Login do usuário

Aramis

Curitiba grafitti na saudade daqueles meninos dos anos 60

A juventude, este país maravilhoso que todos nós habitamos um dia, adquire, com a chegada da meia idade, o sabor caleidoscópico de uma viagem maravilhosa. Centenas de obras - em livros, teatro e, especificamente, cinema - procuram capturar o mágico pássaro da juventude - na tão feliz expressão de Teenessee Willians - e não há adulto que não se emocione quando vê na tela estórias de grupos de amigos, de uma determinada época - seja num verão de 42 como no clássico filme de Robert Mulligam ou na curtição dos anos 60 em "American Grafitti", de George Lucas, um entre tantos painéis voltados a retratar anseios, sonhos e desilusões de uma geração. Assim, a cada final de ano, mesmo sem a plasticidade das imagens ou a dramaticidade de um texto, há, no mínimo, a tradição de reencontros de "turmas". Tudo é motivo para jantares de (re)confraternização - 10, 15, 30 anos de formatura do ginásio, do curso superior que fizeram ou mesmo de um determinado espaço ocupado em comum. Os donos de restaurantes é que esfregam a mão de satisfação com estas iniciativas - pois significa casas lotadas durante todas as noites de dezembro. Há reuniões curiosas - que espontaneamente agrupam não colegas de uma mesma classe acadêmica, mas de um determinado espaço físico. É o caso da "Turma do Ouro Verde" - que já vem sendo realizada há uma década e que reaproximou aqueles rapazes de classe média superior que, no final dos anos 50 e início da década de 60, defronte ao saudoso Café Ouro Verde, na esquina da Avenida Luiz Xavier com a Rua Ébano Pereira - constituíam o terror para muitas mães e os sonhos de jovens donzelas (algumas nem tanto) apaixonadas pelos garbosos rebeldes, que influenciados pelos ídolos Marlon Brando e James Dean, desfilavam sua macheza em "aprontações" para movimentar os embalos noturnos. Mas a cidade não tinha apenas a "Turma do Ouro Verde". Duas dezenas de quadras adiante, existia outra turma igualmente unida - a da "Praça Espanha", figadais rivais - especialmente porque ambas buscavam uma mesma trilha: os corações (e algo mais) das alunas do Colégio Sion. Com a vantagem de que a da Praça Espanha estava bem mais próxima do tradicional colégio religioso. xxx Passadas mais de três décadas do período áureo da Turma da Praça Espanha, os seus integrantes - hoje, como os da turma Ouro Verde - circunspectos pais de família, cidadões ajustadíssimos nas mais diversas atividades - decidiram também reunir-se. Uma senhora, Maria Teresa Kmieck, que nunca participou da fase de ouro da Praça Espanha - mas que, no interior de São Paulo, Piraju, acabou casando com um dos líderes daquele pedaço, Mário Kmieck ("Nano"), foi quem acabou coordenando o reencontro da turma - uma nostálgica festa acontecida na última sexta-feira, 7, no restaurante Rancho do Vale - com muitas piadas, abraços, danças e até troca de presentes na base do amigo invisível. Preocupada pelo fato de que seu marido, Nano, voltando a morar em Curitiba após trabalhar por mais de 20 anos em São Paulo - onde se aposentou como técnico da CESP, pudesse sentir-se saudoso de seus amigos de juventude, Maria Teresa começou a contatar os antigos colegas e levantou o paradeiro de nada menos que 63. Um primeiro jantar aconteceu no Madalosso, há dois meses, para se preparar a grande reunião de final de ano, que, transpondo as limitações de apenas mais uma - entre centenas de outras - adquire um significado sociológico para reflexões: a sociologia que existe numa turma de amigos, dentro de um espaço urbano, numa determinada época. Eis um tema para teses acadêmicas, ou, no mínimo, uma boa edição do "Leite Quente", que a jornalista Mai Nascimento vem fazendo pela Fucucu: o levantamento das "turmas" que marcaram a cidade nas décadas de 50 a 70, estudando o comportamento sócio-econômico-político de cada uma. Há amplo e farto material. A da Ouro Verde, por exemplo, reunia os jovens da classe superior, filhos de pais ricos. Já a da Praça Espanha era mais democrática - misturando classe média (quando esta existia de fato) em seus vários segmentos. Já a "Turma da Saldanha" - esta mais recente, nos anos 70 - estava apenas se formando mas já era a mais temida. O advogado Ricardo Fruy Franco de Macedo, 47 anos, um dos líderes da Turma da Praça Espanha, reconhece: - "Aquele pessoal era da pesada. Reunia halterofilistas e praticantes de jiu jitso que não davam folga". LEGENDA FOTO - Da esquerda para a direita, mas sem qualquer conotação política, quatro "feras" da Turma da Praça Espanha flagrados em março de 1964: José Aniz Assad, hoje médico; Ricardo Rui Franco de Macedo, Silvio Noronha e Ophilio Mueller Pinheiro - os três hoje advogados. Ophilio é um dos diretores da Secretaria de Finanças da Prefeitura de Curitiba.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
09/12/1990

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br