Pantanal pavimenta rota para o "new caipirismo"
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 30 de setembro de 1990
Se outros méritos não tivesse, "Pantanal" - a grande surpresa da telenovela brasileira em 1990 - já valeria por ter dado uma necessária catipultuagem [catapultagem] na carreira de dois excelentes intérpretes da música de raízes: Sérgio Reis e, especialmente, Almir Sater.
Se do alto de seus quase 2 metros de altura o ex-cantor de rock Sérgio Bassini, 50 anos completados no dia 23 de junho, paulista da capital e que começou gravando versões ("Lana", de Rony Orbison, 1961) e alcançou seu primeiro sucesso com o ingênuo "Coração de Papel" (de sua autoria, 1967) já estava entre os artistas mais prósperos dos últimos anos, com seu estilo country, o mato-grossense Almir Sater, apesar de meia dúzia de LPs - metade dos quais instrumentais, excelente tipo de galã e, sobretudo, excelente caráter, ainda não tinha a popularidade que a interpretação do personagem "Xereu Trindade" lhe trouxe, - o que deve se refletir em seu novo disco.
Sérgio Reis, então vem com tudo em seu novo álbum ("Pantaneiro", Barclay), puxado pelas músicas incluídas na trilha sonora da telenovela acrescido a outros temas. Almir Sater é seu parceiro em "Peão de Boiadeiro", o tema de Tibério, enquanto com Paulo Simões, Sater criou "Comitiva Esperança", nome de um projeto ecológico que desenvolveu há alguns anos. Sérgio já aparece como parceiro de Mário Maranhão em outra faixa, a extensa "Sinfonia Pantaneira", reservando outras faixas para canções que, no entendimento da produção deste álbum gravado ao vivo no Memorial da América Latina, melhor se identificaram ao do espírito ecológico deste momento especial: "Coração Pantaneiro" (Nino), "Lá no Pé da Serra" (Elpídio dos Santos), "Trem do Pantanal" (Paulo Simões/Geraldo Roca), "Chalana" (Mário Zan/Arlindo Pinto) e "Pantanal" (Marcus Viana). Claro que a mulher não pode ficar ausente e ao menos duas faixas são de louvação às musas dos pantaneiros: "Rabo de Saia" (Peão Carreiro/Zé Paulo) e "Rita Donzela" (Carlinhos Borba Gato).
27º disco em seus 32 anos de carreira, "Pantaneiro", tem 7 canções da trilha da telenovela - e Sérgio não poderia estar em melhor fase, mais requisitado do que nunca para fazer shows por todo o país.
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Assim como Sérgio Reis, Eduardo (Oliveira) Araújo, mineiro de Juaína, 45 anos completados em 23 de julho, começou há 30 anos na onda o rock que se fazia no alvorecer da década de 60: em 1960, indo estudar veterinária no Rio de Janeiro começou a participar do lendário programa "Hoje é dia de Rock" de Jair de Taumaturgo (TV Rio) e fez sua primeira composição, "Deixe o Rock" e gravou seu primeiro compacto ("Garoto do Rock", Philips, 1961).
Participou de programas como "Os Brotos Comandam", "Festival da Juventude" e "Carlos Imperial", mas, formado, voltaria para a fazenda de seus pais, onde ficaria até que em 1967 retornaria, no auge da Jovem Guarda, com "O Bom", seu maior sucesso e depois "Goiabão" (com Carlos Imperial).
Chegou a ter seu próprio programa na TV Excelsior, onde conheceu a cantora Silvinha, com quem casou e em 1969 passaria para a Record. Pouco a pouco sua carreira foi eclipsando-se, levando-a a cuidar de suas fazendas.
Inteligente e sentindo que não deveria desprezar suas origens rurais, Eduardo voltou-se então para o estilo sertanejo de qualidade, obtendo sucesso em programas de televisão e fazendo discos bem produzidos como "Pé na Estrada", uma produção independente, com instrumentistas competentes e no qual ao lado da música-tema de seu programa no SBT ("Pé na Estrada") e seis outros temas próprios, gravou belas canções de Renato Teixeira ("Eu e meu Irmão", participação especial de Nalva Aguiar); "O Novo Passado a Limpo", de Lula Barbosa e Wanderlei de Castro e até a releitura de "Ave Maria do Morro", de Herivelto Martins e uma versão que José Fortuna fez de "Five Hundred Miles" (Hedy West), com o título ecológico de "O Homem e a Natureza".
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Para aproveitar o sucesso que "Triste Berrante", de Adauto Santos ganhou ao ser incluída na trilha de "Pantanal", o Estúdio Eldorado relançou o excelente álbum "Caipira - raízes e frutos", que Aluízio Falcão, quando diretor artístico daquele selo do grupo "O Estado de São Paulo", produziu há alguns anos.
Um dos mais competentes estudiosos de nossa música popular, Aluízio, após ter sido o responsável pelo que de melhor o publicitário Marcos Pereira (1930-1980) lançou pela sua etiqueta, desenvolveu no eldorado um excelente catálogo com projetos audaciosos. Um deles foi, justamente este "Caipira", montando num elepê aquilo que chamou de "Raízes", e no segundo como "Frutos", estabelecendo a evolução do cancioneiro rural.
Assim, nas "Raízes" foram colocados desde a moda de viola "Situação Encrencada" que Cornélio Pires (1888-1958) gravou em 1929, dando início a chamada música sertaneja (em registros fonograma) a momentos marcantes da obra de duplas como Zé Carreiro/Carreirinho (depois Tião Carreiro/Carreirinho), Palmeira (Diogo Mulero, 1918-1967) e Teddy Vieira (1922-1965), para só citar alguns exemplos.
Já no volume "Frutos", estão exemplos de uma segunda/terceira geração de artistas e autores que foram buscar no meio rural a inspiração para sua obra, como o já citado Adauto Santos, Toninho Café, Tavinho Moura/Murilo Antunes ("O Trem Tá Feito"), Zé Geraldo ("Reciclagem"), Renato Teixeira ("Romaria"), Vandré ("Disparada") e até Chico Buarque ("Se eu fosse teu patrão" e Milton Nascimento/Fernando Brandt ("Ponta de Areia").
Com excelentes interpretações, buscadas em fonogramas de várias etiquetas e enriquecidas por um texto antológico de mestre Antonio Cândido ("O Mundo Caipira", extraídos do livro "Parceria do Rio Bonito", Editora Livraria Duas Cidades, 1971), "Caipira - raízes e frutos" é um álbum-documento fundamental, que reaparecendo agora, se constitui em fonte de estudos a quem sabe valorizar a nossa música popular.
LEGENDA FOTO - Eduardo Araújo: do rock ao rural, numa escalada bem brasileira.
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