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Aramis

Ao invés de filmes para as crianças, sangue do Vietnã

Nesta temporada de férias, em que os cinemas procuram apresentar programas de censura livre, não seria lógico que os cinemas da Fucucu, mantidos com o dinheiro do contribuinte e supostamente destinados a servir a comunidade, deveriam exibir também os filmes apropriados as crianças - ou ao menos aos jovens? Por exemplo, um filme ingênuo como "Usinhos Carinhosos" ou comédias como "Quase igual aos outros" ou "Nada em Comum", poderiam preencher as datas dos cines Luz, Groff e Ritz. Fitas inéditas, que antecipariam o retorno de uma obra-pirma como "Nunca Te Vi...Sempre Te Amei" (17 semanas em cartaz em São Paulo, sucesso no Rio e Porto Alegre) e, principalmente, lançamentos exclusivos de obras de arte como "Henrique V", que Laurence Olivier realizou em 1944 - e praticamente inédito para várias gerações. Depois, um cult-movie como "Aria", realizado por vários diretores, exibido durante o IV FestRio e que só agora estreou no Rio (e que teria lançamento em Curitiba antes de São Paulo). Também outros filmes importantes - inclusive o vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro em 1988 - teria, em Curitiba, programação nos cinemas da Fucucu. Entretanto, tudo isto foi desprezado, jogado fora, devido a incompetência que tomou conta do setor de programação das salas oficiais. Ontem, por telefone, o senhor Wilson Rodrigues, gerente de programação da Columbia, em São Paulo, lamentava a falta de sensibilidade do "assessor" que em maldita hora a Fucucu escolheu para cuidar da "programação" de suas salas. Asperamente, sem sequer conhecer os filmes, o "inteligente" funcionário recusou todos os filmes oferecidos, inclusive "Nunca Te Vi... Sempre Te Amei" e o tocante "É difícil dizer adeus" (exibido há duas semans no Cinema I). A intenção da empresa era abrir com os cinemas da Fundação um canal para oferecer as suas salas ("o Luz e Ritz ótimas salas, mas lamentavelmente vazias", comenta Wilson Rodrigues), filmes de arte que nelas poderiam permanecer em cartaz. Infelizmente, o autoritarismo, a ignorância e a incompetência prevaleceram: com a desculpa de que a Columbia pretendia "impor" lixo cinematográfico (será que uma comédia infantil como "Ursinhos Carinhosos" é mais lixo do que "Espelho de Carne", pornofita que já foi reprisada três vezes nas salas da Fucucu?), se encerraram as negociações. Os filmes que poderiam preencher datas para as salas da Fucucu melhorar sua programação irão para outros circuitos e nos cines Ritz, Groff e Luz permanecerão reprises. Por exemplo, esta semana, um banho de sangue vietnamita, com reprises de três filmes de valor, não resta dúvida, mas totalmente dispensáveis de voltarem agora: "Corações e Mentes", documentário premiado com o Oscar de 1984 (e em vários festivais internacionais), no Groff, "Full Metal Jacket/ Nascido Para Matar", de Stanley Kubrik, no Ritz e "Jardins de Pedra" ("Gardens Of Stone"), de Francis Ford Coppola, no Luz. Interessante mostrar três visões diferentes da guerra do Vietnã. Mas incompreensível que preferindo ficar em reprises, a Fucucu colabore para que suas salas percam a exibição de filmes inéditos - ou reprises de obras como "Ao redor da meia-noite" e "Nunca Te Vi...Sempre Te Amei", desprezados pelo "assessor" naquilo que, por anos, ele fazia com relativa competência. Assim, ao menos até a eleição do novo prefeito - quando se espera uma mais do que necessária renovação na viciada estrutura da Fucucu - quem gosta de bom cinema perde a chance de assistí-lo nas salas mantidas com o dinheiro do povo.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Seção de Cinema
8
15/07/1988

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