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Aramis

Crianças, marketing & consumo

UMA revelação feita pelo flautista Altamiro Carrilho, domingo passado, na gravação de um depoimento: foi ele quem, há 20 anos passados, teve a idéia de transformar um palhaço, de grande popularidade junto as platéias infantis, em cantor. O resultado foi que a partir de "O Bom Menino" (do próprio Altamiro), Carequinha tornou-se num dos maiores vendedores de discos da fábrica Copacabana. Ali fez 16 elepês, todos com canções infantis que até hoje se mantém em catálogo. Como Carequinha, muitos artistas descobriram na infância um mercado amplo, seguro e, principalmente renovável. Hoje a criança é, antes de tudo, o mais eficiente ponto de vendas. E com isto, os horários matutinos e vespertinos na televisão tornam-se altamente rentáveis em termos publicitários, pois atingem um público com alto poder de persuasão (e influência) nas compras. Basta acompanhar a programação dos vários canais para sentir esta realidade. xxx Assim, um grupo de estudantes de economia da Universidade Federal teve uma interessante idéia neste mês: propor ao professor da cadeira de marketing efetuar um estudo sobre as relações da publicidade e o público infantil, especialmente a utilização da criança como ponto de vendas. A época para esta pesquisa não poderia ser mais oportuna: em Outubro, no pleno mês da criança, data que como todas as demais. Mãe, Pais, Avo, Sogra, etc. é nada mais do que um referencial de vendas, dentro das frias regras do marketing promocional. xxx Este ano, houve uma multiplicidade de lançamentos destinados ao público infantil: a Estrela colocou novas atrações nas lojas, através de boa campanha promocional da Gang, sua eficiente agência de publicidade; fábricas menores disputam restos do mercado, enquanto editoras e gravadoras também vendo, cada vez com maior interesse o sempre crescente público. Abril Cultural reservou uma boa verba promocional para a reedição das "Histórias Infantis" de Walt Disney, já com seu segundo número na praça e a Continental criou um novo selo, o Corujinha - e um novo personagem - o Palhaço Pimpão. xxx A propósito da Continental, aliás, destaque-se que esta é a fábrica de discos que há mais tempo se preocupa em oferecer produções de nível dedicado ao público infantil. Há quase 30 anos, quando o compositor João de Barro assumiu sua direção artística sentiu a falta de gravações para crianças e começou a adaptar estórias famosas, com músicas bem ao estilo brasileiro. Convocou um dos mais talentosos maestros e arranjadores que há no Brasil, o gaúcho Radamés Gnatalli e o resultado foi uma coleção de dezenas de títulos, até hoje em catálogo - e sempre vendendo bem. Paulo Tapajós, hoje na presidência da Associação de Pesquisadores da MPB, na época formando ao lado de Albertinho Fortuna e Nuno Roland o Trio Melodia, não só gravou a parte musical de muitas destes discos, como também produziu alguns outros, inclusive criando um [selo], o Carrrossel, hoje pertencente a Companhia Independente de Discos, da família Zuckermann. xxx O mercado é tão amplo e oferece tamanhas possibilidades de comercialização, que a Sigla/Som Livre, da Rede Globo, também decidiu concorrer. E está fazendo os primeiros lançamentos de uma série de projetos, um dos quais dos mais estimulantes, com orientação de Egberto Gismonti, na parte musical e Marilda Pedroso (esposa do escritor Bráulio Pedroso) na criação dos textos - visando a criação de heróis nacionais, de pé no chão, com gosto no Brasil - sem alienação dos personagens importados. A nova série da Continental - para ampliar o acervo das antigas produções de João de Barro - lança o Palhaço Pimpão, que em seu primeiro disquinho recria várias cantigas de roda "Pai Francisco" "Carrocinha Pegou", "Marcha Soldado" e "Atirei o Pau no Gato". E falando em cantigas de roda, neste aspecto está justamente o maior oportunismo do mercado: Aproveitando a moda da discotheque ("Os Embalos de Sábado à Noite" há 14 semanas em exibição na cidade; "Grease/Nos Tempos da Brilhantina" com lançamento nacional na próxima semana), canções de roda infantis estão sendo adaptadas para o público infantil: "Disco Baby", da Copacabana, abriu o caminho e a RCA Victor já entrou no mercado, com lançamento superpromovido, vendido maciçamente. Enfim, a criança não é mais encanto e pureza. E apenas um produto de consumo. Afinal, os papais e mamães estão aí para atender os seus pedidos e vontades.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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Tablóide
4
12/10/1978

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