Samba-Jóia
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 08 de junho de 1980
No final dos anos 70, em termos de MPB, dois fatores se destacaram: a revitalização do choro, entre 1976/78, graças especialmente a esforços de pessoas como Paulinho da Viola e Sérgio Cabral (<< Sarau >>, com o grupo Época de Ouro), Abel Ferreira (1915-1980), Altamiro Carrilho entre outros - e o << merchandissing >> em torno do samba. O gênero que para muitos é identificação de nossa MPB passou a ter novos métodos de comercialização / divulgação, desde veículo para cantoras como Clara Nunes e Beth Carvalho permanecerem nas paradas de sucesso, até o chamado << sambão Jóia >>, de fácil consumo - e discutíveis méritos artísticos. Mas assim como até mesmo os mais comerciais lps instrumentais na linha do choro têm sua validade, também o sambão-jóia justifica sua presença ocupando um espaço que, de outra maneira, acabaria engolido pelas multinacionais, sempre de olho na colocação de gênero alienígenas, como a discotheque, o funky, o reggae, o country etc.
Se Martinho da Vila, hoje gravemente enfermo, após sua viagem a Angola, na primeira quinzena de maio, provou a validade do samba, alcançando cifras impressionantes de vendas com seus elepes, os papéis carbonos se sucederam: Jorginho do Império (filho de Mano Décio da Viola), Chico da Silva e outros - como Agepê, que após << estourar >> há 4 anos, com << Moro Onde Não Mora Ninguém >>, trocou a Continental pela CBS, por onde sai seu novo lp. Compositores-intérpretes de outros gêneros, também se voltaram ao sambão-jóia, como Benito Di Paula, ao lado de Wando - um dos pontos altos de vendas da Copacabana. Conjuntos vocais-instrumentais, na linha da << roda de samba >>, se sucederam: O Originais do Samba, após um longo período apoiando Martinho da Vila, teve sua carreira cataputada com << Cadê Teressa >> (Jorge Bem, 1969). Mas chegando ao máximo na linha debolachada, com letras de duplo sentido, como o hit << pela Dona do Primeiro Andar >>. O inevitável aconteceu: outros grupos seguiram a mesma linha: o Nosso Samba, lançado pela Odeon, já com vários discos em catálogo, ou o agora Samba Som Sede, que a mesma RCA, que já tem por contrato Os Originais, está lançado em << Abrindo Espaço >>.
Em << Clima Total >> (RCA, 103.0328), Os Originais do Samba tiveram na faixa << O Amor Nascera Depois (Bom Capelo/-Luve ci Ernesto/Almir) uma participação especial que valoriza o disco: o violonista Baden Powell. Nesta produção de José Briamonte, houve preocupação de colocar um novo repertório, com músicas de autores como Paulo Cesar Pinheiro/Eduardo Gudim (<< Baile Familiar >>), ao lado de autores populares - Tião Pelado (<< Mané Mancou, Dançou >>), parceria com Luiz Carlos), Avarése (Malango Bê >>, parceria com Edenal Rodrigues), Dedé da Portela (<< Cadê Maria >>) ao lado de uma irônica << Bebedeira do Zé >> ) Almir / Beto sem braço >>), uma espécie de inverso do << Bebo Sim >>, que Elizeth Cardoso gravou há alguns anos. Já o Samba Som Sete, formado por Carlinhos (cavaco). Belôba (tamborim), Getúlio (pandeiro), Betão (agogô), Ailton (cuíca), Índio (reco-reco)e Baiano (surdo), mais o vilão de Manoel da Conceição, o baixo de Ernesto, a bateria de Papão e o atabaque de Nelsinho do Balanço, preferiu um repertório mais conhecido. Afinal, o produtor Rildo Horas convencionou que para colocar na praça um novo grupo, eram melhor reunir músicas já testadas (e aprovadas) em gravações anteriores. Assim temos << Sonho de Um Sonho >> (Martinho da Vila /Rodolfo /Graúna >>), << Coisinha do Pai >> (Jorge Aragão / Almir / Luiz Carlos) - o grande sucesso de Beth Carvalho no ano passado): << Senhora Liberdade >> e << Gostoso Veneno >>, da dupla Wilson Moreira /Nei Lopes; << Suplica >> Pinheiro), << O Bêbado e o Equilibrista >> (Bosco / Blanc) e << Na Linha do Mar >> (Paulinho da Viola). De Décio Carvalho, além do samba que dá título ao lp (""Abrindo Espaço >>), há também << Vendaval da Vida >> )parceria com Noca); e De Dicró - maranhense que a Continental lançou no ano passado, ó << Chatuba >> (parceria com Alias do Carvalho) enquanto de Rubens da Mangueira / Ivan / Luiz Grande << Xô Gafanhoto >>. De Noca da Portela / Tião de Miracema. << É Preciso Muito Amor >>. Enfim, um repertório dos mais interessantes, superior mesmo aos dos Originais do Samba. Afinal, se a RCA investe no Samba Som Sete é porque vê nele condições de preencher um espaço. E que pode ser até do próprio Originais.
Em seu novo lp, na CBS, Agepê regravou o samba-enredo que deu origem ao último título conquistado pela Portela, sua escola de samba do coração: << Lendas e Mistérios da Amazônia >>. Ao menos esta faixa mostra a preocupação deste ingênuo compositor /sambista em tentar uma melhor escala, partindo para shows em teatros e alternando suas composições - sempre em parceria com Canário (<< Solidão >>, << Eu e o Mar >>, << Tristeza >>), com músicas mais inspiradas, como << A Força e o Adeus >> do baiano Ederaldo Gentil ou << Mineiro ê! >>, de Invancué da Portela /Ailton do Império. Em compensação Benito Di Paula, o protótico do sambão-jóia >>, não abre mão de acumular os direitos de autor-intérprete: as 10 faixas de seu último lp (Copacabana, produção de Paulo Rocco) seguem os esquemas tradicionais, com a linha de fácil consumo - mas discutíveis resultados artísticos. Embora com um público fiel e, que ao menos por enquanto, continua a lhe garantir bom faturamento, ou como diz a << a chover em sua horta. Por quanto tempo, não sabemos. Faixas: << Desencontro >>, << Pau de Arara >>, << Banda do Povo >>, << Nesse Barco Eu Vou >> , << Se eu pudesse >>, << Olha Nós aó >> , << Som do Cavaquinho >>, << madrugada >>, << Vamos Cantar >> e << Marcas do Amor >>.
FOTO LEGENDA- Agepê
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