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Aramis

Gere, o "American Gigolô", não quer ser apenas símbolo sexual.

O ESTADO - Depois de ter atuado em papéis tão diversos, como em "A Procura de Mr. Goodbar" ou "Cinzas no Paraíso", como prostituto de "Gigolô Americano"? RICHARD GERE - Eu particularmente achava que precisava dar força especial a esse personagem. Uma força que não existia no primeiro tratamento do roteiro. Por isso eu conversei com Schrader e seus colaboradores, quando trabalhavam no texto, procurando mais solidez para a interpretação. O ESTADO - Aliás, sua preocupação com o "realismo" dos personagens é grande. É verdade que por "Bent" abordar o drama de homossexual que se faz passar por judeu em um infame campo de concentração na Alemanhã, durante a II Guerra, o levou a visitar o campo de concentração de Dachav. GERE - Eu estive apenas um dia nesse campo. Foi apenas para sentir melhor o clima da peça. Fui lá para estudar o personagem Max. Uma grande parte desse trabalho é bem consciente. Coisas que se pode absorver quando se visita um lugar desses. A gente sai de uma visita dessas com reações e sentimentos estranhos. Mas são coisas conscientes, são coisas que a gente sente e emocionam em tais locais. O ESTADO - E suas experiencias trabalhando com Richard Brooks e Terence Malick? GERE - Malick, diretor de "Cinzas no Paraiso", é uma pessoa muito interessante. Mas eu nunca vou esquecer o meu primeiro filme, "A Procura de Mr. Goodbar", embora não tenha tido um envolvimento tão grande (N.R.: Gere só aparecer nas últimas sequências). Mas gosto dos papéis menores. Aliás, gosto de todos os meus trabalhos. O ESTADO - Como foi o seu conhecimento com Brooks e Malick? GERE - As pessoas se encontram, às vezes, em horas estranhas. Então a gente vê que é uma coisa séria, porque esse trabalho emite vibrações. Já trabalhei e vou trabalhar com pessoas com as quais sinto boas vibrações. Por exemplo, tenho certeza que irei fazer um filme com Michelangelo Antonione, um cineasta que admiro bastante. O ESTADO - E o resultado final de "Gigolô Americano" lhe agradou? GERE - O resultado é extraordinário. O filme é curioso, porque não tem um tipo normal de desenvolvimento do personagem. Tem uma espécie de textura que não dá para ser (des)escrita. A gente sente que está lá, mas não sabe porque. Isso tem mais a ver com as idéias do universo. O ESTADO - Você, como ator, sentiu "força" de alguma coisa? GERE - Como ator, eu sei que existem grandes cenas onde existe muita paixão e são essas que geralmente os atores querem fazer. Mas o interessante, às vezes, é a idéia. Eu me orgulho deste trabalho. O ESTADO - Alguns críticos apontaram influências de cineastas dos anos 50 na elaboração de "Gigolô Americano". V. concorda com isto? GERE - Sob muitos pontos de vista, "American Gigolô" seria o primeiro filme da década de oitenta. E há um estilo especifico para a década de 80. Entretanto, a narrativa e a fotografia são diferentes. O filme se envolve com coisas culturais, no sentido antropológico do termo. Os estilos de vida, os ambientes, a sociedade. Claro, tudo tem ligações com a história. Acho que o que há de novo é o estilo. As roupas, os carros modernos, a sofisticação dos cenários. Tudo no filme tem apresentação física como deveria ter, de acordo com o modelo das revistas - projetando uma imagem para consumo. Mas aos poucos a sofisticação vai cedendo espaço a um realismo, até um final romântico. O ESTADO - Mas há também quem clasifique o final de moralista! GERE - Sim. Paul Schrader, o diretor, é muito moralista. Um moralista romântico, entretanto. Isso sente-se em todos os filmes que escreveu e dirigiu. Talvez influência religiosa. O ESTADO - Ele é calvinista, não? GERE - Sim. E há uma parte da teologia que fala em sangue correndo para obter a redenção. Observe, então que especialmente em "Taxi Driver" que Martin Scorcese dirigiu, mas Schrader escreveu e "No Submundo do Sexo", os finais são sangrentos. Há mortos para haver uma espécie de renascimento ou redenção. O ESTADO - Você recusou fazer "O Expresso da Meia Noite", de Alan Parker, que mereceu indicações ao Oscar, em 1979. É fácil um ator recusar bons papéis? GERE - Não. Não é fácil. Mas também não há nenhum papel que eu tenha rejeitado e que do qual eu me arrependa. "Midnight Express" era um papel muito violento. Eu não estou querendo julgar, em termos de bons ou maus filmes, apenas as coisas que considerei como razão para rejeição são evidentes nos próprios filmes. Mas nunca foi levado a isto por razões morais. O ESTADO - Estreando sob as ordens de Richard Brooks, um mestre, e tendo sido dirigido depois por cineastas competentes como Malick, Mulligan, Schelesinger e Schrader, pode-se dizer que V. tem muita sorte. Ou há algum fator? GERE - Pode ser coincidência que bons diretores ofereçam papéis a mim. Mas eu também sempre tive astucia de reconhecer e aceitar esses papéis. O ESTADO - "Sangue de Irmãos", ainda inédito no Brasil, parece que fracassou nos Estados Unidos? GERE - Realmente, a renda de "Youngbloods" foi abaixo do que a Warner esperava. Mas houve razões políticas. Além do mais, no elenco não havia superstars. O ESTADO - Até que ponto o cinema o quer transformar num novo mito, num "sex simbol" masculino dos anos 80? GERE - Minha carreira começou na University of Massachusetts, em 1967, passou pelo Provincetown Playhouse, Seattle Repertory Theatre, até chegar a Broadway, com "Soon" e "Grease". No cinema estou apenas há 3 anos. Acho a glória das marquises algo muito efemero. Procuro levar a sério o meu trabalho. E os diretores que me convidaram para fazer filmes importantes devem acreditar que sou bom ator. O ESTADO - Mas V. não permite fotografias nas entrevistas. Por que? GERE - É simples: o meu trabalho envolve a criação de personagens e eu não tenho nenhum interesse de fazer autopromoção pessoal, porque isso retiraria o impacto que os personagens que represento podem trazer. Aos que desejarem minhas fotos, usem a de cenas do filme. A fotografia é do trabalho, da personificação do que estou fazendo. O ESTADO - O que significa ser astro de cinema? GERE - Uma pessoa que se vende a si própria para obter uma melhor situação. E isso é o que eu não quero fazer. Em outra alternativa: alguém que é construído pelo estúdio. O ESTADO - Mas e a imagem de símbolo sexual dos anos 80, que a imprensa procura criar ao seu redor, talvez pela sua boa aparência? GERE - O ator é sempre embrulhado num rótulo para ser vendido. Isso pode ser uma necessidade da indústria de cinema, mas não é a minha. Ser ator é uma profissão competitiva. Para sobreviver é preciso andar de um lado da indústria mantendo seu próprio equilíbrio. Mas acho que há uma saída: dizer não. LEGENDA FOTO 1 - Boa pinta, roupas elegantes: Richard Gere é Julian Kay, um homem que vive de seu corpo. LEGENDA FOTO 2 - A mais bem paga modelo norte-americana, Lauren Hutton, é a estrela de "Gigolô Americano".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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Tablóide
10
30/08/1980

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