eloy Zanetti, então na Umuarama (hoje produtor cultural independente), começou a expor na Acaiaca, por três anos, uma síntese dos melhores trabalhos que recebia de mestres como Milton Glasser, Saul Bass, Herber Lubalin e outros mestres. Em sua modéstia, explica:
- Eram exposições restritas. Achei, então, que deveria tornar mais conhecidos estes trabalhos maravilhosos. E nasceu a "Gráfica".
A periodicidade que Miran consegue com a "Gráfica" - sem favor, a mais sofisticada publicação da imprensa brasileira e que se ombreia a poucas revistas congêneres no mundo - veio provar não só o talento de Miran, mas o alto nível de nossa indústria gráfica. Os doze primeiros números foram impressos na Kingraf, passando depois para uma nova indústria - a Águia. Se no início do século, a imigração alemã já trouxe para Curitiba um notável know-how nas artes gráficas - tema de um dos mais interessantes livros do professor Newton Carneiro (1917-1987), com a revista "Gráfica", Miran exportou para o mundo esta qualidade industrial de nossos profissionais, nem sempre reconhecidos.
A frase é comum, mas se repete sempre que alguém folheia pela primeira vez a "Gráfica":
- Mas esta revista é totalmente feita em Curitiba?
É. Laconicamente diz, com orgulho, seu editor Miran, que pessoalmente escolhe os assuntos, faz a seleção, diagrama e acompanha o processo industrial. Um perfeccionista, sem dúvida, mas a responsabilidade é total e os exemplares desta revista - tiragem ao redor de mil exemplares, às vezes menos (como o número 15/16 dedicado a Saul Bass, com apenas 600 unidades) chegam nas mãos dos maiores especialistas em artes visuais do mundo, homens (e algumas mulheres) acostumados a trabalhar com o melhor do melhor da qualidade visual. E cujos elogios só tem crescido a cada edição.
Aberto aos criadores de todo o mundo, Miran dá, naturalmente, especial atenção aos brasileiros e , "sempre que possível" aos paranaenses.
O número 17, que circula na próxima segunda-feira, tem ao lado de fantásticos desenhos do americano Milton Glaser, uma seção especial para as criações do curitibano Bira Menezes e várias páginas para as fotografias de Nêgo Miranda. O número 18, também previsto para sair na próxima semana, embora dedicado basicamente à arte de Ferenc Pinter, não esquece de destacar as fotografias coloridas de Lair Leonir, catarinense de Camboriú, que com patrocínio do Boticário já expôs até em Paris.
Miran tem hoje contatos com cerca de 40 designeres do primeiro time em várias partes do mundo. Na Alemanha, um de seus grandes amigos é o professor Olaf Leu, que o apresentou no prefácio no livro "Miran: 20 anos de desenho gráfico", dizendo:
"Seu estilo jovial que rapidamente se converte em refinado, certamente apresenta um aspecto que merece ser imitado: Miranda toma os fatores conhecidos que já se encontravam bem ordenados e catalogados em nossas mentes e agita para dar vazão a partir do pensamento conhecido, abrindo um espaço com possibilidades ilimitadas, é realmente algo digno de um mestre como o Miranda, aliás, Miran."
Se com os americanos, alemães e italianos os contatos foram rápidos, com os ingleses - apesar de mútua admiração -, a permuta ainda não se solidificou. Miran entende:
-Eles são reservados por natureza. Mas aos poucos a gente se aproxima.
Quatro viagens a Nova Iorque, com visitas a alguns dos estúdios mais famosos, contrato com a Clipper, que vem colocando seus trabalhos internacionalmente e já tendo realizado serviços para a Cantoon, da República Federal da Alemanha (cujo setor de comunicação visual é dirigida por Christopher Gassner, um mestre), Miran nunca pensou em morar no Exterior. Nem de Curitiba ele quer sair - apesar de propostas das mais tentadoras -, não faltarem. Em sua confortável casa-estúdio na Avenida Centenário, trabalhando sozinho, nas horas mais inusitadas, cria marcas, símbolos, pôster, anúncios, desenvolve programações, faz um mundo mágico de cores e formas, que lhe deram um reconhecimento internacional. A mesma timidez de quando chegou a Curitiba, há mais de 30 anos, e o esmero de um ourives na elaboração de cada peça. Este é o Miran, um artista de cabeça inventiva, que sem ter conhecido pessoalmente a Herber Lubalin, ganhou dele um entusiástico texto na publicação especializada "U&LC", no qual o mestre americano dizia:
- Para mim, o especial talento de Miranda é a sua cabeça inventiva, sua disposição de aventurar a sua magistral habilidade gráfica. O modo como ele manipula o uso do espaço, seu senso de escala, sua padronização em preto-e-branco - tudo isso consegue parar você de repente na sua estrada; então, as figuras positivamente sinalizadas telegrafam a mensagem. É tudo visual. Tanto quanto eu entendo, o trabalho de Miranda não precisa de tradução, embora seja óbvio que minha carta para ele precise.
LEGENDA FOTO: Oswaldo Miranda, o Miran
Enviar novo comentário