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Aramis

Fucucu vai gastar milhões para trazer os filmes estrangeiros

Está confirmado: a 14ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo inicia dia 17 de outubro e virá, ao que consta, completa - com 170 filmes - a Curitiba. Custará US$ 700 mil e entre os financiadores está a Fundação Cultural/Secretaria Municipal de Cultura, conforme a imprensa paulista vem divulgando. Os cinéfilos locais vão vibrar. Afinal, durante duas semanas, um porre de imagens com filmes vindos de vários países, selecionados em mais de uma dezena de festivais em diferentes partes do planeta percorridos pelo crítico Leon Cakof, estarão apresentando nos cines Ritz, Groff e Luz. Aparentemente, um evento para se tirar o chapéu e merecer elogios. Entretanto, as coisas não são bem assim! Quanto isto custará ao município? Indagada oficialmente, através de sua assessoria de imprensa, a Secretaria Municipal de Cultura/Fucucu negou-se a esclarecer embora o dinheiro seja público, advindo da cobrança dos pesados impostos (a população ainda não absorveu a alta do IPTU sofrido no início do ano). Nos próprios corredores da Fucucu, correm notícias desencontradas: a participação do município seria de US$ 120 a US$ 80 mil nesta promoção que tem como outros financiadores a Secretaria Social do comércio. No ano passado, um rastolho do festival, com apenas 30 títulos, entre curtas e longas, significou Cr$ 250 mil ao Sr. Leon Cakof, que aqui passou uma semana, acompanhado de quatro belíssimas assessoras. Na semana que vem, consta, aqui estará novamente para receber o que o município vai lhe pagar pelo privilégio de que os cines do circuito oficial exibam - em sessões acavaladas, impossíveis de serem acompanhadas mesmo pelos mais fanáticos cinéfilos, todos os filmes - na base de 4 longas e 4 curtas por dia. Os filmes mais atraentes lotarão as salas - que têm capacidade reduzida (200 lugares no Ritz; 180 no Groff; 120 no Luz). Muitas sessões, a exemplo do que aconteceu entre 6 a 19 de novembro de 1989, terão poucos espectadores - pois afinal a não ser que se tire férias no período, será impossível acompanhar todas as sessões. No ano passado, os Cr$ 250 mil - correspondentes, na época, a mais de US$ 18 mil (conforme o valor do dólar no mercado paralelo), foi doado pelo Banestado, o que serviu de alegação oficial para que a Prefeitura - com tantos programas prioritários - despendesse soma tão elevada numa promoção que, no final, acabou tendo os títulos mais interessantes mostrados durante o evento lançados, semanas depois, no circuito comercial. Este ano, com as verbas do Banestado melhor controladas (é o próprio secretário da Comunicação Social, Mussa José Assis, quem autoriza agora despesas) e estando a Prefeitura em franca oposição ao governo Álvaro Dias, obviamente que não será o Estado a financiar esta promoção. Afinal, se fosse para gastar dinheiro do Banestado, a promoção deveria ser da Secretaria Estadual da Cultura. Desconhece-se, até o momento, outros patrocinadores, assim como a data exata, a programação, o preço dos ingressos e, principalmente o custo, exato. Considerando que se pagou no ano passado uma importância elevada para que viesse a Curitiba apenas o rastolho do Festival, obviamente que Leon Cakof, como executivo deste evento, não aceitaria menos de US$ 100 mil para trazê-la, integralmente. Em anos anteriores, nas administrações de Maurício Fruet e Roberto Requião, resistiu-se ao canto da sereia do evento: afinal não se justificava gastar tanto dinheiro para fazer exibições únicas (no máximo em duas sessões) de filmes que, muitas vezes, não tem legendas (tornando-se assim privilégio de uma minoria) ou, no caso de muitos títulos, ganham distribuição comercial - e que podem chegar, em pouco tempo, sem despesas maiores no circuito comercial. É difícil entender como a Prefeitura, que tem tantos programas prioritários na área social e mesmo em obras, justifique gastos de milhões de cruzeiros, através da dispendiosa Secretaria Municipal da Cultura para esta promoção. É de se perguntar quantas creches poderiam ser mantidas com o que irá ser gasto para que um público pouco superior a 200 ou 300 pessoas (já que se repetirá nas diferentes sessões) assista filmes estrangeiros normalmente ao circuito. Sábado passado (22/09/90), a jornalista Lívia de Almeida, da "Folha de São Paulo", denunciou que a 2ª Mostra Banco Nacional de Cinema do Rio de Janeiro, vista por mais de 60 mil pessoas ao longo de três semanas e que exibiu 170 filmes em 5 cinemas, custou um terço do orçamento da mostra que Leon Cakof está fazendo com recursos oficiais do governo de São Paulo e da Prefeitura de Curitiba. Com uma excelente seleção de filmes, a mostra que o Cine Clube Estação Botafogo organizou pela segunda vez, custou US$ 180 mil (cerca de Cr$ 15,5 milhões). A Mostra paulista ficará em US$ 700 mil (Cr$ 60 milhões). No Rio, trabalharam 50 pessoas, em São Paulo, 60 pessoas foram contratadas. Em Curitiba, desconhece-se também detalhes sobre o esquema de trabalho. xxx No ano passado, um almoço num dos restaurantes mais caros da cidade, Brass Rail, Cakof e a Secretaria Municipal da Cultura conseguiram convencer o prefeito Jaime Lerner, possivelmente sem ter informações mais detalhadas a respeito, a assinar um compromisso em que a Fucucu financiaria parte das despesas da 14ª Mostra, trazendo todos os filmes. Com o Plano Collor e, principalmente as medidas de economia, bem como uma aplicação mais social dos recursos municipais (que inclusive deveria enxugar o quadro de funcionários e cortar vários projetos megalômanos da Fucucu) imaginava-se que a Mostra não viria a Curitiba - o que, afinal, poderia frustrar alguns cinéfilos mas que seria plenamente justificável. Aliás, ficaria mais barato a Fucucu oferecer "bolsas"(sic) para os que se dispusessem a assistir aos filmes em São Paulo, em tempo integral, do que gastar - sabe-se lá quanto, precisamente, mas que não ficará por pouco - nesta promoção sofisticada, bela em termos de promoção cultural - mas fora da realidade de uma cidade que alega não dispor de recursos para obras prioritárias no campo social.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
30/09/1990

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