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Aramis

Discos do Ano

A imagem que ficou de Laercio de Freitas foi de autor de "Capim Gordura", uma bem sucedida (comercialmente falando) apropriação de um tema rural, que numa produção de Helcio Milito, em compacto, há 10 anos escalou as paradas de sucesso. Mas Laércio de Freitas, paulista de Campinas, 39 anos, é um instrumentista dos mais competentes, produtor de jingles e esplêndido compositor, como mostra em "Ao nosso amigo Esme/São Paulo no Balanço do Choro"(Estúdio Eldorado, 1980). Há dois meses, durante o Festival de Jazz Rio/Monterrey, o jornalista, crítico e experto em jazz Armando Aflalo nos mostrava a fita com as gravações de Laércio. Ouvida no "bar dos artistas", entre ensurdecedoras sessões de (péssimo) jazz, a fita de Laércio de Freitas foi uma espécie de bálsamo. Com sua experiência de longos anos dedicado a melhor musica, dono de uma das maiores discotecas de jazz do mundo, produtor de vários programas especializados, Aflalo vem orientando as edições internacionais do Estúdio Bandeirantes por sua indicação saíram os excelentes lps do pianista Teddy Wilson ("3 Little Words", Inner City Records, julho/76) e do guitarrista brasileiro Laurindo Almeida, 63 anos, desde 1942 radicado nos EUA ("Concerto de Aranjuez"), dois dos melhores elepes instrumentais lançados este ano no Brasil. Como produtor executivo, Aflalo foi responsável pelo lp "Um Piano Ao Cair da Tarde" com o pianista Moacyr Peixoto, 60 anos, considerado o melhor tecladista de jazz do Brasil. Trabalhando discreta, rigorosa e da forma mais competente, as produções de Aflalo são lentas mas extremamente competentes. Por isso entre a concepção e o lançamento do elepe instrumental de Laércio de Freitas se passaram vários meses, mas o resultado é um disco que merece a nota dez. Longe de "Laércio de Freitas e o Som Roceiro", o lp que Laércio fez há alguns anos e passou desapercebido, esse "Ao Nosso Amigo Esmê" é um disco brasileiríssimo em sua estrutura, mas universal em seu som. E que confirma os elogios que Laércio tem merecido, já que seu curriculum é dos mais ilustres. Como bem lembra Luís Nassif no texto-encarte, o passado instrumental deste pianista é dos mais respeitáveis: em 1970/72, morando no México, substituiu a Luiz Eça no Tamba Trio. Foi segundo piano de Radamés Gnatalli de um histórico álbum que este gravou há alguns anos, com seu sexteto, na Odeon; em 1977 participou das gravações como pianista da famosa Orquestra Tabajara, do maestro Severino Araújo. Mas pouco conheciam o lado de Laércio de Freitas como compositor. E graças ao ouvido privilegiado de Vera Brasil uma compositora excelente, há muitos anos ausente de gravações - os choros de Laércio foram mostrados a Armando Aflalo que, sensível ao que há de melhor na música, propôs a Aluisio Falcão, diretor artístico do estúdio Eldorado, uma gravação de Laércio. Ao longo de oito sessões, entre junho/julho de 1980, foram gravadas a dez faixas deste elepe - nove de Laércio e uma de esmeraldino Salles, chorão dos mais respeitáveis nas rodas paulistas, falecido há pouco mais de um ano, e a quem o disco é dedicado. Como acentua Luís Nassif nas notas do encarte e da contracapa, os choros de Laércio refletem, dos títulos a sua concepção, lembranças musicais de uma São Paulo musical, onde "às vezes uma letra aparentemente ousada de uma composição dita de vanguarda é envolta em uma musica onde os acordes são dispostos disciplinarmente, um na seqüência do outro, forrando uma passarela por onde a melodia caminha sem sobressaltos e sem grandes vôos". Os instrumentistas mais ajustados ao som pretendido por Laércio e o produtor Aflalo foram arregimentados para as gravações, resultando um som redondo, perfeito. Assim como em 1977, em plena enxurrada do choro, Herminio Bello de Carvalho conseguiu fazer de "Choros do Brasil", com Turibio Santos e conjunto, um elepe antológico, Aflalo dá a Laércio de Freitas, oportunidades de fazer um elepe instrumental que, sem favor, vale como destaque entre os melhores do ano. Sem ser um simples lp de choro, é um esplendido registro da competência instrumental e de compositor de um musico que merece ser observado com a maior admiração e respeito, capazes de harmonias perfeitas como em "Camundongos" - dedicado às suas 2 filhas; "Vira-Cambota", "Festa na Taba", "Fandangoso", "Sumaré-Pompeia" (referencia a uma das mais antigas linhas de Ônibus paulistas), "O Cabo Pitanga", "Seu Correia" e "Ao Nosso Amigo Esmê", homenagens a companheiros musicais. São Paulo ao balanço do choro de Laércio de Freitas é um dos mais belos discos do ano, recomendável a todos que sabem ouvir os grandes momentos instrumentais.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Jornal da Música
26
12/10/1980

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