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Heolísa, aquela bela e jovem atriz dos bons tempos do INCE

Com sua memória privilegiada, capaz de detalhar fatos paralelos ocorridos há mais de 60 anos, dona Heloísa Camargo de Azevedo, "paulista da Avenida Paulista", tem uma familiar ligação ao mundo das imagens: um de seus avós, Militão de Azevedo, foi pioneiro da fotografia no Brasil. Em 1924, quando seu avô, Luiz Gonzaga de Azevedo (1856-1928), era o diretor do Tesouro Nacional em São Paulo foi encarregado de organizar o serviço do Imposto de Renda, Heloísa foi morar no Rio de Janeiro. Com apenas 17 anos, Heloísa foi trabalhar com o antropólogo e pioneiro do rádio no Brasil, (1884-1954), que em 1923 havia fundado a pioneira Rádio Sociedade do Rio de Janeiro (depois rádio MEC) e em 1936 criava o Instituto Nacional do Cinema Educativo (*), que dirigiria por 10 anos. Inicialmente secretariando Roquette Pinto, Heloísa logo evoluiria para uma espécie de fac-totum, sendo uma das primeiras funcionárias do INCE. Sua versatilidade a levaria também a produzir um programa - "Os Grandes Mestres", patrocinado pela perfumaria Coty, para a rádio Jornal do Brasil, a convite do diretor Sérgio Vasconcelos, apresentando músicas clássicas e com participação ao vivo do pianista Arnaldo Azevedo. xxx Dona Heloísa foi testemunha de uma fase importantíssima do Instituto Nacional do Cinema Educativo, que desenvolveu por mais de duas décadas um trabalho notável na utilização do cinema como veículo educacional e cultural. Com a participação de grandes talentos, principalmente de Humberto Mauro (Volta Grande, MG, 1987-1983), o INCE estruturou uma filmografia até hoje básica para se conhecer inúmeros aspectos de nossa história e cultura. Uma reportagem de Adalberto Mário Ribeiro, publicada em março de 1944 na "Revista do Serviço Público", mostrava, em 22 páginas, profundamente ilustradas, a filosofia do professor Roquette Pinto e seus auxiliares e o trabalho do INCE, que até 1943 já havia produzido 257 filmes em 16 e 35mm, dos quais fornecia cópias para exibição na rede escolar. Assuntos científicos, temas da história, a natureza, geografia, etc., eram abordados em filmes que chegavam a impressionar educadores e mesmo cineastas do Exterior. Por exemplo, "Céu do Brasil" foi levado a Feira Internacional de Veneza, em 1938, juntamente com "Vitória Régia". Na reportagem, Adalberto Mário Ribeiro destacava o pequeno custo do filme (200 cruzeiros). Até 1943, o filme mais longo realizado pelo INCE havia sido "Bandeirantes", abordando a fundação de São Paulo e alguns episódios da catequese de índios por Anchieta e, a bandeira de Raposo Tavares até a sua chegada em Guarupá, no Pará. Na segunda parte, focalizava o roteiro de Fernão Dias Paes Leme pelo Interior de Minas. O bandeirantes Fernão Leme era interpretado pelo ator J. Silveira, "que soube manter perfeita linha em toda representação" escrevia Mário Ribeiro. xxx Dona Heloísa Camargo de Azevedo lembra, com especial carinho de "O Despertar da Redentora", adaptado de um conto de Maria Eugênia Celso e cuja ação se passava em 1962, em Petrópolis, no tempo em que a cidade era ainda a Fazenda Imperial e contava a Princesa Isabel, 16 anos de idade". Infelizmente, muitos negativos dos filmes realizados pelo INCE perderam-se com as mudanças ocorridas a partir de 1950, quando seu acervo incorporou-se a outras repartições. Entretanto, há alguns filmes que foram preservados, como o documentário "João de Barro", que Humberto Mauro realizou com tanto esmero que chegou até a interessar a Walt Disney para incluí-lo em sua série "Maravilhas da Natureza" (a compra não foi concluída porque o público americano já se havia acostumado às imagens coloridas). Outro filme magnífico que Mauro realizou no INCE "A Velha a Fiar", tem sido exibido em eventos culturais, junto com outros trabalhos que eram conservados pela Embrafilme, até março de 1990, quando o presidente Collor extinguiu a empresa. Hoje, uma das muitas perguntas que se fazem é a de qual o destino que foi dado ao tesouro das imagens do INCE, que brasileiros preocupados e, com a visão há mais de 50 anos da importância do cinema para a educação, já realizavam? xxx Dona Heloísa trabalhou no Instituto Nacional do Cinema Educativo até 1943. Recorda-se que, "já em 1938, um técnico do Instituto, João Labre Jr., mostrou-me no edifício Fernando Vaz, na Rua Alcides Guanabara, 15 - nas dependências do Instituto, um equipamento de televisão em que estavam fazendo testes sigilosos, devido a "Segurança Nacional". Depois de deixar o INCE, dona Heloísa foi trabalhar no Standard Eletric. Em 1947 casou-se com Pinkus Fabiesiewicz, seu colega e em março de 1948 o casal veio a Curitiba, onde nasceram seus quatro filhos - Michael, Rubens, Glória e Berenice. xxx Tranqüila, afável, atualizada sobre o mundo que a cerca - e que, obviamente, a choca pela violência e insensibilidade, a quem viveu uma época de amor e paz - dona Heloísa raramente sai de sua residência, preferindo ali receber amigos muito especiais. Agora, graças ao carinho e confiança que depositou no videomaker Tiomkim, cujos trabalhos tem merecido premiações nacionais (**), dona Heloísa aparecerá na abertura de um vídeo que se afigura com a primeira produção cultural de 1992. NOTAS (*) O Instituto Nacional de Cinema Educativo foi criado pela lei 5.882, de 1936, sancionada pelo presidente Getúlio Vargas, que designou em 26 de março de 1936 uma comissão organizadora para sua instalação na Rua Alcindo Guanabara, 15. O projeto-de-lei propondo o INCE havia sido apresentado na Câmara dos Deputados em 1935. (**) Tiomkim recebeu o grande prêmio do Salão Curitiba Arte V, com o trabalho fotográfico "As Horas Nuas" (89); em 1991, como vídeo "Cenas de um Sonho Selvagem" obteve o I Prêmio na categoria vídeo-arte do Salão Curitiba Arte VII e Prêmio de Melhor Edição no I FENAVI (Festival de Vídeo de Vitória). LEGENDA FOTO - Heloísa Camargo de Assis, aos 18 anos, numa cena de "O Despertar da Redentora", produção do INCE sobre a princesa Isabel. Hoje, dona Heloísa, 73 anos, reside em Curitiba e vai aparecer num vídeo sobre o fotógrafo Gluck.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
18/02/1992

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