Surpresas na escolha dos melhores médias e curtas
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 06 de novembro de 1986
Após a entrega das premiações oficiais no XIX Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, o cineasta Wlademir de Carvalho, 51 anos, documentarista dos mais respeitados ("O País do São Saruê", "O Homem de Areia"), subiu ao palco do cine Brasília e anunciou que havia instituído um prêmio especial: o "Conterrâneos" (o nome já é uma referência do longa sobre Brasília, que vem tentando finalizar há anos: "Conterrâneos Velhos de Guerra"). Assinando um cheque pessoal de Cz$ 2 mil, "retirado de meu salário como professor de cinema da Universidade de Brasília", Wlademir protestava, assim, contra a indiferença do empresariado do Distrito Federal, que apesar de seus constantes apelos, até hoje não se decidiu a financiar um prêmio, "por mais modesto que seja", capaz de estimular a produção cinematográfica local - ao contrário do Festival de Gramado, onde a Assembéia Legislativa do Rio Grande do Sul destina, anualmente, representativa premiação aos melhores do cinema gaúcho.
O Prêmio oferecido por Wlademir, "com um sentido político e simbólico, esperando que em 1987 apareça um Mecenas com possibilidades de elevar o seu valor" foi para Vicente Fonseca, 36 anos, gaúcho de Pelotas, desde 1972 radicado em Brasília, e que levou quase sete anos para poder concluir o emocionante "Cora Doce Coralina", que em 12 minutos documenta a poeta Cora Coralina (Ana dos Guimarães Lins Preta, 1889-1985), em sua cidade de Goiás Velho, declamendo belíssimos poemas.
Produzido pelo cinegrafista Ronaldo Duque, paranaense que já residiu em Curitiba e aqui realizou "Póstuma Cretã" (produção de Valêncio Xavier, premiado em alguns festivais), "Cora Doce Coralina" foi, apesar de suas deficiências técnicas, um documentário válido por trazer, em imagens de muita poesia, a autora de poemas antológicos, definida por Carlos Drummond de Andrade como "a pessoa mais importante de Goiás".
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"Cora Doce Coralina", concorrente na categoria dos curta-metragens, só teve a premiação oferecida por Wlademir de Carvalho. Outro concorrente que representou o cinema realizado em Brasília, o curta "Brasiliários", de Zuleica Porto e Sérgio Bazi (ele crítico de cinema do Correio Brasiliense") recebeu o prêmio de melhor trilha musical, trabalho do compositor de vanguarda Guilherme Vaz - que após ter composto trilhas para filmes de Nelson Pereira dos Santos ("Fonte de Amor" e "Azylo Muito Louco") radicou-se em Brasília, onde dirige um centro de música moderna. O curta também ganhou o prêmio de melhor fotografia (Jacques Cheueche), que já havia sido premiado no Rio Cine Festival, há dois meses. Entretanto, mereceria também o "Candango" como melhor atriz - já que a produtora Cláudia Pereira, interpreta a escritora Clarice Lispector (1925-1977) - com a qual tem muita semelhança física - em cujos textos (escritos por ocasião de suas visitas a Brasília, em seus contornos de uma cidade fantástica plantada no meio de uma imensa solidão "Brasiliários" é um curta belíssimo, que merece ser levado no circuito comercial.
Misturando uma primitiva técnica de cinema de animação com cenas do sepultamento de um líder sindical do Maranhão, assassinado por razões políticas, "Quem Matou Elias Zi?", 15 minutos, de Murilo Santos - radicado em Brasília - acabou levando nada menos que três premiações: especial do júri, melhor roteiro (Maristela Andrade) e música original (cantador Manoel Messias).
Ironicamente cruel (a partir do título) olhar sobre as menores abandonadas que vivem ao redor do histórico bar "Amarelinho", na Cinelândia carioca, "Vam'Pra Disneylândia", do ator Nelson Xavier (co-diretor com Ruy Guerra de "A Queda"), levou os prêmios de melhor direção e som.
"Lin e Katazan", do bairro Edgard Navarro - inspirado livremente em alguns trechos da novela pecuária "Fazenda Modelo", de Chico Buarque, com tratamento simbólico, ganhou os prêmios de melhor montagem, ator e curta.
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